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Interlocução democrata
| Foto: Marcos Tavares/Thapcom

Os Estados Unidos enfrentarão mais uma vez um ciclo eleitoral com nuances muito particulares. Depois de 2016, um ano que ficou marcado pela ascensão da antipolítica, agora a tônica será diferente. A pandemia deve marcar de forma determinante os debates eleitorais de 2020. Algo que pode mexer profundamente com o resultado de muitas disputas.

Isto significa que existe possibilidade real de câmbio de poder na balança política norte-americana, algo que está muito além da Casa Branca. O modelo institucional desenhado por James Madison deixou o poder real nas mãos do Legislativo, local para onde sempre se deve olhar com maior atenção.

A Câmara dos Representantes, que se renova a cada dois anos, certamente continuará nas mãos do Partido Democrata, fornecendo um forte impulso para a agenda de um eventual governo Biden ou colocando rédeas nas iniciativas de Trump, caso reeleito. O Senado, que renova um terço a cada dois anos, tende a manter seu equilíbrio habitual.

Fato é que o governo brasileiro, apesar de conseguir dialogar de forma direta com a Casa Branca republicana, precisa trabalhar em um plano alternativo para o caso de Biden vencer as eleições e os democratas passarem a exercer uma hegemonia pesada no cenário político de Washington.

Do lado republicano os nomes são conhecidos, como os senadores Marco Rubio e Ted Cruz, ou mesmo os deputados Kevin McCarthy e Steve Scalise. Do outro lado, entretanto, existem nomes que precisam entrar no radar do governo brasileiro. Desde a candidata a vice escolhida por Biden, senadora Kamala Harris, e nomes importantes como Susan Rice, que serviu como embaixadora nas Nações Unidas, até congressistas relevantes nas relações com o Brasil, como Gregory Meeks, de Nova York.

Durante meus anos em Washington sempre transitei em ambos os lados do espectro político, pois sabemos que, apesar das divergências cada vez maiores entre os dois grandes partidos, é no centro que conseguimos criar o consenso e aprovar agendas importantes para o Brasil. Ao introduzir o futuro governo brasileiro para os decision makers do lado republicano durante visita a Washington em 2018, sabia que nos próximos anos poderia surgir necessidade de também abrir canais do outro lado do espectro político.

Isto significa que, como tudo na política é cíclico, chegou o momento de nosso país, após sedimentar uma relação com os republicanos, estar preparado para uma eventual troca de comando nas esferas de poder. Assim como no chamado Grand Old Party, nos círculos democratas também transitam políticos que teriam enorme prazer em criar canais de diálogo de alto nível com o governo brasileiro, assim como fizemos por ocasião da visita realizada em 2018.

O Brasil precisa acompanhar o desenho eleitoral que emergirá do ciclo político norte-americano. Estarão em disputa 435 cadeiras na Câmara, 35 no Senado, 11 governos de estado, além de Legislativos estaduais, prefeitos e a Presidência. Sabemos que a política nos Estados Unidos tem um forte traço regional. Da nova correlação de forças que emergir das urnas, excelentes oportunidades podem surgir para o Brasil.

Os laços que unem os dois países são muito mais profundos do que se imagina, passando pela natureza imigratória de seus povos e seu apreço pelos valores democráticos. Ao inaugurar uma aproximação com Washington, nosso Itamaraty identificou traços que vão muito além da diplomacia e se desdobram no comércio e na cultura, elementos fundamentais de uma aliança sólida e duradoura.

Certamente, ao consolidar sua parceria com Washington, Brasília estará acima das diferenças políticas. Ao conversar com conhecidos no Capitólio, escutei que Biden e os democratas entendem a posição estratégica do Brasil na América Latina, especialmente diante de um jogo de influência executado por Rússia e China na região. Um possível governo democrata estará pronto para ir além e sedimentar alianças estratégicas de longo prazo que já foram iniciadas e fortalecem os laços entre as duas nações.

Márcio Coimbra, cientista político e mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos, é ex-diretor da Apex-Brasil e diretor-executivo do Interlegis no Senado Federal.

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