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“No hay papel!” A crise da imprensa venezuelana
| Foto: HO/Venezuelan Presidency/AFP

O periódico Panorama, jornal centenário da Venezuela, anunciou nesta terça-feira, dia 14, o fim de sua edição impressa. A razão, no entanto, parece ser simples: acabou o papel.

O anúncio simboliza a situação enfrentada no país vizinho. Há anos, a imprensa venezuelana enfrenta um período difícil com a crise econômica e o governo de Nicolás Maduro. Em 2018, por exemplo, o jornal El Nacional também havia anunciado que não produziria mais edições impressas.

Desde 1999, com o início do regime de Chávez, diversos setores da imprensa foram oprimidos e cooptados pelo governo. El Nacional e Panorama são apenas alguns dos vários veículos de comunicação que sofrem com este cenário catastrófico. A crise da imprensa, portanto, tem raízes muito mais complexas que a falta de papel.

A importância de uma imprensa livre, competente e séria é fundamental para a existência e manutenção da democracia

Alguns jornais impressos e a mídia independente na internet foram constituindo a última linha de defesa de um jornalismo autônomo e apartidário. Mas esta situação parece estar mudando conforme a crise se agrava e, ao passo que toda a estrutura burocrática censura o acesso dos venezuelanos à informação, a imprensa livre perde força.

Relatos indicam que antes e durante os protestos instigados por Juan Guaidó, as redes sociais foram bloqueadas para impedir mobilizações ainda maiores. Estas plataformas são fundamentais para a oposição política e as manifestações populares, servindo como principal instrumento de resistência contra o Estado.

A estratégia de isolar os cidadãos, além da forte repressão às manifestações, tem funcionado. Com o apoio dos militares venezuelanos, o presidente Nicolás Maduro continua no poder e mantém a sua estrutura de repressão contra os opositores e a própria população.

A importância de uma imprensa livre, competente e séria é fundamental para a existência e manutenção da democracia. É pela informação limpa e coerente que os membros da sociedade têm a capacidade de formular ideias e propor soluções para os problemas apresentados. Sem esta ferramenta, porém, os mesmos cidadãos poderão ser facilmente manipulados pelos detentores do poder.

No cenário brasileiro, políticos e partidos mais à esquerda têm defendido o atual governo venezuelano. Para eles, que não reconhecem nem mesmo as ações autoritárias contra a mídia, Maduro “tem sido democrático” e o atual estado crítico do país foi agravado pelos “imperialistas norte-americanos”.

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Estes agentes, supostamente preocupados com a situação do país vizinho, na verdade só estão perpetuando o apoio àquele projeto de poder que se iniciou com Chávez. Internacionalmente, parte da própria esquerda – mais moderada, claro – já reconhece que não existe um regime democrático, mas um cenário autoritário que atua contra as liberdades individuais dos venezuelanos.

As alegações de que o país vizinho é uma democracia livre e os Estados Unidos são a causa de seus problemas não se sustentam. Além disso, a tentativa de responsabilizar um terceiro, justificando atos de repressão, também serve para legitimar um apoio de décadas dos governos anteriores ao regime venezuelano.

Toda essa situação, que é apenas uma fração do enorme problema que a Venezuela enfrenta, é de responsabilidade do presidente Nicolás Maduro e sua equipe, não de forças externas. E enquanto se discute sua legitimidade, o povo venezuelano morre – assim como a própria imprensa.

Julio Araujo escreve sobre política e outros temas para o jornal norte-americano Merion West e o portal francês Contrepoints.

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