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Era do Burnout: startups de “saúde mental” impulsionadas na pandemia
| Foto: Pexels, Antoni Shkraba/Reprodução

Apesar do mérito de trazer maior segurança jurídica para diversas situações relacionadas aos trabalhadores que prestam serviços em regime de teletrabalho, a Medida Provisória 1.108/2022 também trouxe algumas preocupações referentes a este modelo cada vez mais consolidado na realidade brasileira.

Uma das mudanças que mais chamaram a atenção da comunidade jurídica diz respeito à possibilidade de o empregador passar a controlar a jornada de trabalho do empregado em teletrabalho; tal situação não fora prevista quando da elaboração da Lei 13.467/2017 (a reforma trabalhista), razão pela qual suscitava grande debate no mundo jurídico.

A MP foi considerada um avanço por jogar luz sobre uma situação que permaneceu duvidosa por muito tempo. Apesar disso, outra novidade desta legislação está sendo vista com grande preocupação. Ela se refere ao formato dado ao artigo 75-B, §5.º, da CLT, que passou a prever expressamente que “o tempo de uso de equipamentos tecnológicos e de infraestrutura necessária, e de softwares, de ferramentas digitais ou de aplicações de internet utilizados para o teletrabalho, fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou em acordo ou convenção coletiva de trabalho”.

Ou seja, a partir da entrada em vigor da citada MP, o empregado submetido ao regime de teletrabalho não pode contar como tempo de serviço prestado as respostas emitidas a consultas feitas por seus superiores fora do horário de expediente através de e-mails ou mensagens de WhatsApp, por exemplo. Em uma abordagem mais simples, significa que o trabalhador não tem direito à desconexão (direito que o empregado tem de desconectar das atividades relacionadas ao trabalho).

Ao estabelecer que o tempo gasto pelo empregado com uso de equipamentos tecnológicos fora do horário de trabalho não constitui tempo à disposição do empregador, a legislação brasileira passa a permitir a exploração desmedida dos trabalhadores, uma vez que atualmente grande parte do trabalho é desenvolvida por meio de equipamentos tecnológicos/telemáticos.

Em razão da previsão inusitada contida na MP, é possível que juízes do trabalho, ao se depararem com casos práticos, entendam pela inconstitucionalidade do artigo 75-B, §5.º, da CLT, por violar o direito ao descanso, ao lazer e ao convívio familiar e social do empregado. Tal situação parece ser ainda mais provável já que, a partir de janeiro de 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a incluir a síndrome de burnout como fenômeno ocupacional na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID). A medida torna mais fácil para os trabalhadores que sofrem desse problema ter acesso aos direitos da legislação com respeito às doenças de trabalho. Diante deste risco, é prudente que os empregadores tenham cuidado ao requisitar tarefas aos empregados que estejam em teletrabalho fora do horário contratual.

Gabriel Henrique Santoro é advogado e professor universitário.

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