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| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Há aqui um atendimento explícito a interesses de grupos econômicos que em nada atendem às premissas de desenvolvimento estratégico

O período da atual gestão do Governo do Estado do Paraná está em seus últimos dias. E, decorrente de pressões sobre uma infinidade de demandas não atendidas, um corre-corre se estabelece no sentido de conquistar alguns louros ainda. Um passivo de grandes proporções é a imagem já consolidada da sociedade frente ao que assistimos nos últimos sete anos.

Mas, ao contrário do que seria recomendável, essas últimas prioridades não necessariamente se encaixam às demandas de real interesse para o atendimento da sociedade. Mais se aproximam de compromissos de ordem política. Esforços para dar espaço a grandes empreendimentos de interesse extremamente seletivo, que em nada corroboram com uma visão mais evoluída de desenvolvimento regional.

Esse é o caso da busca da aprovação, a qualquer custo, de um conjunto de vias de transporte ligando Pontal do Paraná a Paranaguá. Trata-se de um projeto conjugado com rodovia, canal, ferrovia, linha de transmissão e um gasoduto. Colocado para a população como a redenção para os transtornos de tráfego em períodos de férias para os balneários locais, esconde, por detrás desse discurso falacioso, a implantação de um amplo projeto de desenvolvimento de alto impacto ambiental: o Porto de Pontal contingenciado a um conjunto de indústrias pesadas ligadas ao Pré-Sal.

Dias atrás, utilizando-se de encaminhamentos fora do protocolo formal, o Conselho do Litoral (COLIT) aprovou a obra. Um pedido de vista foi aceito no início da reunião. Intempestivamente, o Secretário de Estado de Meio Ambiente, Antonio Carlos Bonetti, que preside o Conselho, pressionado pelo representante da Procuradoria Geral do Estado, Paulo Glaser, e pelo Secretário Estadual de Infraestrutura e Logística, José Richa Filho, colocou em julgamento no final da reunião o pedido de vista, violando o regimento interno do conselho, que diz que “qualquer pedido de vistas deve ser acatado”. Houve, então, uma votação de resultado previsível nesse tipo de conselho, tendo-se em vista a grande maioria governista na sua formação.

Usando de uma prerrogativa de representar um empreendimento de “utilidade pública”, o governo estadual pode cortar etapas no processo fundamental de discussão sobre a pertinência desse tipo de grande obra de infraestrutura. Infere-se que transformar Pontal do Paraná numa nova Paranaguá, descaracterizando para sempre sua conotação de área para negócios de turismo e lazer, representa efetivamente um ganho para a sociedade.

De roldão, a Ilha do Mel, todos os Balneários locais e também comunidades tradicionais que vivem na região podem ser atropeladas por um mega projeto de desenvolvimento. Em poucos anos, a população local quintuplicará, com enormes impactos sociais e ambientais. A promessa efêmera de empregos representa um engodo, que se repete, de forma demagógica, a cada nova investida com esse tipo de padrão em nosso país.

A leviandade de apresentar um empreendimento sabidamente contingenciado à viabilização de uma mudança assim tão radical em Pontal do Paraná não tem qualquer sustentação para ser designado como uma ação de utilidade pública. E deve ser frontalmente rebatida pela sociedade.

Leia também: O futuro de Pontal (artigo “Sínteses” publicado em 06 de junho de 2017)

Leia também: Motivação de endereço invertido (artigo “Sínteses” publicado em 06 de junho de 2017)

Há aqui, sim, um atendimento explícito do poder público estadual a interesses de grupos econômicos que em nada atendem às premissas de desenvolvimento estratégico que deveriam nortear uma região tão especial como Pontal do Paraná.

Aqueles que defendem as pressões para a aprovação através de caminhos desviados de uma obra tão contestável não estão do lado da sociedade. Os argumentos de que, finalmente, o acesso às praias vai ser viabilizado sem congestionamentos é a forma com a qual iludem incautos a entender como positivo esse rumo que estão buscando para a região.

Infelizmente, não existem fórmulas mágicas. Nem haverá qualquer facilidade de acesso, nem as praias continuarão a ser um atrativo, se o que o Governo do Estado pretende forçar de qualquer maneira a viabilidade legal da proposta. Esse projeto, enfim, representa um retrocesso de envergadura singular. Expõe a gestão atual a uma condição de reles capacho de empreiteiras, assinando embaixo sua incapacidade de planejamento estratégico, assumindo preferência para atender interesses individuais. E com isso ignora o real interesse público.

Rotineiramente, vemos exemplos em todo o Brasil de grandes obras que, por não atenderem requisitos técnicos básicos, mas apenas interesses de grupos políticos e econômicos, causam significativo impacto negativo e, muitas vezes, até enormes acidentes ambientais. Esse é o caminho escolhido pelo governo do Paraná no momento em que pressiona para que o Presidente do COLIT rasgue o regimento, ignore pedidos de vista e aprove uma obra sobre a qual o próprio Instituto Ambiental do Paraná (IAP) apontou lacunas e inconsistências.

O Governo do Estado do Paraná não tem poder ilimitado. Seus atuais gestores não podem agir irresponsavelmente, comprometendo o futuro dos paranaenses. E nós, cidadãos, não temos como opção a prerrogativa de permitir passivamente que descalabros dessa magnitude avancem sem resistência. O enfrentamento é a única possibilidade de permitir discussão mais aprofundada com atores sérios e comprometidos. Por certo, essa decisão truculenta do COLIT não representa a última palavra.

Eduardo Vedor de Paula é professor de Geografia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Clóvis Borges é diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) e Aristides Athayde é advogado, vice-presidente do Observatório de Justiça e Conservação e fundador do Hub Verde.
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