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Sempre me incomodavam as histórias contadas pela minha mãe – filha e neta de imigrantes alemães –, que dizia que seus antepassados proibiam suas filhas de completarem os estudos. Trabalhar, então, era impensável. Acho que isso não acontecia somente com os imigrantes alemães, pois raramente se vê profissionais mulheres que nasceram no início do século passado (muitas delas, vivas até hoje, são nossas avós e bisavós). Algumas moças conseguiam se tornar professoras – uma das únicas profissões bem vistas pelos pais de outrora. A ideia era de que a mulher trabalhasse meio período para que não comprometesse os afazeres domésticos e os cuidados com os filhos, que, naquela época, eram de responsabilidade exclusiva da mulher.

O mundo onde vivemos hoje é bem diferente. Meninos e meninas são criados com igualdade de condições pela ampla maioria das famílias brasileiras. A mulher pode, até por lei, escolher e exercer qualquer profissão. Tudo isso mudou porque a mentalidade das pessoas mudou. Antigamente se ouvia que não era seguro se tratar com médica, que médico tinha de ser homem! A geração que está aí nunca ouviu isso; eles já nasceram de uma obstetra ou foram tratados por pelo menos uma médica durante sua vida. Em todos os lugares que os jovens de hoje frequentam, encontram profissionais de ambos os sexos. Ninguém mais fica chocado quando uma esposa bem-sucedida profissionalmente trabalha de sol a sol e seu marido decide ficar em casa cuidando das crianças. Que bom que evoluímos!

Nunca fui discriminada, nem veladamente, em nenhum dos ambientes de trabalho que já frequentei. E sou formada em Engenharia Civil, uma profissão de maioria masculina. Sim, levei cantadas em canteiro de obra, mas quando os homens estavam em grupo. Nas conversas profissionais individuais, sempre houve muito respeito porque eu me fiz respeitar. Sempre estive atenta às necessidades deles e ouvia suas opiniões sobre como o trabalho deveria ser feito. Também fiz minha parte para que não fosse discriminada: nunca faltei (exceto quando estava “quase morrendo”) e estruturei minha vida familiar de forma a garantir que meus filhos fossem bem atendidos sem a necessidade de eu me ausentar do trabalho para cuidar deles. Se a mulher pleiteia igualdade de direitos, também deve oferecer a contrapartida.

As mudanças ocorrem primeiro nas cabeças das pessoas para depois virarem lei

Depois de trabalhar por muitos anos em empresas privadas, criei, em parceria com meu marido, a primeira e maior franquia de educação complementar do Brasil. Passei, então, de empregada a empregadora. Meus ideais de igualdade de condições entre os sexos, no entanto, permaneceram os mesmos. Há alguns anos, uma funcionária me pediu para folgar na tarde de sexta-feira para assistir à apresentação de seu filho na escolinha, em homenagem ao Dia das Mães. Eu poderia responder com um sonoro “não”; afinal, muitas mulheres são preteridas em relação aos homens por condutas como essas. Mas, em vez disso, telefonei para a instituição de ensino e expliquei que fazer uma festa para as mães em dia e horário de trabalho não era correto. Se a criança fica na escolinha em tempo integral, é porque seus pais trabalham e, portanto, não podem comparecer a esses eventos. Perguntei, ainda, como era a comemoração para o Dia dos Pais. A resposta? Era num domingo! Conclusão: a data da apresentação foi alterada e minha funcionária não precisou faltar.

Nossa empresa sempre incentiva que as funcionárias mães revezem com os pais o acompanhamento às consultas médicas de seus filhos. A empresa na qual o pai trabalha também tem de ser solidária! E, claro, incentivamos nossos funcionários pais a fazerem o mesmo. Afinal, se o ônus de cuidar do filho recair somente sobre a mulher, haverá um comprometimento de sua empregabilidade.

Se começarmos a cuidar desses detalhes, evoluiremos para práticas adotadas por sociedades mais avançadas culturalmente que a nossa. Na Suécia, por exemplo, pais e mães têm direito ao mesmo tempo de licença para cuidar de seus bebês. E eles podem escolher o período – ou seja, a mãe pode tirar os primeiros meses e voltar a trabalhar, e o pai tira licença na sequência, o que garante que o bebê fique aos cuidados exclusivos de seus pais o dobro do tempo! Nem todo pai brasileiro está preparado para algo assim. Creio que alguns, de mentalidade antiga, aproveitariam a licença para “sumir”. As mudanças ocorrem primeiro nas cabeças das pessoas para depois virarem lei. Devagar chegaremos lá!

O capital humano é o maior bem de uma empresa. Nós, mulheres, já conquistamos um espaço gigantesco no mercado de trabalho porque provamos que podemos trabalhar em pé de igualdade com os homens. Não há mais lugar para discriminação de gênero na sociedade atual, nem de raça, cor, religião ou orientação sexual. Há uma lei de 1989 que pune com reclusão e multa a discriminação, mas mais importante que a lei é o senso comum. Por isso, acredito que as mulheres devam apelar ao bom senso para que medidas de igualdade sejam adotadas no dia a dia de seu local de trabalho e em seus lares. Mostrando que ela se preparou para exercer a função profissional à qual se propõe e não sucumbindo às dificuldades, a mulher tem as mesmas chances de colocação e promoção que seus pares. Temos de continuar avançando!

Léa Bueno é sócia-diretora da franquia Tutores do Brasil e mãe de quatro filhos.
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