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Por volta de 1580, Elizabeth I havia determinado que seus súditos sempre usassem um barrete de tricô, e assim as tricoteiras se tornaram grandes produtoras de vestuário. Era um processo lento, demorado e caro. William Lee percebeu que se, em vez de usar apenas duas agulhas, fossem usadas várias agulhas para conduzir o fio, a produção por hora – ou seja, a produtividade – seria muitas vezes maior.

Lee tornou-se obcecado por sua ideia, até que, em 1589, ele inventou uma máquina de tricotar. Poderia ser o início da mecanização da produção têxtil. Mas não foi. Depois de idas e vindas, ele conseguiu, empolgado, que a rainha Elizabeth fosse conhecer sua máquina. A reação da rainha foi devastadora. Ela se recusou a conceder-lhe a patente e ainda o advertiu: "Quanto atrevimento, senhor Lee! Sua invenção pode trazer a ruína aos pobres súditos, privá-los de seus empregos e transformá-los em mendigos". Apesar de revolucionária, a máquina do senhor Lee não foi adotada e uma simples peça de roupa continuou a ser um bem caro e pouco acessível.

Em 1733, John Kay inventou a "lançadeira voadora", um equipamento capaz de revolucionar a produção de tecelagem. O que ele ganhou com isso foi ter sua casa incendiada por uma horda de pessoas que ficaram conhecidas como "luditas", aqueles que eram contra qualquer inovação tecnológica, assim como a rainha da Inglaterra houvera sido no caso de William Lee. Outro sujeito curioso, James Hargreaves, inventou uma revolucionária máquina de fiar hidráulica, e o tratamento que recebeu foi o mesmo dado a John Kay: ele perdeu sua propriedade.

Pois bem, um dos maiores atrasos do Brasil é o sistema de operação de nossos portos. Por causa deles, milhões de pessoas pagam mais caro por tudo que por ali passa, a competitividade industrial é diminuída e o atraso continua. A presidente Dilma, num lampejo de lucidez, percebeu que ou privatiza a operação e a modernização dos portos ou o país continuará com esse sistema arcaico, caro e superado.

Mas eis que aparecem nossos "luditas", aqueles que se opõem a qualquer mudança no ultrapassado sistema de operação dos portos, mobilizando-se contra modificações na legislação de operação portuária. O argumento é sempre aparentemente nobre: o medo de perder empregos. Claro que haverá redução de empregos em determinadas funções, pois muito do que se faz em nossos portos é coisa do século 19. Ocorre que o país não tem saída: ou moderniza sua infraestrutura ou chafurdará eternamente no atraso econômico e, para proteger alguns, a população inteira sofrerá.

Mas o raciocínio dos sindicatos está errado: se mantida a velha estrutura de operação dos portos, o atraso vai punir também aqueles a quem se pretende proteger com a não mudança. Ademais, empregos eventualmente perdidos com as inovações serão substituídos por novos postos de trabalho derivados da modernização e do crescimento. Quando surgiu o computador, não faltou quem gritasse contra o desaparecimento dos empregos das datilógrafas. Com efeito, isso aconteceu. Só que o computador gerou, em torno de si, uma imensa indústria que criou milhões de empregos novos, antes desconhecidos.

A gritaria dos ameaçados é compreensível. Mas não é compreensível o governo ceder – o que ainda não aconteceu, mas pode acontecer, pois os barulhentos são líderes sindicais vinculados ao PT. Nesse tema, a presidente Dilma merece apoio, pois sua proposta destina-se a fazer o que é certo.

José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.

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