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Dualidade
| Foto: Pixabay

Desde a chegada das naus portuguesas, o que agora chamamos Brasil foi considerado uma terra paradisíaca pela carta de Pero Vaz de Caminha, ou pelo menos assim foi apresentada, mito de origem que preservamos ainda nos dias atuais, embora uma versão oposta tenha sido formulada quase em seguida pelos jesuítas, que aqui aportaram para catequisar o povo nativo.

Relatos de uma natureza selvagem, bruta e abandonada por Deus começam a ser feitos, possivelmente para justificar suas interferências, e em seus relatos perigos e selvagerias mostram o estranhamento pelas paisagens luxuriantes e misteriosas.

Nesta dualidade se inicia a conquista do espaço geográfico e a consequente formação da sociedade brasileira, que vai se constituir sem um passado histórico pela inexistência de tradições escritas e legados construtivos como catedrais, pirâmides, aquedutos e estradas, herdadas de épocas anteriores; a busca das raízes baseou-se em traços culturais de portugueses, índios e negros que não eram homogêneos – e nem poderiam ser, pela violência envolvida no processo – que produzem traços mais de divisão do que integração, e onde apenas o próprio território constituiria a base para uma identidade nacional.

Assim passamos a valorizar a natureza, como se esta fosse, no chão em que vivemos, nossa própria cultura; dela (ao lado de nossa música) sempre tivemos orgulho. Ser o “celeiro do mundo” graças aos atributos de “em nela se plantando tudo dá” permitiu a implantação de uma indústria fundada no processo rápido e intenso de destruição dos solos, que nunca considerou exatamente o descompasso entre a extração e a reposição da fertilidade da terra, e fundamos o desenvolvimento econômico em processos devastadores para o meio ambiente.

Já em 1962, a bióloga norte-americana Rachel Carson alertava para os efeitos e riscos que a utilização extensiva de agrotóxicos e a denominada “revolução verde” nas atividades agropecuárias iriam trazer para o meio ambiente e a própria vida humana na terra.

É preciso lembrar que, dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos em reunião de chefes de Estado e de governo na sede da ONU, pelo menos sete estão diretamente relacionados ao bom cuidado com a natureza: o de número 2, Fome Zero e Agricultura Sustentável, para apoio de pequenos produtores de alimentos e a agricultura familiar; o número 6, Água Potável e Saneamento, para implantação de estratégias de gestão da água que sejam ambientalmente sustentáveis e economicamente benéficas na região hidrográfica alvo; o número 11, Cidades e Comunidades Sustentáveis, para promoção e ampliação das pesquisas, desenvolvendo e implantando produtos e serviços que melhoram o acesso a espaços comuns verdes; o 12, Consumo e Produção Responsáveis, com desenvolvimento, implementação e divulgação da procedência de produtos, buscando o desenvolvimento da consciência ambiental e social na sociedade; o 13, Ação Contra a Mudança Global do Clima, tentando reduzir emissões associadas às operações para auxiliar a regulação climática; o 14, Vida na Água, fomentando modelos de negócios que eliminam impactos nos ecossistemas oceânicos e colaboram para sua restauração; e, finalmente, o 15, Vida Terrestre, para proteção dos ecossistemas naturais.

Num momento em que a crescente insustentabilidade da situação mundial, com a plena consciência de que o planeta não pode manter os atuais padrões de extração e consumo de recursos naturais, a degradação ambiental provocada pelo ser humano e as suas consequências sobre o mundo animal e vegetal podem quase ter chegado a um ponto de não retorno, temos um dirigente da área que deseja “passar a boiada”!

Governo, qualquer governo, deveria ter como principal objetivo prover o máximo de bem-estar ao seu povo e garantir o futuro de seu país; a proteção dos biomas seria um dos principais fatores desta missão.

Wanda Camargo é educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil (UniBrasil).

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