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Numa sorrateira articulação às escuras, no dia 22 de dezembro de 2003, o governo Lula realizou uma manobra para sancionar a Lei 10.826/2003, conhecida como Estatuto do Desarmamento. Às vésperas do Natal, quando o foco já estava deslocado das atividades do Congresso e direcionado às preparações festivas, a ideia era instituir o desarmamento dos cidadãos em todo o território nacional.

Na ocasião, era nítida a tentativa de sancionar o projeto no chamado "apagar das luzes". Além disso, era época do esquema criminoso apelidado de mensalão, que se valeu de transferências milionárias para consolidar compra de votos e apoio de parlamentares a projetos do governo, circunstância que lança inegável suspeita sobre a legitimidade dos votos dos parlamentares que aprovaram o Estatuto. Naquela oportunidade, criara-se um verdadeiro lobby em prol do desarmamento dos cidadãos.

Em outubro de 2005, o governo federal realizou um referendo para consultar se a população era favorável à proibição da comercialização de armas de fogo e munições no Brasil. A resposta foi esmagadora: 64% votaram contra.

Apesar do claro resultado do referendo, normas rígidas e burocráticas do Estatuto do Desarmamento restringem e quase impossibilitam o acesso da população às armas de fogo; pior, dificultam até que o cidadão que adquiriu uma arma de fogo anteriormente consiga renovar seu registro.

A atual legislação foi apresentada como solução para reverter os altos índices de homicídios constatados no país e reduziu em 90% o comércio de armas. Das cerca de 2,4 mil lojas especializadas registradas na Polícia Federal no ano 2000, restavam, em 2010, menos de 280.

No mesmo ano de 2010, contudo, foram registrados mais homicídios do que antes do Estatuto, no total de 52.260. Já em 2012, o Brasil alcançou seu recorde histórico de homicídios em um ano, com 56.337 assassinatos (29 ocorrências a cada 100 mil habitantes), de acordo com o Mapa da Violência, estudo adotado oficialmente pelo Ministério da Justiça. A ONU, idealizadora da teoria do microdesarmamento, estabelece como aceitável o índice máximo de 10 homicídios por 100 mil habitantes. A partir daí, a violência é considerada epidêmica. É o nosso caso.

Do ponto de vista de seus resultados práticos, medidos por números reconhecidos oficialmente, não há nenhum efeito positivo que possa ser atribuído à lei atual.

No dia 26 de novembro deste ano, a Câmara dos Deputados realizou uma audiência pública para debater, às claras, o Projeto de Lei 3.722/12, que reestrutura a regulamentação sobre armas de fogo e munições no país. É um texto ainda pautado em rígido controle sobre a circulação desses artefatos, que nem sequer restabelece a realidade anterior ao Estatuto. Mas contém avanços inegáveis, ao aliar um sistema de controle efetivo a critérios objetivos, tornando claros os requisitos que precisam ser satisfeitos por quem pretenda possuir ou portar armas para autodefesa.

O projeto, como esperado, é alvo de críticas ferrenhas por entidades desarmamentistas, que o atribuem exclusivamente a um chamado "lobby da bala", nitidamente sem considerar o resultado do referendo de 2005 e os efeitos práticos obtidos nos últimos 11 anos de vigência das restrições às armas. Para a sociedade, a visão parece ser outra. Desde que apresentado (abril de 2012), o projeto figura entre os recordistas em manifestações populares, com uma aprovação superior a 85%.

Espera-se que a proposta seja votada ainda neste ano na comissão especial que a analisa na Câmara dos Deputados. Se forem considerados os resultados da lei atual e o anseio popular, não há como se esperar outro desfecho que não sua aprovação. Pode ser um importante avanço para corrigir uma experiência que nitidamente não funcionou.

Fabricio Rebelo, bacharel em Direito e pesquisador em segurança pública, é diretor-executivo da ONG Movimento Viva Brasil.

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