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| Foto: Albari Rosa/Gazeta do Povo

Muitos defendem a legalização das drogas. Alegam que  a medida traria mais regulação e controle, hoje nas mãos dos traficantes; permitiria arrecadar impostos que seriam usados para tratar os viciados e reduziria o “inchaço” nas prisões. Há experiências nesse sentido, em todo o mundo, mas que não alcançaram esses objetivos. Embora o tema permaneça polêmico, existem ainda aqueles que incentivam o consumo e a liberação total das drogas. Fazem isso usando músicas, postagens em mídias sociais, marchas nas ruas, shows e outros meios. São apologias ao crime, uma vez que incitam publicamente a prática de crime.

Artistas, influenciadores, jornalistas, políticos, e todas as pessoas que trabalham junto à formação de opinião pública devem atentar para as consequências de seus comportamentos e declarações sobre o assunto. É o caso de Marcelo Freixo, deputado federal e pré-candidato à prefeitura do Rio de Janeiro pelo PSol. Em 2016, quando também se candidatou a prefeito do Rio, ele defendeu uma orientação a usuários de crack sobre a “dosagem segura” da droga. Mesmo se fosse possível uma dosagem segura, o crack é tão devastador que o cérebro do indivíduo possivelmente não teria lucidez para discernir qualquer dosagem segura.

A denominação “crack” advém do som produzido durante a exposição da pedra de crack ao calor do fogo, normalmente usando uma espécie de cachimbo, permitindo ao usuário aspirar grande quantidade de fumaça. A substância pode também ser triturada e fumada, misturada a cigarros de fumo ou de maconha conhecidos como “pitillo” ou “Brazuco”, o que potencializa ainda mais os efeitos da droga, causando dependência química por causa da quantidade de produtos tóxicos utilizados na fabricação. O baixo custo e a rapidez com que atingem o cérebro -- de 3 a 5 segundos, produzindo efeitos que duram cerca de 10 minutos -- fazem com que se torne popular e com alto poder de viciar.

O crack largamente consumido no Brasil é um produto derivado da cocaína extraída da folha de duas plantas nativas da América do Sul: Erythroxylon coca, originária da Bolívia e Peru, e Erythoxilum novogranatense, originária da Colômbia e Venezuela, e que, com o cultivo, passaram a existir também em outros países da América do Sul e América Central, inclusive na Amazônia brasileira. A cocaína extraída da folha da planta pode ser consumida na forma de pasta-base, também conhecida como “Merla”, da qual deriva o crack, que, para chegar à forma pastosa, passa por processos químicos em que são utilizados produtos como ácido sulfúrico, querosene de aviação ou gasolina. O custo de fabricação da pasta-base de cocaína é relativamente baixo, pois são utilizados produtos químicos de fácil aquisição no mercado, antes de passar pela fase do processo de destilação e refino para obter a cocaína em pó ou o cloridrato de cocaína.

Existem duas formas conhecidas de se obter o crack e ambas surgiram por motivações distintas. A primeira variedade do crack surgiu nos Estados Unidos, na década de 1980, nos bairros pobres de grandes cidades como Nova York, Los Angeles e Miami. Essa espécie de crack derivada da cocaína em pó é uma droga considerada cara para os padrões dos usuários de poder aquisitivo baixo, o que motivou a busca de alternativas para aumentar a quantidade sem perder a capacidade de gerar efeito mais forte e duradouro. Com esse objetivo, surgiu a segunda forma, a partir da cocaína misturada a outras substâncias, como bicarbonato de sódio, amoníaco e água destilada. Com a mistura se obtém uma substância pastosa que, depois de ser submetida a temperatura elevada, passar por processo de decantação e ser submetida a resfriamento em água gelada, resulta na pedra de crack. Esse procedimento simples, além de aumentar a quantidade da droga para o consumo, proporciona maior lucratividade aos traficantes. O baixo custo, aliado à facilidade do acesso por se tratar de uma droga que pode ser elaborada em ambiente caseiro e produz efeito similar à cocaína consumida pela via endovenosa, atrai não só consumidores de poder aquisitivo mais baixo que não têm condições financeiras para consumir a cocaína em pó, como também os usuários que buscam drogas capazes de produzir efeitos instantâneos e intensos.

A variedade de crack consumida no Brasil é obtida a partir da pasta-base, ainda na primeira fase do processo de fabricação da cocaína em pó, e passa por processo semelhante à primeira variedade, uma vez que é também submetida a choque térmico, após aquecida a uma temperatura de cerca de 100 ºC, e imergida em água gelada, transformando a pasta-base em uma substância sólida e quebradiça, sendo depois partida em pedaços de aproximadamente 1 grama ou triturada, pronta, portanto, para o consumo.

Acredita-se que o aumento do consumo de crack no Brasil deve-se principalmente a três fatores: as dificuldades por parte dos traficantes em obter substâncias químicas utilizadas no processo de fabricação e refino da cocaína, graças ao trabalho repressor da Polícia Federal; a necessidade do usuário em obter um maior efeito sobre seu organismo com a mesma quantidade de droga; e o interesse dos traficantes em aumentar a sua lucratividade.

É trágica e inusitada a situação em que se encontram os jovens dependentes da malfadada droga que é o crack, espalhados principalmente pelas ruas das grandes cidades do país. Entretanto, têm sido identificados casos de consumo do crack nas lavouras de cana de açúcar e fazendas, prova de que não há limite para os traficantes de crack, droga que, por causa do baixo custo, torna-se acessível aos jovens de baixo poder aquisitivo.

Em suma, o crack se enquadra no grupo das drogas muito ofensivas, que têm a capacidade de levar seus consumidores à dependência química em tempo recorde, causando danos devastadores e irreversíveis no organismo de seus usuários. É altamente tóxico devido ao tipo de produtos químicos utilizados. Não se pode falar, como Freixo fez, que o “tratamento deve ser personalizado em um projeto terapêutico singular e planejado em etapas de curto, médio e longo prazo”. É irresponsabilidade. Melhor conscientizar e difundir informações sobre o crack. Dessa forma, corre-se menos riscos de achar que se trata de uma droga recreacional e amena e que pode ter uma dose segura.

*Carlos Arouck é policial federal formado em Direito e Administração de Empresas, instrutor de cursos na área de proteção, defesa e vigilância, consultor de cenários políticos e de segurança pública, e membro ativo de grupos ligados aos movimentos de rua.

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