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Imagem ilustrativa.| Foto: Unsplash

Existem muitas críticas ao agronegócio brasileiro, como se este setor fosse o grande responsável pelos problemas climáticos e ambientais. Entretanto, pouco se observa, ou se comenta, principalmente nos fóruns internacionais, sobre a transformação indireta da preservação ambiental que ocorre no Brasil, causada pela adoção de novas tecnologias, em grande parte fruto de uma construção institucional movida à ciência. Agricultura e pecuária, energia e o efeito poupa-florestas foi o relatório técnico publicado pelo Ipea e apresentado ao Ministério da Economia, documento que analisou, frente ao desafio de mostrar ao mundo, a contribuição nacional de sustentabilidade produtiva e energética, por meio de um comparativo entre países agroexportadores – Argentina, Canadá, China, França, Alemanha, Índia e EUA, no período de 1990 a 2020.

Na questão ambiental, não há dúvidas de que o Brasil é protagonista em suas ações. Desde os anos 90, destacam-se diversas frentes. Em 1992, realizou-se a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente (Rio-92). O Protocolo de Quioto foi assinado em 1998, numa intenção clara de diminuir as emissões de CO2 na atmosfera. Em 2003, imagens de satélite do território nacional foram divulgadas, esforço pioneiro que reduziu o desmatamento na Amazônia (com queda de 80,9% de gases efeito estufa desde 2005). Em 2010, o Plano Agricultura de Baixo Carbono (ABC) foi criado para apoiar práticas sustentáveis. O Congresso votou, em 2012, o Código Florestal, legislação de uso da terra que incorporou demandas de preservação ambiental. Por fim, em 2021, o Plano ABC+ atualizou as metas e os compromissos internacionais já existentes. O resultado dessas ações propiciou a manutenção da maior cobertura de florestas (60%) na área total. Embora o desmatamento líquido tenha se elevado na última década, a sua proporção foi desprezível, 2,9 milhões de hectares ou 0,4% da área territorial. Não obstante, em posição contrária, EUA e Europa aprovaram, em 2022, o uso de áreas ecológicas para o plantio por causa das preocupações globais com suprimento de alimentos.

No âmbito social, é necessário compreender que não há produção sustentável se o centro não for o ser humano. Portanto, acreditamos que há um problema socioeconômico por trás do pressuposto ambiental. Os agricultores não têm interesse em destruir o meio ambiente. Ao contrário, suas ações são centrais para o modelo de desenvolvimento produtivo e inclusivo. Desenvolvimento sustentável é definido como o uso de insumos (incluindo recursos naturais escassos) para atender às necessidades humanas do presente sem que se comprometa o desenvolvimento e a produção econômica das gerações futuras. O grande desafio no Brasil é amenizar a desigualdade produtiva, uma vez que 91% dos agricultores mais pobres respondem pela menor parte da produção, ou apenas15% do valor bruto total produzido. No mundo, a atenção se volta à segurança alimentar e à fome.

No lado da oferta, a produtividade nacional cresceu a uma taxa anual de 3,1%desde 1990, enquanto a média mundial ficou em 1,5%. Na agricultura, o bom desempenho esteve associado à expansão de grãos e frutas. Na pecuária, o rebanho, a taxa de lotação e o peso-carcaça foram responsáveis pela intensificação produtiva. O rendimento pecuário (kg por hectare) aumentou a uma taxa anual de 3,5%. Comparativamente, o Canadá apresentou o segundo melhor comportamento (1,4% ao ano). Quanto à produção por unidade de emissão de CO2 equivalente, o país alcançou a maior taxa de crescimento na produção pecuária na última década (4,2%) e, principalmente, desde 1990 (2,1%). Porém, na produção agrícola, a taxa de crescimento deste indicador colocou o Brasil em terceiro lugar (2,1%), atrás da Argentina (3,2%) e da China (2,3%). Em suma, os resultados mostraram que 1kg de alimento produzido hoje gera menos emissões do que no passado, e o Brasil liderou esta corrida mundial por uma produção mais sustentável.

Na produção energética, em 2020, o Brasil apresentou a maior participação de consumo em energia limpa, com 41,5% advindos de fontes renováveis. No oposto, EUA e Índia concentraram o consumo energético em fontes não renováveis, aproximadamente 91% em ambos os países. A média mundial de consumo de energia renovável ficou muito abaixo (aproximados 12%). Na produção de biocombustíveis, o Brasil se destacou como o segundo maior produtor de etanol, ficando atrás somente dos Estados Unidos. A produção nacional de biodiesel, iniciada em 2008, já ocupa 17% do mercado doméstico. O país é referência na mistura entre biocombustíveis e combustíveis fósseis. Contudo, por questões de segurança alimentar, a Europa flexibilizou a redução na proporção de mistura de etanol e biodiesel nos combustíveis fósseis, resposta que vai de encontro às recomendações das últimas décadas.

Não há dúvidas de que o Brasil está no centro da produção sustentável do agronegócio mundial e tem muito a contribuir para a oferta global de alimentos e energia. A tropicalização dos cultivos, a fixação biológica de nitrogênio, a engenharia genética de plantas e animais, bem como a integração lavoura-pecuária-floresta, foram tecnologias que,aliadas ao empreendedorismo dos fazendeiros, fomentaram o avanço. Nas três últimas décadas, há um pequeno aumento da área colhida, que saiu de 4% para 5% do território nacional. No entanto, em função das tecnologias, foi possível evitar o desmatamento de 366 milhões de hectares, ou o equivalente a 43% da extensão territorial brasileira. O efeito poupa-florestas indica a liderança entre os nossos principais competidores. Esses resultados, que alinham produção e meio ambiente, precisam ser melhor explorados e divulgados mundo afora. O Brasil será cobrado por indicadores de maior sustentabilidade, como consequência do ingresso iminente à OCDE. Dentro do campo, nossos agricultores produzem alimentos, geram energia e, fundamentalmente, preservam o meio ambiente.

José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), e professor de Economia do IBMEC e da Universidade Federal de Viçosa (UFV).  

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