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"O argumento da intimidação é uma confissão de impotência intelectual." Ayn Rand

Muitas crianças e adolescentes não gostam da escola e isso pode não ter nada a ver com notas baixas, mas com relações interpessoais negativas que se estabelecem com colegas e até com professores e funcionários. Não restam dúvidas que ser intimidado e assediado, machuca muito. As escolas tornaram-se pólos geradores de estresse e ansiedade para seus membros e, para muitos alunos somente passar pelos seus portões traz expectativa de ataques à própria pessoa, sem que ninguém saia em sua defesa (seja por medo, seja por divertir-se com a situação ou não por saber o que fazer).

Esse fenômeno de intimidação é conhecido pelo termo inglês "bullying" que, grosso modo, ocorre quando alguém faz ou diz algo de forma sistemática para ter poder sobre outra pessoa. Os ataques podem ser físicos – como praticar assédio sexual, puxar, bater – ou psicológicos – como espalhar fofocas, excluir a vítima do grupo, provocar, colocar apelidos etc. Atualmente, também se reconhece o "cyber bullying", que é o envio de mensagens provocativas via celular, a inclusão de fotos distorcidas em sites, insultos espalhados no "scraps" (comentários) no Orkut ou mentiras espalhadas em nome de outra pessoa etc.

As pessoas podem argumentar que isso sempre existiu e que não há ninguém que não tenha recebido algum apelido irritante ou um olhar atravessado na escola. No entanto, a compreensão das conseqüências do fenômeno é recente, além de a violência estar se espalhando de maneira insidiosa. Uma das conseqüências, tanto para vítimas quanto agressores, é uma tendência significativa para apresentar sintomas depressivos. Por que alguém faz isso? O ser humano quer atenção e afeto e, se não desenvolve habilidades pró-sociais necessárias para obtê-las e ser amado, pode aprimorar habilidades opostas. Assim, o agressor pode desejar apenas ser conhecido e popular (mesmo com a conotação negativa), querer que outros tenham medo dele, almejar ser líder, ter inveja daquele a quem provocam ou ser simplesmente – como dizem os adolescentes – ser alguém "sem noção". Em verdade, parece que falta, basicamente, a capacidade de empatia e valores morais estabelecidos. Pesquisas em diversos países têm revelado que mais de 40% das crianças e adolescentes são alvos de "bullying" regularmente, mesmo nas melhores escolas.

Mas onde estariam as raízes deste problema? Todo comportamento é multideterminado e esse não é uma exceção. A maioria dos fatores que influenciam este comportamento está no ambiente onde a criança se desenvolve, destacando-se as interações na família e na escola. Não é possível se esquecer que nossa cultura prega que "não devemos levar desaforo para casa" e estimula o uso da força e do poder para solucionar problemas. A equipe do Núcleo de Análise do Comportamento da UFPR está coordenando uma pesquisa sobre "bullying" em cinco cidades brasileiras. Tem sido elevado o porcentual de estudantes que relataram sofrer e fazer outros sofrerem. Investigamos as práticas educativas dos pais percebidas por adolescentes e os resultados mostram que as brigas familiares constantes e a punição corporal são fatores de risco para o envolvimento em "bullying". Portanto, gritar, agredir ou intimidar como estratégia educativa não são alternativas adequadas para proteger os filhos de tornarem-se vítimas ou agressores na escola.

A pesquisa ainda indicou fatores de proteção nas famílias: os alunos que relataram pouco ou nenhum envolvimento em "bullying" percebem seus pais como muito afetivos, participativos, notam que há regras claras, supervisão adequada e um modelo moral adequado. Os dados também revelaram que quando crianças e adolescentes consideram as regras da escola justas, claras e inclusivas envolvem-se menos em "bullying", além de relatarem maior apreço pela escola. Quando a escola estabelece limites e conseqüências adequadas para o comportamento dos alunos, inclusive cerceando quaisquer formas de maltrato entre pares, cria-se um contexto onde cada estudante pode desenvolver seu potencial, respeitando a diversidade.

O impacto social pode estender-se por longo prazo, pois os alunos não ficam na escola para sempre. Aqueles que maltratam seus pares nos tempos escolares têm alta probabilidade de agredir outros em sua vida, abusando de cônjuges e filhos, assediando empregados e colegas de trabalho, atacando covardemente pessoas indefesas por mera diversão e perpetuando um ciclo de violência. Se quisermos avanços significativos na luta contra a desigualdade social e a violência, precisamos atacar suas origens, investindo na prevenção por meio do desenvolvimento de habilidades como assertividade, empatia e resolução de conflitos em ambientes onde o respeito, a compaixão, e a pluralidade cultural são celebrados como valores fundamentais.

Lidia Dobrianskyj Weber é professora do Departamento de Psicologia e do Mestrado e Doutorado em Educação da UFPR.

Josafá Moreira da Cunha é graduado em Psicologia, mestrando em Educação da UFPR.

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