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| Marcos Tavares/Thapcom
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Abordar os desafios urbanísticos da capital paranaense hoje e no futuro não é uma tarefa fácil, tendo em vista a dinâmica urbana e a heterogeneidade da cidade contemporânea. Para facilitar essa tarefa, sem a menor pretensão de esgotar o tema, podemos classificá-los em diferentes grupos, como mobilidade, infraestrutura, uso e ocupação do solo e meio ambiente.

Uma das maiores vitrines de Curitiba para o mundo, e tema protagonista de discussões na escala global, a mobilidade urbana enfrenta um momento de mudança de paradigmas. Ao mesmo tempo que ainda percebemos os reflexos de políticas de incentivo ao transporte individual por meio de carros – na contramão do que se discute como solução na maioria dos fóruns urbanos sobre o tema –, novos meios de locomoção surgem e se impõem em nosso cotidiano.

O processo se iniciou com aplicativos de transporte, hoje já rotineiros; passou para novos modais, como bicicletas e patinetes compartilhados; e em pouco tempo teremos veículos motorizados de pequenas dimensões, baratos e eficientes para nos auxiliar nos deslocamentos diários. O que parece um futuro brilhante pode ser um transtorno se não soubermos prever e nos preparar para a transformação. Nosso espaço físico, tecnologia e gestão precisam ser rearranjados para receber esses novos parceiros da mobilidade, sob pena de nos assemelharmos a um computador antigo tentando rodar um programa novo.

Precisamos nos reinventar e fazer valer a fama de cidade inteligente e criativa

Outro ponto é o transporte coletivo, que está perdendo usuários ao longo dos anos, ainda que em menor velocidade, com o perdão do trocadilho. Precisamos nos reinventar e fazer valer a fama de cidade inteligente e criativa. Nossos grandes eixos de transporte aspiram por inovação: imagine as avenidas Sete de Setembro, João Gualberto, República Argentina e outras que contam com canaletas do biarticulado, funcionando como parques lineares orientados para as pessoas e os veículos de transporte de massa passando sob nossos pés. Impossível? Longe disso. Inclusive já existem projetos e houve recurso federal para tal.

Curitiba é – ou foi – conhecida como capital ecológica do Brasil graças a soluções que atrelavam meio ambiente a infraestrutura urbana. É hora de retomar essa tendência, com cuidado especial para o saneamento básico. Durante as águas de março, nos lembramos dos problemas de drenagem superficial que acompanham o desenvolvimento da cidade. Os seis principais rios que formam as bacias hidrográficas de Curitiba sofrem com a sobrecarga d’água que corre muito rapidamente para seus leitos, gerando enchentes cada vez mais recorrentes. Ao longo da história de ocupação da cidade, construímos nas várzeas desses rios e impermeabilizamos suas bacias, o que torna esse problema, atualmente, de difícil resolução. Porém, uma combinação de estratégias pode minimizar os impactos negativos desse processo, como a adoção de infraestruturas verdes – utilização de espaços vegetados que cumpram a função de tubulações e tanques de concreto – e o aumento da permeabilidade do solo nas áreas ainda não ocupadas.

A destinação do lixo é também um desafio. Considerando o esgotamento do aterro da Caximba e os impasses relativos ao consórcio intermunicipal, precisamos identificar soluções de longo prazo que diminuam a pressão de aterros sanitários, com novas tecnologias e processos de redução, reutilização e reciclagem dos resíduos sólidos. A população que vive nas redondezas do aterro aposentado sabe muito bem os impactos negativos que uma área como essa traz, mesmo depois de finalizada sua utilização. O mesmo vale, diga-se, para o entorno de estações de tratamento de esgoto.

Um tema mais palatável, mas com o mesmo grau de complexidade, diz respeito ao uso e ocupação do solo: atividades e construções que realizamos no espaço urbano. A nova forma de vida na cidade está nos trazendo benefícios, com a possibilidade de trabalhar e morar no mesmo local, o que tem levado a um novo processo de ocupação do Centro. Porém, há um grande caminho a ser percorrido para sua revalorização, com maior diversidade de uso e de pessoas.

Leia também: Somente o planejamento urbano viabiliza a mobilidade (artigo de Luiz Augusto Pereira de Almeida, publicado em 29 de setembro de 2018)

Leia também: Tecnologia e sua vitalidade para o futuro das cidades (artigo de Amilto Francisquevis, publicado em 4 de novembro de 2018)

Há também um paradoxo importante no restante da cidade. Se por um lado temos poucas áreas não loteadas no município, por outro estamos longe de utilizar todo o seu potencial. Com o zoneamento atual, nosso território seria capaz de acolher quatro vezes a população residente. Isso demonstra que ainda é possível adensarmos áreas estratégicas sem a necessidade de grandes mudanças de zoneamento, com raras exceções. Já as cidades da região metropolitana experimentam, de fato, um acréscimo importante de população. Quando somadas, têm hoje mais habitantes que a capital. A boa relação de Curitiba com esses municípios é imperativa para que haja um equilíbrio entre ônus e bônus tanto na cidade polo quanto nos municípios vizinhos, indissociáveis e fundamentais para o funcionamento da metrópole.

Nossos parques, praças e outras áreas verdes também devem ser revalorizados, em uma visão da oferta de serviços ecossistêmicos, em que esses locais não só nos permitam relaxar e praticar esportes, mas possam funcionar como um sistema complexo de habitat, metabolismo urbano, suporte, cultura, regulação das águas e do clima, provisão de alimentos, entre inúmeras outras funções que podem e devem ser delegadas aos respiros de natureza presentes em nossa malha construída.

É possível perceber que são muitos os aspectos que enfrentaremos nos próximos anos, e não serão desafios fáceis. Porém, nossa história sugere que os superaremos com criatividade, técnica, discussão e bons exemplos. Vale, então, uma importante consideração: os desafios de uma cidade são responsabilidade de seus gestores, mas não apenas deles. Nosso papel, enquanto cidadãos, vai além de eleger pessoas competentes e corretas, mas também de fazer nossa parte, escolhendo as melhores práticas de mobilidade, gerindo corretamente nossos resíduos, plantando a maior quantidade de vegetação possível, servindo de exemplo. Os desafios da cidade são, em grande medida, também nossos desafios.

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