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| Foto: Sandy Huffaker/AFP

Apesar das derrotas significativas de 2018, Donald Trump e seus colegas republicanos continuam exigindo a tal “segurança na fronteira”, demonizando os migrantes, despejando gás lacrimogêneo nos requerentes de asilo e exigindo bilhões do contribuinte para erguer um muro. É como se o presidente continuasse a se ver descendo aquela escada rolante, em 2015, para atacar os imigrantes mexicanos – só que, em 2018, isso resultou na perda da Câmara. E a nova briga pelo muro fronteiriço de US$ 5 bilhões deve afastá-lo ainda mais da maioria dos norte-americanos.

Nas eleições intermediárias deste ano, como o mundo viu, Trump e seu partido bolaram uma estratégia de campanha concentrada basicamente em fomentar na população o medo dos imigrantes. Seus argumentos não poderiam ter sido mais claros, com declarações flagrantemente racistas, pintando imagens sinistras dos estrangeiros, chamando-os de assassinos, estupradores e invasores. Esperavam que essas propagandas, exibidas exaustivamente por seus candidatos, repercutissem entre os norte-americanos brancos e lhes salvassem a Câmara.

Acontece que não deu certo. Não houve um número de brancos que se motivassem pelos ataques a ponto de votar nos republicanos. Por outro lado, milhões de latinos, negros e descendentes de asiáticos se viram estimulados a votar nos democratas.

Foi a segunda grande derrota, durante a presidência de Trump, de uma estratégia de campanha centrada no racismo e nos ataques aos imigrantes, apesar de ter colaborado para sua vitória, em 2016. Em 2017, na eleição para governador da Virgínia, o candidato republicano Ed Gillespie tentou aplicar a mesma fórmula, o que resultou na retaliação dos eleitores latinos e negros, e nenhuma vantagem concreta advinda dos votos dos eleitores republicanos brancos.

Trump vai continuar a brigar por sua política nacionalista com a provável presidente da Câmara, Nancy Pelosi

Segundo a pesquisa American Election Eve, feita este ano nos 70 distritos mais competitivos – que minha empresa, a Latino Decisions, ajudou a conduzir –, foi exatamente isso que aconteceu nas intermediárias. A campanha anti-imigração do Partido Republicano não conseguiu entusiasmar os eleitores.

A maior parte da pesquisa de ciência política, incluindo a minha própria, conclui que, em 2016, Trump mobilizou o eleitorado branco, que se sentia preterido e revoltado com os imigrantes, os negros e os muçulmanos. Em 2018, porém, a desilusão era óbvia: na pesquisa Election Eve, 57% dos brancos nos distritos cruciais se confessaram irritados com suas palavras e atitudes. O ganho com que os republicanos pensavam contar desapareceu: 50% dos eleitores brancos hoje admitem que Trump e seu partido estão usando uma retórica tóxica para dividir a nação.

Da mesma forma, nenhuma evidência concreta resultou, em 2018, de uma base eleitoral branca mobilizada pelos ataques aos imigrantes – o que não significa dizer que milhões não votaram entusiasticamente em apoio à estratégia anti-imigração do governo (49% disseram que os estrangeiros eram uma ameaça ao país). O fato é que, depois de dois anos da mesma cantilena, o número deles está diminuindo. Em âmbito nacional, não houve evidências de um aumento dos votos dos republicanos brancos nos candidatos anti-imigração.

Embora se saiba que Trump vai continuar a brigar por sua política nacionalista com a provável presidente da Câmara, Nancy Pelosi, é importante manter em mente a amplitude da derrota dos candidatos que defenderam a mesma linha de raciocínio presidencial nas intermediárias. Claro que alguns deles ganharam, principalmente por estar em distritos maciçamente republicanos, mas, mesmo assim, alguns amargaram a derrota. Nomes de destaque que defenderam os ideais trumpianos perderam feio, como Kris Kobach no Kansas, Lou Barletta na Pensilvânia, Corey Stewart na Virgínia e Dana Rohrabacher na Califórnia.

Leia também: Imigrantes, refugiados e apátridas (artigo de Cleia Oliveira Cunha, publicado em 13 de janeiro de 2015)

Leia também: O garoto que foi separado da família pela política de imigração de Trump (artigo de Karla Cornejo Villavicencio, publicado em 8 de julho de 2018)

O America’s Voice, grupo nacional de defesa da imigração, compilou uma lista de 31 candidatos republicanos à Câmara que apostaram na proposta de Trump e perderam as eleições. No Arizona, a aposta era em Martha McSally para assegurar a cadeira de Jeff Flake no Senado, mas, como ela defendeu a ideologia anti-imigração, acabou perdendo. Embora Ron DeSantis tenha ganhado a disputa pelo governo da Flórida, foi um dos poucos sucessos entre tantas derrotas republicanas – como em Nevada, onde Dean Heller, que brigava pela reeleição, convidou o presidente para ajudá-lo na campanha. Trump se concentrou em atacar os membros de gangues; Heller perdeu para um candidato que pediu a reforma da política de imigração, Jacky Rosen.

Mas, afinal, os ataques republicanos aos imigrantes mobilizaram os eleitores em 2018 ou não? Sim, os latinos, que compensaram a participação mínima recorde de 2014 com uma presença maciça. Na pesquisa Election Eve, 73% deles se confessaram irritados com Trump e 72%, desrespeitados; 48% afirmam que Trump é um racista cujas medidas pretendem apenas prejudicar os latinos; 27% que suas políticas têm um impacto negativo na comunidade e 18% que as consequências de suas medidas são positivas.

Em 2001, os cientistas políticos Adrian Pantoja, Ricardo Ramirez e Gary Segura comprovaram que os ataques aos imigrantes têm um forte efeito de mobilização entre os eleitores latinos – que, em 2018, provaram novamente a precisão dessa tese.

Na Califórnia, esses eleitores aumentaram sua participação o suficiente para desbancar cinco republicanos que pretendiam a reeleição e levaram dois democratas a conquistar duas cadeiras cuja disputa estava em aberto. No Texas, ajudaram os democratas a conquistar duas cadeiras na Câmara e, em Nova Jersey, quatro. No estado vizinho, em Nova York, os democratas conquistaram três. Duas foram nos distritos de maioria latina na Flórida, uma no Novo México e uma no Arizona, enquanto em Nevada, apesar da disputa acirrada, os dois democratas foram reeleitos.

Leia também: O dilema dos imigrantes: a saúde ou o green card? (artigo de Douglas Jacobs, publicado em 14 de outubro de 2018)

Leia também: Vergonha americana (editorial de 21 de junho de 2018)

Uma análise recente feita pela Iniciativa de Políticas Latinas, centro de pesquisa da UCLA que ajudei a fundar, revelou que, em oito estados com comunidades latinas consideráveis, o voto do grupo demográfico cresceu até 96% de 2014 para 2018, em comparação com os 37% mais modestos entre os não latinos. E um estudo pós-eleitoral do Latino Victory Project e do Comitê de Campanha Congressional Democrata comprovou que o voto antecipado entre os latinos aumentou 174%. O estudo da UCLA também concluiu que a maior participação eleitoral latina influenciou em 20 das 40 cadeiras ganhas pelos democratas.

Quando perguntados sobre como se envolveram nas eleições deste ano, 77% dos eleitores latinos nos 70 distritos cruciais identificados pelo Cook Political Report responderam que encorajaram ativamente os amigos e familiares a votar. Mas não foi só automobilização; as campanhas reconheceram os mais engajados e os procuraram. Nessas mesmas 70 regiões, 53% dos latinos disseram que foram contatados por alguém, que os estimulou a se registrar ou votar, graças, em parte, à iniciativa do DCCC, que investiu US$ 30 milhões nos eleitores latinos dessas áreas mais disputadas (minha empresa, a Latino Decisions, também colaborou, embora eu não tenha atuado ativamente na campanha de nenhum candidato específico).

E o que isso significa para 2020? Primeiro, que vai ser muito mais difícil para Trump e os republicanos convencerem os EUA de que os imigrantes estão arruinando o país. Antes das eleições, os republicanos tinham um nível maior de confiança da população em matéria de imigração que os democratas; hoje, a situação se inverteu.

Apesar disso, Trump vai continuar a atacar os estrangeiros em 2019 e 2020. De fato, ele já prometeu paralisar o governo federal para conseguir custear seu muro. E, embora possa ser aplaudido de pé em seus comícios quando fala mal dos imigrantes, o número de eleitores que concordam com o presidente está diminuindo. Talvez o pior para o Partido Republicano seja o fato de que a grande maioria de eleitores latinos encare as palavras e atitudes de Trump – e o próprio homem – como racistas, e as eleições deste ano demonstraram que a comunidade está aguardando ansiosamente a chance de tirá-lo do poder pelo voto, em 2020.

Matt A. Barreto é professor de Estudos Chicanos e Ciências Políticas da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, um dos fundadores do instituto de pesquisas Latino Decisions e autor de “Latino America: How America’s Most Dynamic Population Is Poised to Transform the Politics of the Nation”.
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