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A proposta de criação da Fundação Estatal em Saúde (Funeas) por parte do governo do estado mais uma vez tem despertado a atenção para a proposição desses "novos" modelos de gestão em saúde. Boa parte das reformas administrativas em nosso país busca repassar atividades da administração direta para indireta, da qual as fundações públicas fazem parte, visando maior agilidade e flexibilidade. Não há grande novidade nesta delegação. Isso já acontece no Brasil há mais de 50 anos, desde o governo Getúlio Vargas, perpassando JK e os governos militares. Já ocorreu experiência similar no Paraná e na mesma área da saúde na década de 80 com a extinta Fundação Caetano Munhoz da Rocha.

Também não é inovador, ao contrário do que afirma o discurso gerencial, o repasse de atividades antes exercidas pela administração pública direta ou indireta para entidades privadas sem fins lucrativos como organizações sociais, Oscips ou serviços sociais autônomos. Ocorre há décadas com os conhecidos convênios com instituições filantrópicas. Alguns autores nominam essas iniciativas como "garrafa velha com rótulo novo". E a experiência, neste caso, tem demonstrado que as entidades privadas podem ser tão ou mais ineficientes quanto o Estado se não forem devidamente avaliadas ou reguladas.

Dificilmente algum gestor público vai admitir publicamente, mas muitas vezes essa procura pela administração indireta, especialmente pelas empresas públicas ou fundações públicas de direito privado, tem como um dos principais objetivos fugir do regime estatutário de contratação. Há certo descrédito por parte de alguns administradores públicos em relação ao instituto de estabilidade do servidor público. A alegação é a de que é praticamente impossível demitir um servidor estável e que, no caso do empregado público celetista, seria mais fácil.

Na prefeitura de Curitiba há uma fundação pública de direito privado criada no final de 2010, a Fundação Estatal de Atenção Especializada em Saúde de Curitiba (Feaes). As pessoas que nela trabalham são celetistas. Assim, na Secretaria Municipal de Saúde passaram a conviver duas carreiras, uma de estatutários e a outra de celetistas. Poderá ocorrer ou talvez já ocorra que servidores e empregados públicos com salários e carreiras diferentes estejam no mesmo órgão, fazendo atividades similares e com uma mesma chefia. Isso pode e tende a gerar conflitos e instabilidade na organização. Outra possibilidade é a de um servidor ou empregado público migrar de uma organização para a outra em busca de melhores salários e carreiras. Uma canibalizando a outra. Ou mesmo ter dois vínculos, um de estatutário e outro de empregado público e em alguns casos não conseguindo se dedicar adequadamente às duas organizações públicas.

A gestão e gerência em saúde pública é complicada e custosa, ainda mais num sistema como o SUS, que se estabelece audaciosamente na Constituição Federal como integral e universal. A criação de fundações públicas de direito privado pode eventualmente auxiliar na gerência de hospitais públicos e na resolução de alguns problemas de gestão a curto e a médio prazos, mas por si só não é a solução dos problemas de nosso estado na área. Esta passa necessariamente por uma forte secretaria estadual de saúde com bom poder de regulação e avaliação contando com quadros técnicos preparados, com autonomia, experientes e bem-remunerados.

Christian Mendez Alcantara, mestre em Administração e doutor em Direito, é professor da UFPR nos cursos de Agente Comunitário em Saúde e Gestão Pública.

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