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 | Haydée Rodrigues
| Foto: Haydée Rodrigues

Olavo de Carvalho é um filósofo brasileiro, há anos radicado nos Estados Unidos, com vasta obra publicada e polemista nato. Dono de grande capacidade argumentativa, ele é considerado um gênio por muitos e, dado seu estilo mordaz, é escrachado por seus adversários. Pode-se não gostar dele, mas recusar-se a ler e analisar suas ideias, seus escritos e as aulas de filosofia e política é estupidez, pois conhecimentos e capacidade de ensinar ele tem de sobra.

Olavo afirma que tentar entender a pobreza, o atraso econômico e a degradação da vida social no Brasil apenas pelos meandros da economia e da política é um equívoco. Para ele, embora o país tenha natureza abundante de recursos, é a miséria cultural brasileira que impede a nação de sair da eterna condição de pobreza econômica, política e social.

Ele começa por espevitar nossa noção de “cultura”. No Brasil, cultura significa, antes de tudo (e erroneamente), “artes e espetáculos” e se resume a três funções: dar um bocado de dinheiro a quem os produz, divertir o povo e servir de canal para a propaganda política, geralmente de esquerda. E, se um artista cumpre essas três funções, isso basta para ele ser rotulado de “gênio”.

No Brasil, cultura significa, antes de tudo (e erroneamente), “artes e espetáculos”

Mas o que é cultura? No dicionário, é o conjunto de padrões de comportamento, crenças, conhecimentos e costumes que distinguem um grupo social. Há anos, Olavo vem tentando chamar a atenção de nossas elites empresariais, políticas e militares para a degradação cultural brasileira, mas sem conseguir fazê-las enxergar o problema, pois “as elites são as primeiras vítimas dessa degradação cultural e não há nada mais difícil que fazer alguém tomar consciência de sua própria inconsciência progressiva”, diz ele.

O filósofo lembra que a cultura deveria, também, tornar as pessoas mais inteligentes, mais sérias, mais adultas, mais responsáveis por suas ações e, infelizmente, essa expectativa desapareceu há muito tempo da consciência nacional. De minha parte, confesso que a análise, extensa e bem argumentada, deixou-me intrigado e me lembrou dois escritores brasileiros que abordaram o tema.

Um foi Nelson Rodrigues. Comentando o fracasso no final da Copa do Mundo de 1950, ele disse que o brasileiro tem o “complexo de vira-latas”, e não só no futebol; e assim ele se expressou: “Por complexo de vira-lata eu entendo a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima”. A coisa se torna mais grave quando, além do complexo, há um comportamento vira-latas, típico de terceiro mundo.

O outro foi Monteiro Lobato, que em 1903 disse ser profundamente pessimista com o potencial do povo brasileiro, e registrou o seguinte: “O Brasil, filho de pais inferiores – destituídos desses caracteres fortíssimos que imprimem um cunho inconfundível em certos indivíduos, como acontece com o alemão, com o inglês –, cresceu tristemente, dando como resultado um tipo imprestável, incapaz de continuar a se desenvolver sem o concurso vivificador do sangue de alguma raça original”.

Críticas sempre machucam. Mas, estando a nação na lama política e na pobreza econômica, é melhor ouvir quem nos mostra as feridas do que quem se ufana num otimismo infantil. Ser otimista de coração é bom para ajudar na ação; mas ser realista na razão é necessário para enfrentar nossos males. Feliz 2017!

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.
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