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Precisamos falar sobre o rodízio de funerárias em Curitiba
| Foto: Pixabay

O rodízio de funerárias imposto aos curitibanos desde 1991 é tema recorrente de discussões e questionamentos, mas, infelizmente, segue firme na capital. Cinco tentativas de extinção ou mesmo de medida substitutiva ao rodízio já foram feitas na Câmara Municipal, pelo vereador Jairo Marcelino e pela Femoclam (federação que representa moradores de Curitiba e região), sem obter sucesso. Há quase 30 anos, todos os falecimentos passam pelo Serviço Funerário Municipal, que é responsável pelo sorteio de uma das 26 funerárias aptas à prestação do serviço em Curitiba.

O Decreto 699, que rege o rodízio atualmente, impede que a família de um morador de Curitiba falecido na capital exerça seu direito de escolha, mesmo que o velório e o sepultamento sejam realizados fora da capital. Para aqueles que não moram em Curitiba, a lei estabelece a possibilidade de a família de falecidos em Curitiba escolher a funerária que prestará o serviço, mas apenas em casos específicos.

Esse sistema de rodízio foi implementado na década de 1990, na tentativa de impedir as práticas odiosas de agenciamento e disputa de funerais, por meio de equilíbrio forçado no número de serviços por mês, que resulta na perda do poder de decisão por parte do cidadão, justamente em momento de grande fragilidade emocional e até financeira.

Em várias cidades brasileiras esse desrespeito ao consumidor é coisa do passado. Porto Velho (RO) e Joinville (SC) extinguiram o rodízio funerário por meio de iniciativas do Ministério Público. Em ação direta de inconstitucionalidade na capital rondonense, a relatoria do caso destacou que a norma violava os princípios, estabelecidos na Constituição Estadual, da livre iniciativa e do direito de escolha do consumidor, pois obrigava o cidadão a se sujeitar a tal sistema. No acórdão ressaltou-se o dever do poder público de fiscalizar o correto funcionamento do mercado.

O rodízio de funerárias é uma conduta atentatória à Constituição

Logicamente, mesmo que serviço funerário seja de competência municipal (artigo 30, inciso V, da Constituição Federal), sua regulamentação não pode ferir os princípios das constituições estaduais e a federal. Sendo assim, um município não pode exercer a sua autoridade de modo abusivo ou arbitrário.

Práticas abomináveis como o agenciamento de cadáveres em portas de hospitais e IMLs não devem ser coibidas por meio da eliminação da livre concorrência, como afirmou também o desembargador Vanderlei Romer, quando da extinção do rodízio em Joinville. Entre outros pontos da legislação, o desembargador destacou que o preço de produtos e serviços deve corresponder ao estipulado pelas forças do mercado no justo equilíbrio entre a procura e a oferta, garantindo benefícios para os consumidores e para a coletividade em geral, sendo o poder público encarregado de fomentar a livre concorrência e punir eventuais abusos.

O impacto do rodízio é grande para as empresas, já que o sistema fere direitos à livre iniciativa e à livre concorrência, uma vez que os serviços são padronizados, os preços são tabelados e a busca por clientes é proibida. Por causa de restrições como as impostas pelo rodízio obrigatório, fatos como os que envolveram a família de Deise Betcher podem se tornar comuns.

A moradora de rua falecida na capital não pôde ser sepultada em Santa Catarina, embora os parentes tivessem pedido a transferência do corpo. Sem comprovante de residência no estado vizinho, a família teve de sepultar o corpo de Deise como carente, e reclamou de mau atendimento pela funerária do rodízio. A atitude gera revolta: o impacto da legislação é sentido principalmente pelos mais carentes, sujeitando-os a um tratamento desumano.

A Secretaria do Meio Ambiente defende-se, indicando que o serviço funerário tem “índices muito grandes de satisfação dos usuários”. A afirmação é questionável, já que não há ouvidoria e as reclamações só podem ser registradas se o cidadão comparecer pessoalmente ao local, portando documentos e uma declaração de próprio punho.

Atentos às demandas do mercado, aplicamos uma pesquisa questionando nossos associados: mais de 95% responderam que preferem escolher livremente a funerária que prestará atendimento. Na capital e região, mais de 60% da população já tem assistência funerária, ou seja, já fez sua escolha. Cabe ao poder público garantir que ela será cumprida.

O rodízio de funerárias é uma conduta atentatória à Constituição. A livre concorrência constitui princípio conformador da atividade econômica e, sem ela, todos perdem.

Luis Kuminek é diretor da Luto Curitiba.

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