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O vice-primeiro ministro e ministro do Interior da Itália, Matteo Salvini.
O vice-primeiro ministro e ministro do Interior da Itália, Matteo Salvini.| Foto: Miguel Medina/AFP

Em 26 de maio, cerca de 430 milhões de europeus dos 21 Estados-membros da União Europeia foram chamados às urnas para eleger, pelos próximos cinco anos, os 751 membros do Parlamento Europeu. Responsável pela maior parte da produção legislativa do bloco, o Parlamento, com sede em Estrasburgo (França), é o órgão mais importante da União Europeia. Fácil perceber, portanto, que os rumos da organização passam e são em grande parte definidos pela participação dos parlamentares europeus.

No Reino Unido, após um novo adiamento do Brexit (agora definido para 31 de outubro), eleitores resignados também compareceram, cientes de que o mandato dos eleitos britânicos será encerrado assim que o país deixar formalmente o bloco. Expectativas óbvias sinalizavam vitória de grupos contrários à permanência do país, com destaque para o partido de Nigel Farage.

O clima de preocupação quanto ao futuro do bloco, a crescente organização dos grupos de extrema-direita, eurocéticos e eurofóbicos (que formaram alianças pela primeira vez) e o histórico de baixa participação (42,6% nas eleições de 2014) fizeram os apoiadores da União Europeia temerem o pior.

A mobilização dos diferentes grupos teve um resultado palpável: a participação nas eleições foi de quase 50%, a maior desde 1994, revertendo uma tendência de 40 anos de queda do comparecimento e superando, em muito, a participação média das eleições internas dos Estados-membros.

Os grandes temas serão debatidos, mas os resultados políticos das eleições da UE estão longe de ser claramente delineados

Os resultados não indicam que a ideia de uma Europa unida acabou, mas revelam inquietação quanto às orientações que o bloco passará a ter a partir de uma composição legislativa heterogênea, frente a temas como imigração e políticas sociais.

Os partidos favoráveis à União Europeia, uma aliança heterogênea que vai dos ecologistas à centro-direita (liderada pelo Partido Popular Europeu), mantiveram a maioria. Mas os partidos tradicionais de centro perderam espaço para os partidos verdes (de 19 para 69 assentos), para os liberais (de 69 para 105) e para os independentes.

Os grupos de direita, ultradireitistas, eurocéticos ou conservadores, alcançaram 173 assentos no total.

Destaques para a vitória da extrema-direita na França, onde a Reunião Nacional, de Marine Le Pen, saiu vitoriosa da disputa com o presidente Emmanuel Macron. O Em Marcha, de Macron, teve 22,5% dos votos, perdendo em 1,2 pontos porcentuais para a extrema-direita. O resultado apertado representa uma derrota para a plataforma política pró-Europa do presidente francês.

Na Alemanha avançaram os verdes, com históricos 20,9% dos votos, o que revela aumento do poder de barganha nas decisões centrais do bloco. O Partido Social-Democrata caiu para o terceiro lugar pela primeira vez, aumentando pressões sobre a política interna da chanceler Angela Merkel.

Opinião da Gazeta: O futuro do projeto europeu (editorial de 2 de junho de 2019)

Leia também: O furacão Farage e a destruição do centro na Europa (artigo de Rodrigo Constantino, publicado em 6 de junho de 2019)

Na Itália, com mote do “Não à Eurábia” (alusão à crescente imigração de cidadãos de países islâmicos), a Liga de Matteo Salvini, de extrema-direita, venceu, seguida pelo Partido Democrata e pelo Movimento 5 Estrelas (M5E), seu parceiro na coalizão.

Diante da nova e mais complexa colcha de retalhos do velho continente, algumas perspectivas se colocam.

De um lado, houve um encolhimento do centro. De outro, a fragmentação aumenta a margem de negociação e de grupos menores, que passam a ter maior expressividade a partir da barganha (como no caso dos verdes).

Alguns resultados, como o avanço da extrema-direita, mostram descompasso entre as orientações de alguns países-chave do bloco (como a França, um dos motores da União Europeia).

Por outro lado, os temas ligados à imigração devem ganhar ainda mais espaço na arena de debates entre grupos de direita e esquerda. A diferença, dessa vez, é que o crescimento da fragmentação torna as previsões menos seguras, o que aumenta as expectativas e incertezas quanto aos direcionamentos no maior bloco de integração que o mundo já teve.

O bode foi colocado na sala da União Europeia. Os grandes temas serão debatidos, mas os resultados políticos das eleições estão longe de ser claramente delineados. Se mais aberta ou fechada, encolhida ou expandida, mais plural, inclusiva ou excludente, a organização vai se redesenhar ao mundo a partir do que virá. Mas a representativa participação dos europeus nas eleições já indica que os cidadãos estão, de uma forma ou de outra, se posicionando e tomando os rumos do próprio futuro da integração europeia.

Dorival Guimarães Pereira Júnior é mestre em Direito Internacional pela Universidade de Paris, professor de Direito Internacional Público e Direito Internacional Privado e coordenador da graduação em Direito do Ibmec-MG.

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