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Não é só uma questão de desequilíbrio químico
| Foto: Pixabay

O Prozac chegou ao mercado em 1986; coincidentemente, no mesmo ano em que nasci. Quando, adolescente no início dos anos 2000, me consultei com meu primeiro psiquiatra, outra meia dúzia de antidepressivos da mesma classe – inibidores seletivos de recaptação de serotonina, ou SSRI (na sigla em inglês) – já tinha entrado no mercado e na consciência coletiva.

A bolha tristinha que estrelou uma série memorável de comerciais de TV do Zoloft (sertralina) virou parte da iconografia da cultura pop quase que imediatamente após a estreia, em maio de 2001. Durante minha infância, era comum encontrar anúncios para outros SSRIs entre as páginas das revistas femininas que eu folheava no salão enquanto minha mãe cortava o cabelo, resumindo os critérios que determinavam se Paxil "seria bom para você". Durante minha adolescência – depressiva, ansiosa e pontuada por transtornos alimentares –, eu sabia o nome dos remédios que prometiam me ajudar.

A popularização dos SSRIs e outros psicofármacos não acabou com o estigma contra as doenças mentais, mas certamente normalizou a ideia de sua prevalência. (Um estudo de 2003 concluiu que o nível de prescrições psicotrópicas para crianças e adolescentes tinha quase triplicado desde o fim dos anos 80.) E também ditou o tom da conversa.

As doenças mentais deixaram de ser necessariamente discutidas como aberrações vergonhosas, e passaram a ser vistas como males quimicamente preestabelecidos, ou seja, consequências do que ficou conhecido como "desequilíbrio químico".

Como uma adolescente entrando no sistema psiquiátrico de saúde, eu achava essa lógica tremendamente reconfortante. Eu vinha de uma família de profissionais médicos e fora criada para confiar nas bases puramente científicas da medicina moderna.

Talvez a raiz do problema esteja na primazia da teoria do desequilíbrio químico nos transtornos mentais e neurológicos

Interiorizar meu diagnóstico como a inscrição de um destino emocional também aliviava minha culpa pela incapacidade de afastar meus "cachorros negros". Quando os remédios não conseguiram me dar a cura que prometiam, não tive coragem de revelar meu segredo constrangedor: que talvez o problema não fossem só as combinações químicas no meu cérebro, mas o próprio órgão, ruim e avariado.

Quase duas décadas depois, eu tremo de revolta com o fracasso generalizado do sistema de saúde mental dos EUA, rígido e restritivo, que deixa até os relativamente privilegiados como eu com poucas opções, e uma infinidade de outros com praticamente nada.

Talvez a raiz do problema esteja na primazia da teoria do desequilíbrio químico nos transtornos mentais e neurológicos – o que, na melhor das hipóteses, é uma simplificação excessiva. O novo livro da historiadora de Harvard, Anne Harrington, Mind Fixers: Psychiatry's Troubled Search for the Biology of Mental Illness, sugere que a falta de visão periférica da psiquiatria moderna, com sua fixação em relacionar e alterar diagnósticos, não consegue lidar adequadamente com o que ainda tem de ser compreendido sobre a psique humana.

O psiquiatra é um médico com capacidade de fechar diagnósticos e receitar remédios, mas, hoje em dia, muitos passam menos tempo do que antigamente praticando a psicoterapia, ou o que podemos chamar de "terapia de conversa"; ao contrário, a tendência é receber o paciente com a maior brevidade possível e preencher o receituário. E o resultado é que a psiquiatria virou mais ou menos sinônimo da indústria de gerenciamento de medicamentos.

Quando, aos vinte e poucos anos, perguntei à minha nova psiquiatra – uma das poucas profissionais que aceitavam meu plano de saúde e tinha horário para pacientes novos – se poderíamos tentar discutir os problemas que eu estava enfrentando, ela me olhou como se eu estivesse sugerindo uma missão conjunta a Marte. "Ohhhhh, então você tem de ver um terapeuta", disse, balançando a cabeça, finalmente entendendo o teor da minha sugestão.

O que eu queria, e ainda quero, são opções.

Ainda se discute até que ponto a doença mental é inata, mas as narrativas da psicopatologia, em preto e branco, negligenciam os tremendos impactos psicológicos das circunstâncias sociais e materiais, isto é, o acesso ao mínimo necessário à sobrevivência; o ônus do trauma intergeracional e os sistemas de apoio social insuficientes; o soco no estômago existencial da injustiça dominante.

Uma abordagem mais realista e sutil da forma como encaramos a doença mental faria muito mais pela validação da infinidade de prováveis causas do sofrimento humano, abrindo caminho para outras pessoas necessitadas.

Sem dúvida, muita gente precisa ser medicada e se beneficia enormemente disso; os remédios certos melhoraram muito minha vida também. Mas sonho com um futuro no qual as doenças mentais sejam compreendidas menos pelos diagnósticos estáticos e quebra-galhos psicofarmacêuticos e mais pelos sintomas de cada indivíduo e as circunstâncias que podem justificá-los.

Com isso não quero dizer que o sistema atual não ofereça alguma esperança, pelo menos para aqueles que têm meios para buscá-la. Hoje com trinta e poucos anos, continuo firmemente envolvida no aparato norte-americano de saúde mental, ainda que em meus próprios termos. Vejo um terapeuta (que agora tenho a sorte de poder pagar do meu próprio bolso) que me ajuda a contextualizar e trabalhar meus problemas. Um psiquiatra receita minhas medicações, que consigo comprar com reembolso parcial da seguradora.

Também tornei prioridade diária a prática de pelo menos um exercício leve, como uma caminhada, uma corridinha ou uma volta de bicicleta. Pratico ioga com regularidade, tento manter uma dieta balanceada e dormir bem, leio constantemente e me esforço para manter relações sociais e me envolver na comunidade. Descobri que tudo isso ajuda a manter meu bem-estar emocional e psicológico – e a palavra-chave aqui é "manter", porque na verdade se trata do processo, e não do prognóstico.

Em vez de encarar minha experiência psicológica como uma montanha-russa de predisposição biológica, passei a ver minha saúde mental como reflexo da complexidade dos altos e baixos da vida; por isso, desenvolvi meios de melhor mitigar o que não posso controlar, coisa de que já achei nunca poder ser capaz. Pela primeira vez me sinto como alguém que pertence ao mundo.

Kelli María Korducki é escritora.

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