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 | Luciano Mendes/Arquivo Gazeta do Povo
| Foto: Luciano Mendes/Arquivo Gazeta do Povo

A máxima de que “o papel aceita tudo” cabe muito bem ao informe profundamente demagógico tornado público dias atrás pelo governo do Paraná. Ele anuncia a “ampliação em mais de 10 mil hectares de áreas protegidas” em todo o estado. Toda essa imensidão agregada nos longos sete anos de um governo que, seguramente, pode ser considerado o pior da nossa história em termos de proteção do patrimônio natural dos paranaenses.

As palavras proferidas pelo atual presidente do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), Luiz Tarcísio Mossato Pinto, evidenciam o descaramento da atual gestão. Em comunicado oficial, ele diz que “o trabalho demonstra que o governo estadual tem um compromisso com a conservação ambiental. Além do combate ao desmatamento ilegal, nós estamos preocupados em proteger os remanescentes que ainda existem”, defende.

Mas como pode o IAP ter alguma preocupação com a fiscalização do desmatamento se, desde o início do governo Beto Richa, está paralisado o convênio que representa o repasse de recursos ao Batalhão da Polícia Ambiental do Paraná (BPAmb), além de haver um impedimento administrativo para que o efetivo realize autuações em campo? Ademais, Beto Richa e Tarcísio Mossato cansaram de subir em palanques afirmando para todos que a fiscalização ambiental não era uma prioridade. Supostamente, a prioridade seria a educação ambiental. Mais uma inverdade. Entre 2016 e 2017, nem um centavo sequer do Fundo Estadual do Meio Ambiente (Fema) foi alocado para projetos de educação ambiental.

O IAP hoje não consegue assumir suas responsabilidades mínimas

Não saiu do papel nenhum programa de apoio aos proprietários de Reservas Particulares do Patrimônio Natural, as RPPNs, mesmo tendo sido este um compromisso assumido no início da gestão atual. Não existe um metro quadrado de áreas privadas sendo protegido com apoio do poder público no estado. Ou seja: se for para elogiar alguém, que sejam os proprietários que tomaram a decisão de criar suas áreas de proteção oficiais, sem nenhum apoio governamental. Não é admissível creditar a essa gestão alguma responsabilidade nessas poucas boas novas em tempos de caos.

No caso das áreas do Litoral que foram agregadas e propagandeadas, saibam os leitores que todas já eram públicas. E que não custaram um centavo as trocas anunciadas. O Parque Estadual do Palmito e a Estação Ecológica de Guaraqueçaba, unidades de conservação estaduais literalmente abandonadas nos últimos anos, ganharam, em extensão, terras da antiga Banestado Reflorestadora, depois Ambiental Paraná e depois Instituto de Florestas do Paraná (recentemente criado e já extinto).

A história, no entanto, é ainda pior. As terras, que eram desta outra autarquia, sempre mantiveram um contingente contratado para fazer a fiscalização das áreas, uma vez que havia compromisso para a manutenção adequada das reservas de palmito existentes nessa propriedade. Agora, com a passagem de tudo para o IAP, 100% das terras anunciadas como fruto de uma intervenção positiva do governo estarão totalmente desprotegidas.

Leia também:Polícia Ambiental, um aniversário com pouco a comemorar (artigo de Clóvis Borges, publicado em 17 de abril de 2017)

Leia também:Remando contra a corrente (artigo de Malu Ribeiro, publicado em 31 de julho de 2017)

Que fique claro para todos: o IAP hoje não consegue assumir suas responsabilidades mínimas. E a agenda da conservação não é prioridade, em absoluto. Interesses políticos de grupos setoriais dominaram essa instância do poder público a ponto de desvirtuar, de forma nunca vista, o trabalho de uma instituição e de profissionais que deveriam ser muito mais valorizados. O descontrole é tamanho que até o suporte à proposta infundada de diminuição da APA da Escarpa Devoniana partiu, como se fosse algo normal, do próprio IAP. Em nome do Conselho Gestor da APA, o presidente do instituto assinou a solicitação do estudo à Fundação ABC, que propôs a mutilação da área. O conselho, no entanto, diz nunca ter acordado coletivamente com a decisão. Além disso, o mesmo IAP hoje defende o licenciamento da PR-340, em Antonina, que já foi proibido em decisão colegiada do TRF4.

Responder inverdades veiculadas pelo governo é uma tarefa que precisa ser feita por uma questão de transparência e respeito com a população paranaense. Mas é curioso que uma administração fracassada, conivente com toda sorte de flexibilizações que dilaceram o que ainda resta de áreas naturais no estado, ainda tenha o descaramento de contar vantagem. E faz isso suportada por uma agenda de conservação fantasiosa e investimentos em publicidade falaciosa. A prática não é inédita. Recentemente, o portal Livre.Jor lembrou que, só em 2016, o governo do Paraná gastou dez vezes mais com propaganda do que com publicidade legal, que é a divulgação de avisos, balanços, relatórios e comunicados que órgãos e entidades da administração são obrigados a tornar públicos por lei ou regulamento. Foram R$ 131 milhões com propaganda e R$ 13 milhões com publicidade legal, somando R$ 144 milhões com divulgação no ano passado. De janeiro a junho deste ano, R$ 75 milhões foram dedicados.

Ao contrário do que costuma ser feito pelo governo, como se vê, diante de informações tão abusivas como as divulgadas, deveria existir ao menos uma condição de silêncio e reclusão de atores públicos que tanto nos envergonham.

Aristides Athayde, advogado, é membro do Observatório Justiça e Conservação, da Comissão de Direito Ambiental da OAB-PR e fundador do Hub Verde.
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