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Estados Unidos elogiam anúncios do Brasil na COP-26
Joaquim Leite, ministro do Meio Ambiente, informou as metas brasileiras à COP-26| Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Alterações climáticas por fatores ambientais e naturais sempre existiram; contudo, existe um consenso entre os pesquisadores e autoridades de que fatores antropogênicos têm contribuído para aumentar consideravelmente a frequência e a intensidade de desastres naturais, afetando um número cada vez maior de pessoas. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU divulgou em agosto que as mudanças recentes no clima causadas pelo homem são irreversíveis e levaram a um aumento de 1,07 grau na temperatura do planeta. Segundo o relatório, todas as regiões do globo já são afetadas por eventos extremos, como ondas de calor, chuvas fortes, secas, ciclones tropicais, degelos e acidificação de oceanos, provocados pelo aquecimento global.

É inquestionável a urgência de políticas climáticas ambiciosas para a transição para uma economia de baixo carbono. Isso a sueca Greta sabe e tem destacado há algum tempo nos principais fóruns globais sobre o assunto. E certamente as Gretas do sertão nordestino, de Soweto e de Tuvalu não só sabem como vivenciam. No entanto, de nada adianta os países terem metas ambiciosas para zerar as suas emissões líquidas se não há um plano concreto sobre como conseguir alcançá-las, com um período de transição realista, que considere o equilíbrio da urgência climática com a realidade social e econômica mundial. Afinal, a sustentabilidade é um equilíbrio dos tripés ambiental, econômico e social.

Além disso, estamos diante de uma responsabilidade compartilhada entre o poder público, o setor privado e a sociedade. Não adianta os líderes globais estabelecerem metas ambiciosas de redução das emissões sem um plano para alcançá-las e, portanto, sem terem acomodado junto à sociedade os custos que lhes serão impostos. Por isso, apesar da admirável liderança e engajamento da jovem Greta contribuindo para a construção de uma política global (e brasileira também, pois recentemente ela foi convidada para falar em uma audiência pública no Senado) do clima, é importante que as vozes dos jovens que vivem em regiões pobres – inclusive do Brasil – e sentem o impacto de crises climáticas e econômicas também sejam ouvidas.

De nada adianta os países terem metas ambiciosas para zerar as suas emissões líquidas se não há um plano concreto sobre como conseguir alcançá-las.

Diante da responsabilidade compartilhada que engloba a sociedade, Greta da Suécia lança campanha junto com Vanessa de Uganda, Dominika da Polônia e Mitzi das Filipinas, apelando para que nós, como cidadãos do planeta, participemos do movimento de cobrança aos líderes mundiais, para que a emergência climática seja enfrentada de imediato. Políticas futuras já não nos permitem deixar de viver grandes catástrofes. Manter a meta de 1,5ºC ativa com reduções de emissões anuais imediatas e drásticas, aprovar políticas climáticas que protejam os trabalhadores e os mais vulneráveis e reduzam todas as formas de desigualdade são algumas das ações propostas na campanha.

Eventos climáticos, como a atual seca e consequente risco de escassez hidroenergética no Brasil, ou mesmo as enchentes enfrentadas na China e na Europa, especialmente na Alemanha, impactam a economia, a vida das pessoas e podem até mesmo afetar o cenário político de uma região ou país. Catástrofes naturais podem influenciar os resultados de eleições, na medida em que podem ter potencial para melhorar ou derrubar a popularidade de um político. As inundações na Alemanha, por exemplo, aqueceram as campanhas e o debate político em torno da mudança climática na reta final das eleições gerais. Os resultados dessas eleições demonstraram uma profunda alteração no comportamento dos eleitores alemães, com um crescente enfraquecimento de ideologias e um foco maior em assuntos específicos, como pandemia e mudanças climáticas, temas que atingiram o topo da lista de preocupações dos eleitores, ocupando 47% e 28% respectivamente. O tema imigração quase que sumiu da campanha, ocupando 13% da preocupação dos eleitores. Como resultado dessa mudança de comportamento dos eleitores, os ecologistas despontaram como a terceira maior força política da Alemanha, com 14,8% dos votos, sendo esse o seu maior resultado, dobrando o tamanho do grupo em comparação às últimas eleições.

Da mesma forma que eventos climáticos podem mudar o comportamento de um eleitor, os impactos econômicos desses eventos ou mesmo de metas ambiciosas para a redução das emissões, sem um plano que considere a realidade social e econômica, não podem ser ignorados.

A opinião pública mundial em geral apoia a energia limpa, mas essa postura pode mudar conforme surjam os preços altos. Desde 2015, investimentos em combustíveis fósseis caíram 40% enquanto soluções alternativas a preços competitivos não têm crescido na mesma velocidade sob o risco de enfrentarmos ainda mais crises de energia e testemunharmos uma mudança de comportamento da sociedade em relação às políticas climáticas.

Neste ano, o preço do gás subiu 250% na Europa e 180% nos últimos 12 meses nos EUA. Desde maio, o preço de uma cesta de petróleo, carvão e gás natural teve um aumento de 95%. O Reino Unido, anfitrião dessa edição da Conferência Mundial do Clima (a COP-26), precisou reativar as suas usinas de carvão.

A energia é a base de toda a atividade econômica. Crises energéticas provocam efeitos nos preços de produtos e serviços, pressionando a inflação. Os apagões ocorridos no Brasil em 2001, gerados a partir de uma crise hídrica, ocasionaram prejuízo de R$ 54,2 bilhões à economia nacional, segundo cálculo do Tribunal de Contas da União. Este ano, a população já sente no bolso as consequências da crise hidroenergética. O aumento do uso de usinas termelétricas – fonte energética mais cara e poluente –, adotado pelo governo para suprir a menor geração das hidrelétricas, deve custar cerca de R$ 13,1 bilhões para os consumidores esse ano, conforme estimativa divulgada pelo Ministério de Minas e Energia no início de julho.

A crise hídrica que atinge o Brasil, a pior dos últimos 91 anos, escancarou o nosso atraso nas políticas de longo prazo que garantam a diversificação a preços competitivos da matriz elétrica, em especial o aumento da participação de outras fontes renováveis.

O Brasil tem todas as condições para liderar esse debate e transformar esse desafio global em oportunidade de desenvolvimento tecnológico, atração de investimentos e geração de empregos no país. Somos ricos em gás natural e temos um enorme potencial para a produção de hidrogênio verde, uma opção sustentável que pode contribuir para suprir a demanda energética do país, conforme apontado pelo ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, durante o Fórum de Investimentos Brasil 2021.

No entanto, apesar de soluções de baixo carbono serem urgentes, precisam ter preços competitivos. Afinal, Gretas de uma nação escandinava conseguem pagar mais por produtos sustentáveis, o que não é o caso de Gretas do sertão nordestino, de Soweto e de Tuvalu. Como já dizia o economista e marqueteiro americano James Carville, “é a economia, estúpido!”

Marina Rocchi Martins Mattar é graduada e mestre em Relações Internacionais, membro do Advisory Group da Carbon Pricing Leadership Coalition do World Bank Group e fundadora e CEO da Perspectivas Comunicação & Relações Institucionais.

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