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Educar para a verdade, não para a ideologia de gênero

O Brasil vem constantemente amargando os piores lugares em competições internacionais de Ciências e Matemática, muito abaixo das posições alcançadas por países que têm desempenho econômico e carga tributária muito menor que a nossa. O fato de não estar entre os primeiros lugares em tais competições causa crises em países desenvolvidos. Por aqui, nem é notícia.

Isso demonstra que o foco principal da nossa educação não está na técnica, na formação científica e profissional. Isto seria justificável se pudéssemos dizer que a nossa educação não se propõe a formar operários e trabalhadores, mas a desenvolver virtudes sociais e pessoais, de modo a construir um povo mais consciente e fraterno.

Leia a opinião de Paulo Vasconcelos Jacobina é procurador regional da República e mestre em Direito Econômico

Após vários adiamentos, uma comissão especial da Câmara dos Deputados deve votar hoje o projeto de lei do Plano Nacional de Educação para os próximos dez anos. Entre outras disposições inclusivas, o artigo 2.º da versão do projeto enviada pela Câmara para apreciação pelo Senado – que, inclusive, se baseou nas deliberações democraticamente elaboradas e aprovadas pela Conferência Nacional de Educação de 2010 – prevê: "São diretrizes do PNE (...) a superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da igualdade racial, regional, de gênero e de orientação sexual e na erradicação de todas as formas de discriminação". Esta versão do projeto também prevê a flexão de gênero em sua redação (ex. os/as professores/as) com vistas à promoção da igualdade de gênero.

Contudo, o Senado aprovou um substitutivo com alterações. O artigo 2.º perdeu a exemplificação dos tipos de discriminação mais comuns, mantendo apenas a disposição genérica contra "todas as formas de discriminação". Isto apesar dos achados de várias pesquisas em relação à discriminação no ambiente escolar, como a da Fipe/MEC/Inep, que revelou que as atitudes discriminatórias mais elevadas se relacionam a gênero (38,2%), orientação sexual (26,1%), étnico-racial (22,9%) e territorial (20,6%). Esses dados indicam precisamente por que a versão original do artigo 2.º do projeto tem a redação acima.

Na sociedade em geral, essas atitudes se extrapolam além da mera discriminação: 26% dos brasileiros acham que mulher de roupa curta merece ser atacada, segundo o Ipea; em 2010 houve 34.983 homicídios de pessoas negras no país. Em 2012, o governo federal recebeu 9.982 denúncias de violação dos direitos humanos de pessoas LGBT. Esses dados apontam para a premente necessidade de especificar e enfrentar essas e outras formas de discriminação. Este processo precisa começar por um sistema de educação inclusiva.

Em relação à reflexão de gênero, o substitutivo do Senado requer a "supressão, em todo o texto, da flexão de gênero, adotando a forma genérica masculina". Essa disposição perpetuará o machismo. E mais: insistir em usar apenas a forma masculina é um desrespeito às mulheres, que são a esmagadora maioria dos/das profissionais de educação no Brasil.

Há quem já tenha declarado publicamente, em relação ao PNE, que a mulher tem de permanecer numa condição inferior e subordinada ao homem. Outros veem nas disposições propostas no PNE acerca de gênero e orientação sexual uma afronta à instituição da família, porque se recusam a enxergar a realidade das múltiplas formas de família, identificadas inclusive pelo último censo.

É preciso fazer cumprir o que a Constituição estabelece: que todas as pessoas são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, que a educação é um direito de todos e todas, devendo ser garantida a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, e que tanto o Estado quanto a educação pública são laicos. Acima de tudo, é nestes princípios que a proposta original do PNE se baseou na tentativa de garantir a educação inclusiva. Isto deve ser respeitado e sua redação original deve ser mantida, se queremos acabar com o triste quadro de desigualdade, discriminação e homicídios retratado acima.

Toni Reis, doutor em Educação, é membro integrante dos fóruns Nacional, Estadual (Paraná) e Municipal (Curitiba) de Educação.

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