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Os mascotes democratas
| Foto: Fabio Abreu

No término de uma entrevista a um apresentador popular de rádio, que disse ter interesse em fazer mais perguntas ao candidato democrata na corrida eleitoral americana, Joe Biden soltou a seguinte pérola: “Se você tem problema em descobrir se apoia a mim ou a Trump, então você não é negro”.

Biden é o rei das gafes, mas essa revela mais do que deveria. Dita por algum republicano, seria um escândalo enorme, e a mídia faria uma cobertura ao longo de toda a semana para expor o racismo dos conservadores. Vindo de Biden, a fala foi recebida ou com indiferença, ou mesmo aprovação.

Nas redes sociais, ambiente menos controlado pelos “progressistas”, o ex-vice de Obama foi duramente atacado, e alguns brincaram com o fato de o ex-presidente negro demorar tanto a endossar sua candidatura: talvez Obama não seja mesmo negro! Por trás da brincadeira, porém, há algo da maior seriedade: a tentativa de monopolizar as virtudes e de rotular a raça com base na visão política.

Deixemos de lado a figura de Biden por um instante, e imaginemos Trump repetindo que você não é judeu se não apoiá-lo. Sim, Trump tem feito a gestão mais alinhada a Israel dos últimos tempos, mas soaria absurdo e preconceituoso ele afirmar que todo judeu, por causa disso, tem a obrigação de defendê-lo. Quem ele acha que é para dizer o que todo judeu deve pensar?! Onde ficaria a liberdade de escolha do povo judeu?!

Agora ficou mais fácil entender o absurdo da fala de Biden, não? O que o candidato branco e rico está dizendo, com todas as letras, é que cabe a ele determinar quem merece ser considerado negro e quem é “traidor” da raça, tudo isso com base na visão política. Um negro não poderia ser conservador e republicano, por essa ótica arrogante e preconceituosa. Todo negro teria a obrigação de entender que são os democratas que olham por seus interesses.

Não há nada de novo aqui, infelizmente. Os marxistas sempre usaram a mesma tática: todo trabalhador tinha a obrigação de ser socialista, e quem votasse na direita era um “traidor” da classe. Esse monopólio dos fins nobres visa a impedir qualquer debate sério sobre os meios, como se fosse o socialismo que efetivamente levasse os trabalhadores ao progresso social. A história comprovou o contrário, já exposto pelas boas teorias: é o capitalismo o melhor amigo do trabalhador.

Quem quiser debater a sério sobre a condição de vida das minorias precisa levar em conta que a taxa de desemprego dos negros e latinos estava em seu menor nível histórico no governo Trump, antes da pandemia. Mas aí seria preciso falar de resultados concretos, de realidade, tudo o que a esquerda mais detesta na vida, pois prefere viver de estética e retórica pura.

Obama foi o primeiro presidente americano negro, e isso emocionou muita gente. Mas seu governo foi de fato bom para os negros? Há muita controvérsia, para dizer o mínimo. Quem apostou na superação do racismo viu um presidente oportunista que usou a cartada racial várias vezes para fomentar a segregação com base na raça. Obama alimentou, com tal postura, o movimento radical Black Lives Matter, ele mesmo um movimento um tanto racista e violento. Em que isso ajudou os negros na prática?

Já a política dura do então prefeito republicano Michael Bloomberg, de parar suspeitos com base em “profiling” de acordo com a população carcerária, contribuiu muito para a redução da criminalidade em Nova York. Anos depois e já um democrata, Bloomberg se desculpou por essas medidas consideradas racistas pela esquerda. Mas elas beneficiaram as vidas de milhões de negros nova-iorquinos. Uma vez mais, a esquerda fica com o discurso, e a direita entrega resultados.

Se for para discutir a sério sobre os negros americanos, teremos de lembrar que foi do Partido Democrata que saiu a nefasta Ku Klux Klan, e que o abolicionista Abraham Lincoln era republicano. Martin Luther King Jr., o grande líder dos movimentos civis dos anos 1960, era um pastor cristão com visão independente em política, crítico tanto de democratas como de republicanos, mas muitos sustentam que estaria mais próximo da visão republicana hoje.

O ponto é que a cor da pele nada diz ou deveria dizer sobre a visão política, e é abjeto tentar enquadrar milhões de indivíduos numa só categoria dessa forma, negando-lhes o direito de pensar por conta própria. Essa estratégia é adotada por todo coletivista que anula o livre arbítrio dos indivíduos: todo trabalhador deve ser socialista; todo negro, democrata; toda mulher, esquerdista etc.

Os movimentos raciais e feministas apelam para essa tática como forma de calar qualquer crítica ou debate. É o tal “lugar de fala”, que é lembrado de forma hipócrita e seletiva. Quando é um branco como Biden, ele está perdoado por falar em nome de todos os negros; quando são negros conservadores, como Thomas Sowell, Walter Williams, Ben Carson, Larry Elder, Candace Owens e tantos outros, aí são ignorados ou considerados “traidores”. No Brasil, viram “capitães do mato”, como Ciro Gomes se referiu ao vereador Fernando Holiday.

No fundo, o Partido Democrata se transformou num antro de radicais que fala em nome das minorias, mas segue dominado por brancos milionários. A disputa final nas primárias se deu entre Joe Biden e Bernie Sanders, dois idosos brancos e ricos. Mas se você é negro, gay ou mulher, claro que tem de votar nos democratas, caso contrário não pode ser considerado minoria de fato!

A esquerda sempre cultivou as minorias como seus mascotes, com um olhar condescendente de desprezo, como se fossem seres inferiores que precisam da tutela dos ungidos, e com oportunismo, como forma de impedir o único debate legítimo em política, sobre os meios e não os fins, já que de boas intenções o inferno está cheio.

Rodrigo Constantino, economista e jornalista, é presidente do Conselho do Instituto Liberal.

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