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A imprestabilidade dos métodos utilizados pelos institutos de pesquisa, que os resultados das urnas finalmente de­­mons­­tra­­ram, foi o essencial motivo que levou a Justiça Eleitoral para­­naense a julgar ilegais as pesquisas

As impugnações judiciais pelas quais o governador eleito do estado do Paraná conseguiu evitar a divulgação de diversas pesquisas eleitorais foram amplamente exploradas pela mídia nacional, que não demorou em acusar Beto Richa e o Poder Judiciário de estarem tentando censurar a publicação da intenção de voto dos eleitores paranaenses. Em uma única exceção aberta pelo TSE, autorizou-se a divulgação de pesquisa realizada pelo Ibope, na véspera da eleição, segundo a qual haveria rigoroso empate entre os candidatos Beto Richa (49%) e Osmar Dias (49%).

As urnas desmentiram categoricamente tal pesquisa, revelando uma diferença de quase sete pontos porcentuais entre os referidos candidatos. A distorção entre os números divulgados pelo Ibope foi ainda maior em relação à disputa pelo Senado, tendo sido a projeção (Gleisi 33% e Requião 31%) fortemente desmentida pelas urnas (Gleisi 29,5% e Requião 24,8%). É possível afirmar que isso interferiu nas chances de eleição do candidato Gustavo Fruet que, projetado com 18% do eleitorado, acabou em terceiro na disputa, com 23,1% dos votos.

Não foi a primeira e não terá sido a última vez que a idoneidade das pesquisas eleitorais esteja à prova, por mais que os institutos que as empreendam se esforcem em tentar justificar o injustificável, na medida em que completamente banalizada a chamada "margem de erro", válvula de escape técnica que deveria isentá-los perante a opinião pública. A verdade é que não há matemática capaz de explicar tamanhas distorções que podem subverter o resultado do pleito.

Oportunamente, reabre-se o debate sobre aquilo que constitui um dos maiores tabus da democracia moderna: limitações à liberdade de expressão, o abuso da imprensa e o papel do Judiciário.

É preciso discutir a forma como setores da mídia nacional, alinhando-se ao fácil e politicamente correto discurso da pretensa defesa da democracia e da "indevassável liberdade de expressão", sem o menor zelo quanto a uma análise dos fatos colocados em julgamento, resolveram acusar os Juízes do TRE-PR de estarem censurando as pesquisas. Repentinamente, o impedimento da divulgação de pesquisas eleitorais por força de decisões unânimes da Justiça Eleitoral, apoiadas por manifestações do Ministério Público, passou a ser tachado como exemplo de obscurantismo e provincianismo, verdadeira afronta à democracia. A imprensa não pensou duas vezes antes de divulgar também, ostensivamente, que juízes eleitorais seriam alvo de "investigações" perante o Conselho Nacional de Justiça, a pedido dos institutos de pesquisa, lançando indisfarçável e infundada suspeição sobre os magistrados perante a opinião pública.

Em momento algum, todavia, ouviu-se essa mesma mídia sequer questionar os métodos utilizados pelos institutos de pesquisa (empresas privadas, com fins lucrativos e não submetidas a qualquer tipo de controle público ou privado) que, ignorando literais exigências da legislação eleitoral, resolveram simplesmente adotar critérios próprios para selecionar e avaliar os eleitores a serem entrevistados. Outras vezes, como ocorreu com uma das pesquisas elaboradas pelo Datafolha, o TRE constatou impressionante direcionamento das perguntas feitas aos entrevistados, na medida em que eram induzidos à resposta sobre a intenção de voto para o governo do estado, mediante várias e prévias indagações sobre a aprovação do governo do presidente Lula.

Nada disso interessou. Num piscar de olhos, a Justiça Eleitoral virou a vilã e os institutos de pesquisa, verdadeiras vítimas que lutavam para garantir à população o acesso à (des)informação.

A bem da verdade, justamente a imprestabilidade dos métodos utilizados pelos institutos de pesquisa, que os resultados das urnas finalmente demonstraram, foi o essencial motivo que levou a Justiça Eleitoral paranaense a julgar ilegais as pesquisas, impedindo sua divulgação, em exemplar e necessário cumprimento do seu papel constitucional de tutela dos interesses dos eleitores, em especial dos relativos à adequada e isenta informação, pressupostos necessários para o livre e consciente exercício do direito do voto.

Se a deturpação das pesquisas eleitorais pode implicar grave subversão de todo o processo eleitoral, a infundada "censura" que a imprensa opôs contra a atuação da Justiça Eleitoral do Paraná revela-se até mais grave na medida em que, desacreditando-a injustificavelmente perante a opinião pública, colocou em xeque o efetivo e imparcial controle jurisdicional, sem o qual o Estado Democrático de Direito não tem qualquer chance de se afirmar.

Elton Venturi, procurador da República, é professor da Faculdade de Direito da UFPR.

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