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O desemprego de robôs e os gurus do alarmismo
| Foto: Pixabay

Este artigo é uma provocação. O método dialético, que vem desde Sócrates e Aristóteles, exige duas posturas na técnica do discurso. A primeira é perguntar sempre “por quê?” e, a cada resposta, repetir a pergunta até que os elementos do problema tenham sido examinados em sua maioria. A segunda é provocar o interlocutor para justificar por que não pode ocorrer exatamente o contrário do que ele afirma.

Rara é a palestra sobre tecnologia em que o palestrante não fala que chegaram os robôs cognitivos, as máquinas sem piloto, os carros sem motorista e que os humanos irão perder seus empregos para a inteligência artificial. Estamos na era dos gurus alarmistas. É claro que há certas verdades nisso tudo. A revolução tecnológica está aí, mas, embora haja uma avalanche de inovações e inventos, a rigor não se sabe ao certo o que vai acontecer daqui a 30 ou 50 anos.

O alarmismo tem base histórica e é difícil contestar quem afirma que o produto mundial será feito predominantemente por máquinas e robôs inteligentes e que, por isso, os trabalhadores vão perder seus empregos. Afinal, em alguma medida isso já ocorreu. Em meados dos anos 1950, nos Estados Unidos, os trabalhadores de agricultura e da indústria (os macacões azuis) foram ultrapassados, em número, pelos trabalhadores do comércio, bancos, saúde, educação e serviços em geral (os colarinhos brancos).

Atualmente, mesmo sendo um grande produtor rural que abastece o mercado interno e exporta em larga escala, os Estados Unidos têm apenas 3% de sua população na zona rural. Daqui a 10 anos, essa taxa será de apenas 1%. No Brasil, em 1970 havia 46% da população no campo. Atualmente, segundo o IBGE, apenas 12,5% das pessoas estão na zona rural e, no início da próxima década, serão apenas 5%. É a era da agricultura sem gente, ou com pouca gente.

Esse fenômeno vem ocorrendo também na indústria de transformação, cada vez mais automatizada e maquinizada. O emprego na indústria não cresce na mesma proporção em que cresce o produto industrial. É óbvio, então, que as máquinas, os robôs cognitivos e as tecnologias modernas vão executar milhões de tarefas sem necessidade de operário humano. Mas, mesmo essa onda que parece inexorável permite indagar em que magnitude isso ocorrerá.

Em uma palestra, perguntei ao palestrante alarmista: será mesmo que os empregos para os humanos vão acabar nessa proporção que andam afirmando por aí? E adicionei: o que têm em comum países como Estados Unidos e Alemanha, de um lado, e Brasil, Somália e Afeganistão, de outro, para que todos sofram as mesmas consequências? Lembrei que, em abril de 2018, o famoso presidente da Tesla e da SpaceX, Elon Musk, afirmou que poderemos ver um futuro cheio de robôs desempregados e, embora seja um entusiasta da tecnologia, ele resolveu demitir os robôs de suas linhas de produção e colocar no lugar deles o bom e velho ser humano.

Elon Musk já havia criado polêmica em novembro de 2016, em uma entrevista de repercussão global, quando declarou seu medo de que a inteligência artificial e os robôs possam roubar os empregos dos seres humanos, de forma que a única saída seria o governo tributar a produção dos robôs e pagar um salário para toda a população. Naquela época, ele se incluía entre os gurus alarmistas, e sua preocupação teve grande repercussão.

Musk afirma que as máquinas irão tomar o lugar do trabalhador humano num ritmo lento, começando por trabalhos banais e aos poucos avançando para áreas mais complexas. Em 2014, ele já havia dito que a inteligência artificial é a maior ameaça à humanidade quando acrescentou: “estou cada vez mais inclinado a achar que deve haver alguma regulamentação, talvez em nível nacional ou internacional, para garantir que não façamos algo muito estúpido”.

Que ele gosta da polêmica, todo mundo sabe. Em abril de 2018, ele disse que a automação excessiva na Tesla foi um erro, um erro dele próprio, e que os humanos estão sendo subestimados. Como sua empresa andou tendo problemas sérios, o senhor Musk resolveu abandonar o sistema de esteiras automáticas na linha de produção de veículos e disse: “devemos confiar mais nas habilidades humanas”. Não se pode julgar a revolução tecnológica atual pelas declarações de apenas um megaempresário, é claro, e a substituição de humanos por robôs ocorrerá em alguma escala, sem dúvida.

Entretanto, os rumos do emprego dependerão dos empregos criados. A consultoria McKinsey, um gigante do setor, publicou um vasto relatório, em dezembro de 2017, sob o título Jobs Lost, Jobs Gained: Workforce Transitions in a Time of Automation, no qual fala dos novos tipos de trabalho e dos empregos que serão gerados nas próximas décadas. Quem afirma saber o que vai acontecer, a rigor, está emitindo apenas uma opinião, de resto sujeita às mais desconhecidas variações. O futuro tem a mania de contrariar até os mais sábios dos profetas. De qualquer forma, o problema existe e deve ser enfrentado.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.

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