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Charlotte tem 8 anos e foi diagnosticada com síndrome de Dravet. Dahlia, 2 anos, tem câncer no cérebro, assim como Spencer, com 1 ano de idade. Landon tem 2 anos e meio e sofre de leucemia, assim como Mykayla, de 8, e Silas, de 1 ano. Zaki, com 10 anos, é autista. Sydni tem 5 anos e sofre de convulsão, assim como Jillian, uma menina de 8 anos, com paralisia cerebral, e Jayden, outra criança de 5 anos que nasceu com uma grave epilepsia.

O que essas crianças têm em comum? Elas consomem diariamente um óleo extraído das flores da maconha, rico em canabidiol, que tem se mostrado promissor no tratamento de câncer e convulsão. Algumas precisaram se mudar para o Colorado, onde a terapia canabinoide é legal. São centenas de pacientes refugiados cujas famílias advogam pela legalização da maconha nos EUA e compartilham suas histórias na internet.

A regulação da maconha é uma questão de direitos humanos. Ela não se resume ao direito à recreação, mas se trata primeiro de uma lei de compaixão em saúde pública. Não é mera lei de drogas, mas a legalização de um remédio proibido.

Há políticos e médicos no Brasil que sabem que a maconha é remédio, mas negam. Sabem que a solução é o modelo uruguaio, mas se abstêm. Sabem que a regulação arrecada impostos, mas condenam. Eles insistem nos erros do passado que os tornaram políticos e médicos. O ano de 2013 foi um ano de reforma nas políticas de drogas em vários lugares do mundo, menos no Brasil, onde ainda se sofre de um vício terrível: o da "guerra às drogas". Proponho um programa de 12 passos tipo AA, em que os proibicionistas do Brasil poderão discutir por que são viciados e como se salvar.

Primeiro, eles começariam a admitir que não se pode controlar a autonomia de ninguém apenas para manter o statu quo; depois, a acreditar que, por todas as evidências, a política de repressão não alcançou sucesso; o terceiro passo seria decidir que a redução de danos é o modelo de saúde pública superior, que vai minimizar os efeitos deletérios das políticas públicas ineficazes; a seguir, reconhecer que a redução de danos é baseada não apenas na ciência, mas na compaixão e no respeito pelos direitos humanos; depois, admitir que parte da incapacidade de mudar é a dependência de muitos baratos da guerra às drogas, como a militarização da polícia; e, então, prontificar-se a deixar que a maconha medicinal remova todos esses defeitos de caráter.

O sétimo passo seria examinar o passado e os erros cometidos, para aceitar mudanças ideológicas e políticas; depois, fazer uma lista de todos os líderes que evoluíram, e dispor-se a reconhecer publicamente o fracasso da guerra às drogas; a nona etapa é entender que o uso assistido e a substituição de drogas são medidas bem sucedidas, ao contrário da prisão; o décimo passo seria reconhecer que uma política baseada na retórica, não na ciência, contribuiu para muitos dos problemas de segurança pública de hoje; depois, procurar melhorar o contato consciente com a geração que não se viciou na guerra às drogas; e, por fim, procurar levar esta mensagem a outros adictos e praticar estes princípios baseados na abstinência como única solução.

O Uruguai livrou a maconha do tráfico para prover saúde a mais de 3 milhões de pessoas. Crianças do Uruguai com doenças severas já adquiriram o direto ao tratamento com óleo de maconha, enquanto no Brasil políticos fundamentalistas e médicos ultraconservadores continuam a impedir tais avanços.

André Kiepper, mestrando em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública, é analista de Gestão em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz.

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