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Duas palavras estão na moda: empreendedorismo e inovação. Pelo empreendedorismo, os indivíduos são estimulados a ganhar a vida como autônomos ou como empresários, fora do emprego assalariado. Mas há um problema: nos cursos de treinamento, os estudos de caso trazem uma overdose de Steve Jobs, Bill Gates e outros megaempresários norte-americanos, como exemplos de iniciativa empreendedora bem-sucedida.

O ruim disso é que em sua maioria os alunos de cursos de treinamento médios ou superiores vão passar muito longe desses megaempresários, aves raras no panorama empresarial. A boa notícia é que há milhões de oportunidades abertas a indivíduos com iniciativa para negócios pequenos e atividades simples. Essas oportunidades estão por toda parte, à espera de que alguém as descubra.

Criou-se no imaginário popular que a humanidade precisa de invenções bombásticas

Outra palavra da moda é “inovação”. Há uma onda de megalomania nos cursos e conferências, em que os exemplos mais citados são o iPhone, o iPad, o Google e outros produtos da moda, que também estão longe da imensa maioria de empreendedores. Meu questionamento é se, ao focarmos nos exemplos dos iPhones e dos Bill Gates da vida, não desestimulamos os candidatos a empreendedores justamente por eles sentirem que tudo isso está muito distante de sua linha de horizonte.

Entre as grandes inovações estão algumas de acachapante simplicidade e o mundo continua à espera de soluções para problemas simples e pequenos. Durante décadas, pessoas amargaram desconforto e castigaram suas vértebras carregando malas pesadas em rodoviárias e aeroportos do mundo. Demorou até que foram inventados os carrinhos para transporte de malas, uma solução precária e limitada.

Foram necessários seis mil anos desde a invenção da roda pelos mesopotâmios e 30 anos depois que o homem foi à lua para alguém ter a revolucionária ideia de colocar rodinhas miúdas sob a própria mala. Como uma inovação tão simples – e tão importante – pôde demorar tanto? Confúcio dizia que “a simplicidade é o último degrau da sabedoria”. Outros exemplos são o clip e o grampo de papel, dois inventos completamente simples, sem os quais o mundo não funciona direito.

Mas a simplicidade não é fácil. Criou-se no imaginário popular que a humanidade precisa de invenções bombásticas e que empreendedorismo é ser um novo Steve Jobs. Não é nada disso. Um dos exemplos mais malucos de estupidez, que infernizou a vida de milhões de pessoas e empresas, é o caso do selo. Sim, esse selinho que colocamos nos envelopes de cartas, mas que já foram impressos em bilhões de unidades para servirem como recibo de pagamento de impostos e outras contas.

Até os anos 1970, um contribuinte ia à “coletoria de impostos”, levava um cheque e a guia do tributo, pagava o governo e sobre a guia eram colados selos em fila com os valores até os centavos, como prova da quitação do débito. Só que o selo era um produto industrial tão complexo quanto uma cédula de dinheiro e, de vez em quando, a casa da moeda não abastecia de selos as milhares de agências de renda e os bancos... e o país entrava em crise.

Após décadas de ditadura do selo, alguém teve a ideia brutalmente simples de criar uma maquininha autenticadora, que somente as agências de renda e os bancos podiam possuir, a qual imprimia o valor pago sobre a guia de papel e pronto, o recibo estava dado. Foi uma revolução, que vista em retrospecto parece uma brincadeira infantil. Com um pouco de esforço, você pode identificar problemas miúdos que infernizam sua vida à espera de alguma inovação simples e revolucionária da qual o mundo vai rir no futuro.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.
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