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Conforme Leda Tfouni, "existem duas formas segundo as quais comumente se entende a alfabetização: ou como um processo de aquisição individual de habilidades requeridas para a leitura e escrita, ou como uma forma de representação de objetos diversos de naturezas diferentes". O que a autora quer dizer é que na primeira perspectiva a alfabetização é algo que chega a um fim. No segundo momento, ela caracteriza a alfabetização e sua incompletude como um processo inacabado, que ao longo da vida vai se completando. Teale (1982) separa os dois processos em alfabetização e escolarização. Giroux argumenta acerca das relações entre alfabetização e escolarização dizendo: "A relação entre alfabetização e escolarização torna-se clara se considerarmos que, embora a criança possa primeiramente entrar em contato com a linguagem através de sua família, é principalmente na escola que a alfabetização se consuma". Desse modo, o ato de alfabetizar passa a existir somente enquanto práticas escolares, e ignoram-se sistematicamente as práticas sociais mais amplas para as quais a leitura e a escrita são necessárias e onde efetivamente serão colocadas em uso.

Como educadora, e por muitos anos alfabetizadora, em um primeiro momento com crianças, e por 15 anos com adultos, gostaria de colocar que no início da minha carreira e, como alfabetizadora, utilizei vários métodos que eram na ocasião propostos pela escola. Eles apareciam por meio das cartilhas: Caminho Suave, Abelhinha, Casinha Feliz, Eva Viu a Uva, Cartilha do professor Erasmo Piloto, e até mesmo uma cartilha diferente do professor Eurico Back. Por aquele método, a criança só ouvia e observava e nada podia escrever. O que dizer? Era uma alfabetização que seguia determinados objetivos propostos pela escola. A tônica maior era o processo fônico, a silabação ba-be-bi-bo-bu, pelo qual o aluno unia o som da consoante ao som da vogal para depois pronunciar a sílaba e só então a palavra e o texto. Era um processo de treinamento. Conseguia-se alfabetizar? Sim, e pobremente, quando se compara com a riqueza proposta pela teoria construtivista. Em um primeiro momento, pode-se afirmar que crianças que vivem em ambiente cuja escrita e leitura estão sempre presentes alfabetizam-se com qualquer método, até sem escola. Paulo Freire relatava em suas palestras que aprendeu a ler sozinho, escrevia com um graveto no quintal de sua casa. O professor Fernando Beker afirma que gostaria de ver os mentores do método fônico de hoje alfabetizarem crianças brasileiras de classes populares. Diz ele que gostaria de ver professores franceses e norte-americanos alfabetizando crianças da periferia brasileira. Poder-se-ia afirmar que foi a criança das classes populares, que freqüenta a escola pública, que legitimou a forma construtivista de alfabetizar, pois a prática da alfabetização não deve ser meramente a habilidade abstrata para produzir, decodificar e compreender a escrita, pelo contrário, quando as crianças são alfabetizadas, devem usar a leitura e a escrita para a execução das práticas do seu cotidiano. Do ponto de vista sociointeracionista a alfabetização, enquanto processo individual, não se completa nunca, visto que vivemos em um mundo mutável.

Quando pesquisadores como Piaget, Vigotski, Emília Ferreiro, Paulo Freire e outros nos acenaram com suas pesquisas e nos revelaram a psicogênese da língua escrita, ou seja, o caminho percorrido pelas crianças ou adultos em processo de construção da base alfabética, seus estudos nos levaram a pensar a perspectiva daquele que aprende. Mudou-se o eixo da discussão de como se ensina para como se aprende. Nessa proposta, há de se considerar o ritmo de cada um, levar em consideração seus conhecimentos prévios, suas hipóteses sobre a palavra. Trabalhar com essa clientela a vivência de situações contextualizadas de escrita e leitura. Trabalhar diferentes tipos de texto. Para esse trabalho, no entanto, se deve repensar a formação dos professores e o que entendemos por alfabetização, para formar sujeitos escritores e leitores competentes.

Isso vai exigir muita reflexão e estudo por parte daquele que ensina. O professor precisa dominar a teoria para compreender os alunos e para bem poder planejar seu trabalho.

Diante da postura polêmica entre a utilização do método fônico e o processo construtivista na alfabetização, poder-se-ia dizer que a Constituição garante a pluralidade de métodos e convicções no processo educacional e especificamente na alfabetização. Nenhum professor vai trabalhar com aquilo em que não acredita, mas voltar ao método fônico é, sem dúvida, um atraso. Se a postura construtivista não ficou bem entendida é necessário estudá-la melhor e compreendê-la. A qualidade do corpo docente ainda é o que mais conta para o bom ensino, e que as escolas ofereçam possibilidades de trabalho, afinal com 35 e até 40 alunos por sala de aula, é impossível para o professor dar um acompanhamento ideal. Cláudio Moura Castro nos diz: "Estamos diante de dois grandes problemas: convencer os brasileiros de que nossa educação é péssima e, então, entender como melhorá-la". Na realidade, para melhorar é só colocar em prática a Lei de Diretrizes e Bases que está para completar 10 anos, e cujas metas, como ter todos os professores com nível superior, todas as escolas com horário integral, carreira do professor dignificada salarialmente, para ele poder trabalhar menos horas-aula e ter dinheiro para buscar seu aperfeiçoamento, comprar livros, não foram aplicadas.

Diz a educadora Tânia Zagury, "enquanto a educação for encarada como um bem apenas na hora de pedir votos, os professores vão continuar reféns".

Elinor Eschholz Ribeiro é mestre em Educação, professora aposentada da UFPR e atualmente docente da Faculdade Uniandrade.

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