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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

Nossa sociedade aprisiona a natureza em pequenas ilhas, seja no meio urbano ou no campo. Damos a estes pequenos espaços o nome de parques e os criamos para que possamos ter liberta a consciência pelo crime de ecocídio que diariamente cometemos em nome do nosso desenvolvimento. Enquanto reservamos pequenas amostras de vida em ambientes ecologicamente sãos, temos a autorização moral para utilizar e destruir todo o restante, seja pelo concreto dos espigões urbanos ou pela monocultura geneticamente modificada no campo.

Todavia, a exploração econômica de todos esses espaços não parece ser suficiente e recentemente os interesses econômicos começaram a recair sobre os parques. Neste contexto se insere a discussão acerca da privatização da gestão e manutenção dos parques urbanos, únicos locais nas cidades em que pequenas amostras de biodiversidade têm algum espaço e que, ao mesmo tempo, são utilizados pela população em práticas recreativas de lazer e esporte.

Ou a cidade caminha para um espaço de convivência e pluralidade, ou se mostra como mero espaço do mercado

O principal argumento favorável à privatização da gestão e manutenção dos parques urbanos é o de desoneração dos cofres públicos, eis que seriam transferidos à iniciativa privada os ônus financeiros de sua manutenção. Com as concessões, empresas ou entidades privadas teriam algumas contrapartidas que compensariam os ônus financeiros assumidos. Dados recentes apontam que os custos de manutenção de todos os parques, praças e bosques da cidade de Curitiba alcançam o valor de R$ 3,6 milhões por ano, num total de 1.111 espaços. Aparentando se tratar de um valor de grande monta, é preciso contextualizá-lo dentro do orçamento do município, que em 2018 será de R$ 8,7 bilhões.

Por um simples cálculo temos que o valor total gasto em todos os parques, praças e bosques da cidade é de 0,04% do seu orçamento anual. Numa média aritmética simples, para cada um desses espaços públicos seria destinado 0,000036% do orçamento anual do município. Desta forma os números parecem abstratos e de difícil imaginação a quem nunca manejou valores desta monta; assim, os reduziremos proporcionalmente, de modo que possamos visualizar melhor as proporções e porcentagens acima indicadas: se todo o orçamento público municipal tivesse o valor hipotético de R$ 1 mil, o valor total anual gasto com a manutenção de todos os espaços seria de R$ 0,40. Estes 40 centavos ainda devem ser divididos por 1.111 para que cheguemos ao valor médio. Trata-se de um investimento mínimo, insignificante – e, claro, deve ser feita a ressalva de que alguns desses espaços demandam valores bem maiores que outros.

A favor das concessões:A concessão de parques públicos e os benefícios para a sociedade (artigo de

, diretor-executivo do Instituto Semeia)

Com a constatação de que o investimento nos parques, bosques e praças para os cofres municipais é irrisório, restaria o questionamento: qual seria o real motivo da privatização? A primeira resposta possível é a de que novas mercadorias precisam ser criadas, permitindo a expansão de negócios privados sobre os espaços públicos, em que a biodiversidade e o lazer estariam ali dispostos a serviço do lucro de empresários. A experiência mostra que as consequências deste modelo são social e ambientalmente negativas, indo desde a elitização destes espaços até a sua degradação pela realização de eventos que não se encaixam com o perfil dos locais.

A real discussão acerca da privatização dos parques não envolve meramente a decisão de quem arcará com os valores de manutenção desses espaços, mas sim o projeto e conceito de cidade que se pretende. Ou ela caminha para constituir um espaço de convivência e pluralidade, ou se mostra como mero espaço do mercado.

Manuel Caleiro é advogado e doutorando em Direito Econômico e Socioambiental pela PUCPR.
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