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Escolas funcionam em países, estados, cidades, regiões dentro delas, e as relações estabelecidas no ambiente escolar em suas atividades pedagógicas são reflexos da vida comunitária; a violência dentro de seus muros tem suscitado espanto pela contradição que representa em relação à missão educativa.

Tal violência certamente não é motivada apenas pela desigualdade social e expectativas frustradas de ascensão e consumo. No contexto deste tipo específico de organização podemos falar em dois tipos de violência: a que ocorre na escola e a produzida pela própria escola. A primeira diz respeito àquelas vindas de fora da escola e que invadem seus limites. A segunda se refere ao efetivado pelos próprios atores escolares, que é gestada intramuros, como as agressões morais, psicológicas ou até físicas; discriminações estereotipadas como tipos de cabelo, gordura corporal, características raciais, opção sexual; institucionalização de competições; depredações do prédio e de equipamentos escolares.

O bullying (do inglês bully = valentão, brigão; termo sem tradução adequada em nosso idioma) é denominação que damos a diversos níveis de violência, e compreender as formas como essa se apresenta no âmbito escolar é um grande desafio a ser enfrentado pelos gestores, pais e educadores. No entanto, enquanto cresce a escalada da violência nas escolas brasileiras, assistimos sem ação eficaz a dualidade entre os cuidados com os direitos de todos, e a impotência diante das ações que seriam necessárias para estabelecê-los. Alunos agridem-se entre si e aos seus professores: a onipresença dos comportamentos agressivos ocorre ao lado de uma aparente sensibilidade excessiva, de um machucado emocional por motivos até fúteis em alguns casos, embora atos de selvageria estejam cada vez mais chegando ao ataque físico.

A onipresença dos comportamentos agressivos ocorre ao lado de uma aparente sensibilidade excessiva

É forçoso reconhecer que crianças, jovens ou mesmo adultos do sexo masculino respondem pela esmagadora maioria destas ações brutais, pois é ainda no conceito de masculinidade que se legitimam competições, individualismos, força corporal, dominação, hierarquia e a coragem de arriscar. À masculinidade também associamos o sentido da honra e da responsabilidade – no que ambos os conceitos têm de melhor e de pior – as atitudes ativas, já que mulheres são mais identificadas com passividade –, o autocontrole, e, porque não: à razão. Meninas são sensíveis, rapazes são racionais.

É de se imaginar que isso traga também um certo sofrimento, já que nem todos, exceto talvez os heróis de gibis, conseguem apresentar todas estas pretensas qualidades, que se relacionam entre si, e principalmente com as questões de poder, tanto entre os próprios homens quanto em suas relações com as mulheres. Estas, por sinal, escapam cada vez mais aos seus controles, sujeitam-se menos à dominação, o que é outro fator de desagregação da autoimagem masculina, nesta fase de turbulências e transformações culturais, em que a ordem patriarcal, cujas origens se perdem no mais remoto da cultura humana ocidental ou oriental, sempre outorgou aos homens o direito de uso da força e de domínio sobre as mulheres e os filhos, animais e toda a natureza.

Leia também: Precisamos debater o bullying (artigo de Esther Cristina Pereira, publicado em 1.º de novembro de 2017)

Leia também: A morte do pai e a morte da pátria (artigo de Rafael Salvi, publicado em 12 de agosto de 2018)

Evidentemente o sistema patriarcal também produz, simultaneamente o aprisionamento masculino em sua posição de autoridade e superioridade, o que, na dependência de sua classe social, etnias e características sociais e culturais do meio, pode representar uma sobrecarga terrível a outras demandas existenciais, como ser bonito e forte, por exemplo.

Reconhecer as definições de hombridade que construímos não é simples para seres em formação, e o fato de termos um modelo hegemônico do que significa ser um homem em nossa sociedade, construído em termos hierárquicos, que desqualifica e marginaliza outras formas dentro do mesmo contexto, é particularmente penoso.

O melhor programa educacional valoriza o pensamento racional, o discernimento das nossas limitações, a capacidade de resistir às pressões do dia-a-dia, dos hábitos e mesmo dos desejos. Se o sistema educativo não tem qualidade, o custo virá para todos nós.

Wanda Camargo é educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil (UniBrasil).
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