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| Foto: Daniel Caron/Gazeta do Povo

A saúde no Brasil tem surpreendido pelo lado negativo e pela crise que se aprofunda a cada ano. A diminuição de leitos nos hospitais brasileiros é mais uma marca triste e que agrava o cenário sanitário do país. Redes públicas e privadas estão mergulhadas em problemas estruturais e de atendimento ao paciente. Em outras palavras, a saúde vem sendo tratada como grande parte de seus pacientes, no corredor, e correndo risco grave de padecer.

De acordo com um levantamento realizado pela Federação Brasileira de Hospitais (FBH), de 2010 a 2017 os hospitais privados perderam 10% de seus leitos – 31,4 mil unidades. Com isso, eles têm hoje 264 mil leitos hospitalares. Nesse período, encerraram suas atividades 1.797 hospitais e foram inaugurados 1.367, ou seja, a rede perdeu 430 unidades. Por região, a perda maior foi no Nordeste (19,2%), seguindo-se Norte (13,3%), Sudeste (12,9%), Centro-Oeste (4%) e Sul (2%).

A crise hospitalar acende mais uma luz vermelha no setor. A diminuição de leitos é reflexo de uma série de fatores que envolvem gestão administrativa, financeira e também questões como a onda de falência e problemas dos planos, operadoras e seguradoras de saúde. Segundo a FBH, entre as várias causas que explicam uma perda tão grande está o fato de, no Brasil, mais da metade dos hospitais privados ter até 50 leitos, a maior parte dos quais situada em cidades do interior. Unidades de pequeno porte não conseguem ter economia de escala e produtividade capazes de torná-las economicamente viáveis.

O país precisa de ações concretas e urgentes para estancar os problemas, sem paliativos

Outra causa é a remuneração paga pelo Sistema Único de Saúde (SUS) aos hospitais privados e filantrópicos para atender pacientes da rede pública. A tabela de procedimentos do SUS cobre apenas 60% dos custos médicos. E isso refletiu no fechamento de 53% dos hospitais entre 2010 e 2017, pois atendiam pacientes do SUS. Não é pouco comum o uso da chamada dupla porta de entrada. Na prática, trata-se de um mecanismo em que leitos em hospitais com credenciamento pelo SUS são reservados para a rede privada. Ou seja, leitos já escassos na rede pública são repartidos com o sistema privado, pela necessidade de as instituições receberem um pouco mais pelos seus serviços.

Aparentemente isso só serviria para dar aos clientes dos planos a única coisa que eles não têm nos serviços públicos de saúde: distinção, privilégio, prioridade, facilidade, conforto adicional, mordomias ou outras coisas do gênero, o que custa caro em hospitais privados e pode ser “mais em conta” quando o plano de saúde negocia com hospitais públicos. No entanto, há prejuízo de quem não tem como pagar por tais serviços, aí o direito se considera lesado em princípios como igualdade, dignidade da pessoa humana, saúde, moralidade pública, legalidade, impessoalidade e vários outros.

Leia também: Como facilitar o acesso universal à saúde (artigo de Octavio Fernandes, publicado em 6 de janeiro de 2018)

Da mesma autora: “Crimes” contra pacientes, planos de saúde e SUS (publicado em 3 de agosto de 2017)

A judicialização também interfere na administração dos leitos. Tanto que há várias ordens judiciais mandando internar na UTI, mesmo não havendo vagas. Os médicos que trabalham nos hospitais acabam tendo de fazer escolhas difíceis sobre quem vai ser internado e quem não vai ser.

Em um país melhor, bom seria que não houvesse tantos doentes que necessitassem de internações. Bom seria que houvesse mais dinheiro para prevenção e medidas básicas, como saneamento no país. Mas essa não é a realidade.

A saúde será um dos temas mais debatidos e explorados pelos candidatos nas próximas eleições – o que seria positivo se as promessas não passassem somente de palavras ao vento. O país precisa de ações concretas e urgentes para estancar os problemas, sem paliativos.

Sandra Franco é consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, doutoranda em Saúde Pública e presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde.
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