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O índice de percepção da corrupção (Corruption Perception Index) indica que o Brasil ocupa a 69.ª posição, atrás de países como Ruanda, Namíbia e Cabo Verde. Nenhuma surpresa, portanto, a escalada de escândalos de corrupção. Mas um elemento relativamente novo – ao menos no Brasil – passou a permear os episódios.

Recentes casos de corrupção envolvendo multinacionais vieram à tona graças à contribuição dos departamentos de compliance (área responsável pela conformação da empresa à legislação e à regulamentação, interna e externa, a que sua atividade está submetida) das próprias instituições envolvidas. Não se tratam, no entanto, de movimentos aleatórios, sem conexão. Ao contrário, revelam tendência mundial. Esses fatos – ligados à gradativa mudança de percepção do empresariado quanto à sua relação com o Estado – coloca em evidência a área de compliance, ainda pouco conhecida pelos brasileiros.

Historicamente, a corrupção se arraigou de forma endêmica na cultura nacional, assim como em outros países em desenvolvimento. As grandes multinacionais incorporaram a prática como algo próprio dessas economias, a ponto de jurisdições, até recentemente, admitirem a prática fora dos limites territoriais e permitirem a dedução de valores de suborno da base de cálculo para a apuração de impostos nos países de origem. A Alemanha, por exemplo, só afastou essa possibilidade em 1999.

Naquele ano, entrou em vigor a Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, promovida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), iniciando um movimento internacional firme de combate à corrupção, independentemente de onde é praticada. A mudança não provocou, com a rapidez desejada, alteração da cultura de grande parte das multinacionais – ao menos nos países com prática corruptiva corriqueira.

Antes disso, desde 1977, a legislação norte-americana já previa punições para cidadãos e empresas por atos corruptivos cometidos em jurisdição estrangeira. Outros países, incluindo-se membros da União Europeia, não vinham incorporando dispositivos semelhantes, algo que vem mudando. Um exemplo é a Grã-Bretanha, que aprovou em 2010 o Bribery Act, lei que pune agentes por corrupção no exterior.

Nessa mesma esteira, veio a promulgação no Brasil da Lei 12.846/13 – a "Lei Anticorrupção" –, que incluiu a responsabilização civil e administrativa de pessoas jurídicas envolvidas em atos lesivos à administração pública e introduziu mecanismos de investigação, como o acordo de leniência (espécie de delação premiada) para companhias, e estendeu punições a quem pratica esses atos fora do território nacional.

Essa conjuntura, aliada à evolução do controle e do monitoramento financeiro, se constitui como um dos principais elementos para aumento de revelações de casos de corrupção ao redor do globo, inclusive no Brasil. Mas o compliance não se resume a isso. A atividade econômica – seu amplo espectro legislativo e regulatório – deve ser alvo de monitoramento constante e orientação por departamentos e pessoas com experiência no setor, tornando-se um diferencial para as empresas que se movimentam nesse sentido. É também cada vez mais comum companhias levantarem informações sobre a estrutura de compliance de parceiros antes de firmar compromissos, e grande parte das instituições financeiras avaliam esse item nas suas avaliações de risco. Por outro lado, empresas e órgãos da administração pública ainda carecem dessa cultura. Apenas a título de exemplo, a Petrobras sinalizou apenas há poucos dias que pretendia criar uma diretoria de compliance.

A evolução do universo jurídico nacional e internacional tem revelado que as empresas devem ter a conformação legal como parte indissociável de sua cultura e elemento indispensável na sua gestão de risco. Em um mundo mais competitivo, globalizado e conectado, e em uma sociedade que exige cada vez mais a postura ética, qualquer descuido pode resultar em grandes prejuízos.

Samuel Suss é advogado e gestor de riscos e compliance.

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