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Alguns acadêmicos e intelectuais advertem que os acordos parciais entre o governo colombiano e as Farc, publicados na semana passada, são rascunhos de promessas que contêm uma retórica espessa; mas, no fim das contas, o problema não é o que está no papel, pois o difícil será a construção coletiva das condições de convivência. Sendo realista, em Havana, onde estão ocorrendo as conversações, ainda não acertaram os pontos mais decisivos das negociações.

Certamente os acordos parciais mostram que se chegou a uma linguagem comum, um consenso discursivo mínimo entre governo e Farc, o que permitiu estabelecer as diretrizes do pós-conflito no que diz respeito à reforma agraria, à participação política e à questão das drogas.

Mas o que está no acordo representa uma ironia mútua para ambas as partes. Para o Estado, porque poderia ter realizado várias das reformas acertadas sem a necessidade de se comprometer com uma organização que utilizou métodos terroristas. Para as Farc, porque, depois de 50 anos pegando em armas contra um "regime oligárquico", aceitaram como legítimo um marco institucional liberal, democrático e pluralista para fazer a eventual migração das armas para os votos.

O que vem por aí exigirá menos argumentação e mais decisão. Menos liberalismo e socialismo doutrinários, e mais realismo político. Deixando de lado os otimismos exagerados e os pessimismos radicais, os temas definitivos da negociação vão apenas começar a ser discutidos. É preocupante que tenham demorado tanto para entrar de acordo em relação ao marco discursivo, pois o que vem agora é a parte séria, existencial e verdadeiramente política de qualquer processo de paz: o desarmamento, a desmobilização e a reinserção.

Essas serão as provas ácidas da negociação. O que for acertado sobre esses aspectos demonstrará qual é a verdadeira intenção de paz da guerrilha, e colocará à prova os marcos institucionais que o governo criou para chegar à quadratura do círculo: um acordo aceitável para os cidadãos e um fim digno para a insurgência.

Por isso, uma análise politicamente razoável dos acordos parciais deve se distanciar de duas leituras: uma, a de que o governo capitulou diante das Farc. Outra, de que estamos diante de "acordos históricos" que "transformarão o país". Nem as Farc tomarão o poder com umas áreas de reserva camponesa e umas cadeiras no parlamento, nem os acordos são a prévia de um pacto para refundar o país.

Assim, o governo e as Farc estão às portas de uma decisão política inescapável: quando e como terminará o conflito armado. Nem mais, nem menos.

Iván Garzón Vallejo é professor e diretor do programa de Ciências Políticas da Univer­sidad de La Sabana (Colômbia). Este artigo foi originalmente publicado, em espanhol, no jornal colombiano El Espectador. Tradução, Marcio Antonio Campos.

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