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Estamos assistindo a uma continuada redução da taxa básica de juros, aquela que é paga pelo governo nos títulos do Tesouro Nacional. Conhecida com "taxa Selic", ela entra para o fim do primeiro semestre em 12% ao ano, após uma redução feita no começo de junho de meio ponto porcentual. Essa não é a taxa que pessoas e empresas pagam nos financiamentos obtidos, mas é a taxa ganha por aqueles que acumularam poupança e aplicam para auferir juros.

A maioria das pessoas não se dá conta de que existe uma relação lógica entre lucros, aluguéis e juros, que precisa ser observada pelos que dispõem de recursos financeiros para investir e desejam entender como as coisas funcionam. Quem possui poupança dispõe de três caminhos principais para buscar remuneração do seu capital: a) investir em uma empresa para obter "lucros"; b) investir em imóveis para ganhar "aluguéis"; c) aplicar em títulos públicos ou privados para ganhar "juros". Há outros mercados nos quais se pode ganhar dinheiro fazendo especulação, com destaque para o mercado de renda variável, no qual compram-se e vendem-se ações de empresas, e o mercado de futuros e derivativos, no qual compram-se e vendem-se contratos futuros de mercadorias e de ativos financeiros.

Nos países de economia organizada e estável, o tamanho de cada uma das taxas de retorno tem ligação com o grau de risco do investimento. A taxa de lucros é maior do que as taxas de juros e de aluguéis em função do risco envolvido na atividade empresarial e da necessária competência gerencial requerida para tocar um negócio. O empreendedor que disponha dos talentos e habilidades para aventurar-se no ramo empresarial é recompensado com uma taxa de lucros que é maior do que ativos de menor risco.

A segunda taxa é a de aluguel. Embora, o proprietário de imóveis não corra riscos de produção, de mercado consumidor e de concorrência, imóvel é um ativo de baixa liquidez e de baixa mobilidade. Ou seja, é um tanto demorado transformar um imóvel em moeda corrente, já que sua venda é lenta (problema de liquidez), e dificilmente um edifício de hotel, de indústria ou de hospital pode destinar-se a outra finalidade (problema de mobilidade). Há um outro risco, que varia muito de região para região, que é a possibilidade de uma retração na economia local fazer que o imóvel não encontre inquilino nem comprador. Nas cidades que perderam população há imóveis fechados, que os donos não conseguem vender nem locar.

De qualquer forma, é mais fácil ser proprietário de imóveis do que ser empresário e, por isso, o aluguel equivale, em geral, a um porcentual do capital investido menor do que a taxa de lucros. Em função da baixa liquidez e da baixa mobilidade, o aluguel em países desenvolvidos equivale a uma taxa maior do que a taxa de juros, porque os ativos financeiros estão livres dos riscos de "liquidez e mobilidade". Quem aplica seu dinheiro em um título público ou um título privado pode transformá-lo em moeda viva em poucas horas, não sofre o problema da "localização" e não precisa ter talentos de empreendedor.

O fato concreto é que existe uma relação econômica entre lucros, aluguéis e juros, que se torna cada vez mais real na medida em que a economia do país vai se organizando e corrigindo deficiências históricas como inflação, déficit público e crise cambial. A qualquer pessoa que estude um pouco de teoria econômica e observe a história das nações, a redução na taxa básica de juros no Brasil nada tem de espetacular ou imprevisível, já que o país mostra que vai se livrando da inflação crônica, dos déficits do governo e dos déficits no balanço de pagamentos, este último representando nossas relações comerciais com o resto do mundo.

Se a economia continuar dando sinais de melhoras sobre o quadro atual, chegará o dia em que veremos a lógica de que a menor remuneração de investimento será a taxa de juros, a segunda melhor remuneração será o aluguel e a melhor de todas será a taxa de lucros dos negócios empresariais. Os muitos anos em que a taxa de juros foi a maior remuneração para a aplicação de capital financeiro eram apenas o efeito lógico da desordem em que se transformara a economia brasileira, por culpa máxima dos déficits do governo, que tanto mal causaram à sociedade brasileira.

José Pio Martins é professor de Economia e vice-reitor do Centro Universitário Positivo – Unicenp.

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