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O brasileiro trata o espaço público coletivo como terra de ninguém. Temos um senti­­­mento: se não é nosso, outros devem cuidar

O título do último artigo de dezembro de 2011 publicado na coluna da jornalista Ruth de Aquino, da revista Época, define bem nossa relação com o lixo: "Os porquinhos vão à praia". A jornalista se mostrava indignada com a situação das praias do Leblon e Ipanema, bairros da elite do Rio de Janeiro, que no domingo de Natal amanheceram cobertas de lixo. Os que ali circularam no sábado colocavam a culpa numa falha da empresa de limpeza e na tradicional desculpa de que não havia cestas de lixo suficiente (como se fosse muito trabalho levar num saquinho e depositar em lugar adequado). Seriam mais de 25 toneladas de lixo deixadas na areia das duas praias cariocas que estão entre as mais badaladas da cidade maravilhosa, altamente frequentadas por estrangeiros e cantadas em prosa e verso por compositores e músicos famosos como Vinicius de Morais. É bom ressaltar que isso não depende de classe social, seja farofeiro ou fankeira, playboy ou dondoca, o comportamento não difere muito!

Provavelmente na festa da virada não foi muito diferente, acrescentando aos cocos, copos de plástico e latinhas de alumínio, também as rolhas e garrafas de champanhe! Segundo o artigo, para dar conta da limpeza de 56 quilômetros de praias cariocas, são necessários 200 garis que recolhem 70 toneladas de lixo aos sábados e 120 toneladas de lixo aos domingos durante a alta temporada. A praia com mais lixo é a da Barra da Tijuca. Em seguida, Copacabana. De acordo com o prefeito do Rio, Eduardo Paes, os R$ 550 milhões gastos para limpar as ruas, parques, praias, daria para construir 100 escolas num ano, ou 150 creches, ou 200 clínicas da família.

Não vamos pensar que essa é uma situação única do Rio, em fato, o cenário se repete em nos mais de 8 mil quilômetros da costa brasileira. Nas praias do Paraná, cerca de quatro toneladas por dia de lixo são recolhidas pela equipe de limpeza. É necessária uma equipe de 125 pessoas entre pessoal administrativo, motoristas e coletores para deixar a areia branquinha novamente, pronta para receber tudo de novo no dia seguinte! Acrescente-se a isso o aumento do lixo urbano. Na Operação Verão de 2011 foram gastos mais de R$ 10 milhões para recolher o lixo dos sete municípios do nosso Litoral!

O brasileiro trata o espaço público coletivo como terra de ninguém. Temos um sentimento: se não é nosso, outros devem cuidar. Os mesmos que ficaram indignados com os containeres com quase 50 toneladas de lixo hospitalar enviados ao Brasil pelos Estados Unidos (devolvidos agora em janeiro) são aqueles que jogam latinhas de cerveja pela janela do carro ou que levam seus cãezinhos para passear nas calçadas e não limpam o que fica no meio do caminho!

Tenho a impressão de que, quando as pessoas deviam tomar conta do próprio lixo (quando este não tinha tanto plástico), queimando-o no quintal, havia mais responsabilidade sobre o mesmo. Agora é como se fosse um passe de mágica, se coloca na frente de casa e ele desaparece. Fala-se tanto em educação ambiental, e parece que o discurso não passa à prática!

Em uma disciplina de gestão ambiental que ministrava no Curso de Especialização em Embalagem na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), cuja maioria dos participantes era designers gráficos ou profissionais da área de publicidade e que trabalhavam a relação da embalagem somente sobre o foco comercial, resolvi radicalizar. Por três anos levei as turmas no segundo final de semana de aula para uma visita ao aterro da Caximba que recebia todo o lixo de Curitiba e agora está fechado. Reclamavam do cheiro e do desconforto que lhes provocava, mas a mensagem ficava gravada. Aquela embalagem cara, sofisticada e fabricada com materiais que não eram biodegradáveis que eles criaram deixava de servir ao seu propósito em menos de 10 segundos e agora ali estava misturada a todo tipo de lixo imaginável, o glamour se foi, ficou a poluição!

Quem sabe não devemos fazer tours pré-verões a aterros e lixões com os porquinhos que vão às praias todos os anos para poderem entender onde ficarão seus restos!?

Eloy F. Casagrande Jr., coordenador do Escritório Verde da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), é PhD.

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