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 | Priscila Forone/Gazeta do Povo
| Foto: Priscila Forone/Gazeta do Povo

Historicamente, a relação entre as operadoras de planos de saúde, profissionais prestadores de serviços e usuários não é totalmente harmônica. Cada agente do jogo apresenta interesses particulares que moldam seu modo de agir e aumentam a busca pelo Poder Judiciário para a solução de demandas de saúde.

Entre as reivindicações dos profissionais estão os reajustes dos honorários de procedimentos, a menor interferência dos planos nas solicitações de exames e cautela na imposição de glosas (negação do pagamento). Pacientes apontam a limitação na cobertura de procedimentos e aumento dos custos.

Operadoras são empresas que têm por atividade final gerenciar a prestação de cuidados de saúde com o objetivo de auferir o máximo lucro para seus sócios ou acionistas. Então, estas devem, naturalmente, apoiar decisões como a redução de custos por parte dos profissionais, a diminuição da demanda de exames complementares e a limitação das intervenções cobertas.

O equilíbrio de benefícios não é buscado por meio de princípios ético-morais, mas determinado pelas leis do mercado

Neste contexto, é possível identificar três atores com interesses próprios e divergentes. Operadoras querem elevar o lucro reduzindo custos com honorários e coberturas; profissionais aspiram uma adequada remuneração, reduzindo o ganho dos acionistas; e pacientes, como consumidores, desejam o máximo de qualidade pelo menor valor pago.

As relações observadas remetem à competição descrita pela Teoria dos Jogos, proposta em 1944 por Neumann e Morgenstern. Nela, não é possível que todos os jogadores ganhem, pois, sempre que o benefício de um aumentar, será à custa dos outros. Além disso, o equilíbrio de benefícios não é buscado por meio de princípios ético-morais, mas determinado pelas leis do mercado.

Como qualquer relação de mercado, esta deve ser tutelada pela legislação e pelos órgãos reguladores (no caso, a Agência Nacional de Saúde). Conhecendo as regras, os jogadores firmam concordância entre si por meio de contratos de direito civil, sem coerção, para aceitação das regras ou participação no jogo.

Leia também: Planos de saúde: quanto custa quebrar as regras? (artigo de Marcio Coriolano e Sandro Alves, publicado em 2 de janeiro de 2015)

Leia também: A quem interessam os novos procedimentos impostos aos planos de saúde? (artigo de Cadri Massuda, publicado em 9 de janeiro de 2018)

Considerando que o vínculo entre profissionais e pacientes é intermediado pelas operadoras, poderia se pensar que aqueles poderiam recusar o contrato. Entretanto, a formação técnica das grades curriculares das faculdades das profissões da área da saúde torna os profissionais partes vulneráveis para esta decisão. Sua opção pela busca da intervenção de órgãos de classe para equilibrar as relações se depara, muitas vezes, com a limitada representatividade destes.

Os pacientes, por sua vez, recorrem à judicialização da saúde para alcançar seus interesses, tornando o sistema judiciário mais caro, moroso e mais desigual na distribuição social dos recursos.

Operadoras levam vantagem no jogo quando têm maior poder econômico e político. Profissionais sujeitam-se ao jogo porque exercem suas profissões num ambiente de alta competição – logo, com honorários reduzidos. A sociedade depende do jogo quando é tributada sem receber a contrapartida equivalente do Estado quanto à prestação de serviços de saúde.

Nas relações entre os agentes, existe a tendência de estes tentarem maximizar seus ganhos, mesmo que esta decisão seja ruim no aspecto coletivo. Do ponto de vista ético, todos deveriam ceder para alcançar um equilíbrio, mas as decisões dos jogadores priorizam a vantagem econômica ditada pela lógica, independentemente do julgamento moral, pois, para entender os conflitos por meio da razão, não há espaço para conceitos subjetivos de “bem” e “mal”.

Giorgia Bach é advogada na área da saúde. Alcion Alves Silva é doutor em Epidemiologia.
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