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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

Uma nação é composta de pessoas diversas, com limitações e talentos únicos. É bom que seja assim porque não há pensamento crítico sem diversidade de ideias e interesses. Um dos objetivos da educação é justamente o de conjugar conhecimentos distintos para criar não apenas soluções para problemas, mas também coisas belas, que conferem a nós nossa humanidade.

Infelizmente, estamos indo na direção oposta: em 2017, foi homologada uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – documento que determina o que todos os alunos, da rede pública e privada, devem aprender em cada série da educação básica. O mais irônico é que alusões à “diversidade” e à “inclusão” estão presentes em várias das competências impostas pela BNCC. Ora, quando um padrão é imposto, não há inclusão nem respeito à diversidade; há conformidade. As vozes das minorias necessariamente são suprimidas pela vontade de uma suposta maioria.

Ora, quando um padrão é imposto, não há inclusão nem respeito à diversidade; há conformidade

Além de totalitária, sabemos que a imposição de uma padronização curricular é prejudicial à educação. Um estudo da OCDE mostra que os sistemas educacionais que produzem melhores resultados acadêmicos são aqueles em que as escolas têm mais autonomia para tomar decisões curriculares – decisões sobre que cursos oferecer e que conteúdos cada curso terá, por exemplo. Este estudo é confirmado por outro , bastante recente: quanto mais autonomia e responsabilidade couber a diretores e professores de uma escola para elaborar seus currículos, melhor o desempenho de seus alunos no Pisa. Os defensores da BNCC argumentam que “as competências e diretrizes são comuns, os currículos são diversos”. Será mesmo? Alguém acredita que professores e diretores poderão definir que cursos dar na sua escola e que conteúdos cobrir em cada um? Que tipo de autonomia curricular terão escolas, considerando-se que a intenção explícita do MEC é usar a BNCC como referência comum para a formação de professores, para a produção de material didático e para o desenvolvimento de metodologias de avaliação?

Um destino comum: Da letra da lei em prática de ensino (artigo de Acedriana Vicente, diretora pedagógica da Editora Positivo)

Está claro que, se o MEC não pretendesse normatizar currículos, o esforço seria na direção oposta: o de diminuir o planejamento educacional central e fortalecer a autonomia das instâncias locais. Ao impor a BNCC, a sinalização que se dá é a da supremacia de um órgão de escopo nacional sobre as decisões curriculares locais. Se o Estado realmente tivesse interesse na excelência educacional, valorizaria a diversidade e a autonomia escolar tais como descritas nos estudos da OCDE, permitindo que pelo menos a rede privada pudesse decidir sobre sua organização curricular, incluindo os cursos que oferece.

Certamente não é este o plano. Mesmo supondo que os envolvidos no planejamento da BNCC sejam movidos pelas melhores intenções, é da natureza da escola doutrinar e é da natureza do Estado usar de instrumentos para cooptar doutrinadores. Por isso, enquanto houver uma base curricular imposta a todas as escolas e à formação docente, crianças e jovens estarão sujeitos à doutrinação do Estado – qualquer que seja o viés ideológico do governo de turno. Se esta já é a realidade percebida em muitas escolas, a existência de uma base curricular obrigatória limitará ainda mais nossa capacidade de reação. Enfim: no longo prazo, a BNCC representa também um risco para nossa liberdade como povo.

Anamaria Camargo, mestre em Educação com foco em eLearning pela Universidade de Hull, é diretora do Instituto Liberdade e Justiça e líder do projeto Educação Sem Estado.
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