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Em grande parte do estado do Paraná, é possível encontrar exemplos que expõem a fragilidade estrutural da Justiça de primeiro grau por falta de recursos

Na semana que passou, os meios de comunicação destacaram a discussão, pela Assembleia Legislativa do Paraná, de possível corte nos valores destinados pelo orçamento do Estado ao Poder Judiciário e, por extensão, ao Ministério Público, por meio de emenda à Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Mesmo sem apreciar a questionável legalidade da emenda, é preciso ressaltar que ela altera disposições aprovadas por lei, a partir das quais tanto o Tribunal de Justiça como o Ministério Público elaboraram seus respectivos planejamentos financeiros para o próximo exercício.

E fulmina com qualquer pretensão de melhoria, prejudicando todos os que necessitam recorrer à Justiça. Em última análise, também prejudicando o próprio desenvolvimento do estado. Não há como dizer-se desenvolvido um estado que não destina o mínimo de recursos para o sistema judiciário.

Por ironia, na semana passada comemorou-se o Dia da Justiça. A data passou em branco aos olhos da quase totalidade da população, incluindo os que sonham com uma justiça acessível e célere, a quem a verdadeira Justiça deveria ser implantada. Se existe algum motivo para comemoração, devemos voltar os olhos à Justiça Federal e à Justiça do Trabalho, instâncias privilegiadas em relação ao primeiro grau da Justiça comum.

Conforme relatório do Conselho Nacional de Justiça, de 29 de junho deste ano, o Paraná destina apenas 0,43% do seu Produto Interno Bruto ao Poder Judiciário, contra a média nacional de 0,66%.

Há mais de 30 anos, o fórum cível da capital funciona no mesmo prédio, o Edifício Montepar. O local é tão precário que há servidores arquivando processos em suas próprias residências, por falta de local adequado nas dependências do fórum.

As varas de Família, também mal abrigadas na antiga sede da Legião Brasileira de Assistência, eram até este ano apenas quatro. Agora são seis, mas o Tribunal de Justiça não consegue instalar outras duas, já criadas. Uma situação recorrente, já que em 38% das comarcas espalhadas pelo Paraná existem varas criadas desde 2003 e não instaladas.

É inacreditável que existam varas da Fazenda Pública com mais de 120 mil processos. Ao todo, existem mais de 2,8 milhões de processos em andamento na Justiça do Estado.

A Comissão para Diagnóstico Estrutural da Magistratura de Primeiro Grau, constituída pela Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), em relatório de julho passado constatou igualmente deficiências graves, como o porcentual de 75% de comarcas que usam funcionários cedidos por órgãos estranhos ao Poder Judiciário, entre eles prefeituras. Sem esses funcionários, os serviços entrariam em colapso. Esta improvisação contribui para a insegurança aos juízes.

A informatização é outro ponto de estrangulamento. Enquanto a média brasileira de aplicação de recursos neste setor é de 3,2% do orçamento do Poder Judiciário, no Paraná ela chega a 2,2%, praticamente um terço a menos.

A carência é tal que vemos o Poder Judiciário na posição humilhante de mendigar recursos, situação também enfrentada pelo Ministério Público do Paraná, em relação a seus congêneres de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A separação de poderes, ainda que interligados entre si, deve implicar em maior destaque ao Judiciário, sem que isto seja considerado um favor.

Hoje, em grande parte do estado do Paraná, sem maior esforço na procura, é possível encontrar exemplos que expõem a fragilidade estrutural da Justiça de primeiro grau por absoluta e crônica falta de recursos. Nem mesmo as mudanças no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal, ora em análise no Congresso Nacional, devem melhorar significativamente o lento fluxo de tramitação dos processos no primeiro grau.

O Paraná não pode se dar ao luxo de, mais uma vez, preterir os investimentos no Poder Judiciário e, por extensão, no Ministério Público, sob o discutível argumento do corte orçamentário, posto que tal medida vai em prejuízo aos interesses da população, que espera, impaciente, por uma Justiça que lhe permita motivos para comemoração.

José Lucio Glomb é presidente da OAB Paraná.

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