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| Foto: Marcos Tavares/Thapcom

Costumamos pensar que a tevê “faça a cabeça” das pessoas (sempre dos outros, claro ). Afinal, é um fato: sempre ganhou a corrida presidencial o candidato com mais tempo de propaganda eleitoral “gratuita”. Mas o problema é que o tempo depende do numero de parlamentares; quanto mais parlamentares apoiam o candidato, mais tempo ele terá. Então, quem vence as eleições ganha por ter mais tempo ou por ter mais apoio? Sem considerar que essa poderia ser uma simples correlação e não uma relação de causalidade.

Na verdade, o que parece acontecer é algo similar ao “viés de disponibilidade”: os candidatos precisam estar na televisão. Se não estão, o eleitor pode nem saber dele ou se esquecer, mas não é isso (e nem cinco ou sete segundos a mais) que vai convecê-lo a votar. Uma vez que todo mundo está lá, você também tem de estar. É como uma empresa sem site, uma celebridade sem Facebook, um cantor fora do Spotify: eles não faturam porque estão lá, mas sem estar lá não faturariam. É como uma corrida armamentista: se os outros têm armas... e se têm armas atômicas...

Uma pesquisa do Ibope de junho de 2017 mostra que, para a escolha do candidato à Presidência, os canais mais influentes são internet, mídia (televisão, jornais e rádio), amigos e parentes. A internet aparecia em paridade com a mídia, e até a superou um pouco quando se trata de “muita influência”. Mais recentemente, o instituto Paraná Pesquisas quis saber qual o meio de comunicação favorito dos eleitores para se informar sobre a eleição. A internet e as mídias sociais tiveram 42,5%, contra 36,7% da televisão. E “televisão” pode significar muita coisa. Além do “horário eleitoral gratuito”, tevê também significa noticiários, talk shows políticos e debates. Difícil diferenciar o peso de cada um. Afinal, o problema da tevê é que não dá para saber a reação (positiva ou negativa) do público. Tempo de exposição não significa necessariamente apreciação.

O problema da tevê é que não dá para saber a reação (positiva ou negativa) do público

Os debates entre presidenciáveis são importantes. Em 1989, Collor (contra Lula) parecia engessado demais, sério demais, elite demais, e colocaram falso suor na testa dele. Depois, ele venceu. Em 1992, Bush pai olhou o relógio durante um debate, como se tivesse pressa, e talvez isso tenha contribuído para fazê-lo perder para Clinton. Em 2014, nada abalou Dilma: a fantástica atuação em que “passou mal” não lhe fez perder votos, mas também não lhe fez ganhar o Oscar. Trump superou Hillary nos debates. Em resumo, não é o fato é em si; depende muito de como os espectadores o percebem.

O que acontece na televisão depois vai para as redes sociais: entrevistas e trechos que depois viralizam, fatos e eventos que viram memes etc. É o que os especialistas chamam de “remediação”. A tevê tem o poder de amplificar tudo, tanto no bem quanto no mal. Mas o WhatsApp também o tem. Existe todo um mundo no WhatsApp: é a mídia social mais utilizada no Brasil (120 milhões de pessoas em 2017) e varias pesquisas já mostraram que diferentes camadas fazem um uso bem diferente da ferramenta em comparação com o espectador da Globo News.

No que diz respeito à publicidade comum, de produtos de mercado, muitas empresas estão migrando da tevê para a internet. As vantagens são muitas: disponibilidade de dados, traçar o perfil do público, customizar, mirar e rastrear as reações e os comportamentos futuros. A mesma coisa está acontecendo em política. E as ferramentas já são muito avançadas. Candidatos e partidos compram dados para saber hábitos de consumo, estilo de vida, perfil e, assim, decidir quem tentar convencer, quem está já convencido e com quem nem vale a pena tentar. Se você mora no Leblon, consome produtos orgânicos, escuta MBP no Spotify e assiste a vídeos de ioga, provavelmente Bolsonaro não vai perder tempo tentando convencê-lo! Se, ao contrário, você tem uma arma e uma picape, e é dono de uma empresa, provavelmente não será eleitor de Marina, Boulos ou Manuela. E eles querem saber disso, para não perder tempo e dinheiro.

Leia também: Fundo reeleitoral (artigo de Eduardo Mufarej, publicado em 29 de julho de 2018)

Leia também:Talvez não devamos temer as próximas eleições (artigo de Viviane Doelman, publicado em 10 de julho de 2019)

Existem consultorias que personalizam a mensagem. Por exemplo, se você for liberal, na sua tela pode aparecer um discurso de Bolsonaro em favor das privatizações. Se eu for mais conservador, aparecerão frases em favor da família, contra o “kit gay”, e assim por diante. Ou seja, cada candidato tem um espectro de posições e propostas e pode personalizá-lo. Tudo isso é já realidade, e não só nos Estados Unidos ou em House of Cards, mas aqui mesmo, no Brasil. Em suma, o custo-benefício da publicidade on-line parece ser muito melhor.

Claro, existe ainda parte da população que não está conectada (em torno de 20% a 30%), mais velhos que pobres. Para alcançar esse grupo, rádio e tevê são ainda fundamentais – e que ninguém subestime o poder do rádio.

O problema principal é que não há como medir com exatidão o peso da televisão (talvez com a TV digital e com smart TVs), pois um aparelho ligado não significa que a pessoa esteja realmente assistindo, que haja uma pessoa só diante da tela, ou que depois ela vote de acordo com o que viu. A mesma pesquisa do Ibope perguntou às mesmas pessoas o quanto elas achavam ser influenciadas por cada meio. Mas parte da “influência” é inconsciente por definição.

O melhor dado possível seria saber quanto os próprios partidos gastam, quanto alocam em publicidade na tevê, na rádio ou na internet, em que meio gasta mais. O problema é que nem sempre estes dados são disponíveis. Os candidatos não compram com dinheiro a presença na televisão (pelo menos assim se espera!), e o horário eleitoral é gratuito. Nos Estados Unidos, onde os partidos compram espaços nas redes de televisão e veiculam os próprios anúncios, sabemos que eles já gastam mais on-line que em televisão. É o velho problema do calculo econômico: sem um sistema de preços livres, não há como se organizar e os mesmos partidos não têm incentivo para medir o real impacto de um espaço que é dado “gratuitamente”.

Os fatores que afetam uma eleição são múltiplos: fatores macroeconômicos (como desemprego e crescimento), fatores internacionais (guerras e conflitos), fatores inesperados (o ataque terrorista em Madri em 2004, o furacão Katrina) e que independem dos candidatos, fatores pessoais do candidato (situação familiar e aspecto físico) e, talvez, até a altura – nos EUA, por exemplo, ganhou sempre o candidato mais alto (a única exceção foi Bush filho contra Al Gore, mas Gore ganhou o voto popular). Como e por que as pessoas votam é ainda objeto de debate e há pouco consenso na literatura científica. Há quem ache que os votantes são influenciados e politizados pela sociedade, pela família, pela igreja, pela televisão; outros consideram que se vota de forma mais “racional” e que, na verdade, a televisão só confirma tendências preexistentes.

Sobre a televisão, há poucos dados concretos que possam corroborar a análise. Intuitivamente, ela é importante; intuitivamente, a internet também; intuitivamente, a internet está se tornando mais importante, e a pesquisa Ibope parece comprovar isso. Tudo intuitivamente. A tendência parece ser essa, mas quantificar com exatidão e ver para qual lado está pesando a balança é complicado.

Adriano Gianturco é professor de Ciência Política no IBMEC-MG.
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