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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Quem ainda pensa e age conforme esquerda ou direita merece ouvir que está destratando o cérebro, cego para os fatos e caminhando sem chão.

Para o general Golbery, esquerda e direita eram como pontas de ferradura que, embora se achando opostas e distantes, são próximas e semelhantes. E o tempo mostrou que são irmãs siamesas – iguaizinhas, embora inversas.

A esquerda quer nos levar para um futuro que nunca existirá, como provam todos os regimes socialistas, fracassados econômica e moralmente, depois de produzir dezenas de milhões de vítimas com suas revoluções num século. A direita, em séculos anteriores, fez o mesmo com suas monarquias, guerras imperialistas e coloniais ou ditaduras, e ainda insiste em querer nos vender a ideia de um belo passado que nunca existiu (aliás, quem quer a volta dos militares devia conversar com eles para saber que só querem ser guardiões da Constituição e da soberania nacional, como é seu dever, e só).

O Estado, na mão da esquerda ou da direita, nunca poderá ajudar gente ou gerar prosperidade se não se consertar antes

A direita tomou o poder pela força no Brasil, instalando ditadura, e a esquerda queria tomar pela força o poder, para instalar ditadura. Tomando o poder em nome da ordem ou do povo, no poder direita e esquerda igualmente sempre praticaram censura, policialismo, corrupção, populismo e desgoverno, inchando Estados sempre mais custosos que produtivos.

A atual crise é resultado e evidência de que o Estado, na mão da esquerda ou da direita, nunca poderá ajudar gente ou gerar prosperidade se não se consertar antes, dando exemplo de probidade e produtividade, dois pilares que ambas primam por ignorar.

Suas visões são sempre parciais, como quem enxerga com um olho só e, portanto, sem perspectiva. Não veem que, graças a Marx e suas decorrências, o capitalismo se socializou. Empresa que hoje destratar seu pessoal, ignorando seus direitos sociais, quebra ou é fechada.

O lucro foi, depois da linguagem, a mais consequente invenção; ambas erguendo as civilizações, com o lucro se socializando já no nascimento, pois só conseguiam vigorar as moedas garantidas por Estados, portanto já com impostos embutidos – que, se inicialmente eram apenas para manter os Estados e seu aparato fiscal, militar e policial, agora sustentam serviços públicos essenciais para a sociedade.

Há apenas meio século, eu, menino, tinha “irmãs de criação”, resquício pós-escravidão. Não existiam creches, mulher cuidava só de casa, faculdade era só para ricos, homossexuais eram “veados”, enquanto lésbicas se escondiam e deficientes eram escondidos – e, se alguém dissesse que o governo ia dar bolsa para as pessoas apenas sobreviverem, seria chamado de louco. Vivemos social-democracia em evolução, apesar da resistência elitista da direita e dos delírios populistas da esquerda.

À sociedade produtiva, que com os impostos resultantes de suas empresas e salários sustenta o Estado, pouco ou nada importa que os governantes se digam de esquerda ou de direita. O trabalhador, seja empregado, empresário ou autônomo, sabe que todos cometerão os mesmos erros e a sociedade pagará a conta. E o mais triste é ver que eleições só servem para perpetuar esse sistema, enquanto persistir o atual modelo político e seu Estado de privilégios.

Como, infelizmente, essa situação é resultado da ação predatória de esquerda e direita, e também da omissão da sociedade, só podemos confiar no poder restaurador da crise para chacoalhar o barco, trocar a tripulação e o modo de navegar – se a sociedade participar e exigir. Enquanto isso, esquerda e direita siamesamente só falam e tratam do poder, não de reformas, que é do que o Brasil precisa para ir nem para a direita nem para a esquerda, mas em frente.

Domingos Pellegrini é escritor.
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