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Existe um conflito muito grande entre as empresas prestadoras de serviço da área médica, os planos de saúde e a Agência Nacional da Saúde (ANS) – responsável por regular o funcionamento dessas empresas – no que diz respeito ao ressarcimento que as operadoras precisam pagar aos cofres públicos. Esse ressarcimento deve acontecer, segundo a Lei 9.656/1998, sempre que usuários dos planos de saúde utilizem algum serviço do Sistema Único de Saúde (SUS).

A legalidade desse pagamento é discutida na Justiça pelas operadoras de saúde e, atualmente, aguarda-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue o mérito da Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.931. O que se sabe é que essa cobrança representa um novo tributo e que tal pagamento não consta nos contratos firmados entre as operadoras de saúde e a ANS. Além disso, ainda que indiretamente, através do ressarcimento, os usuários dos planos de saúde pagam novamente pelo atendimento quando usam o SUS. Isso vai de encontro ao artigo 196 da Constituição Federal, que diz que a saúde é direito de todos e dever do Estado.

As operadoras de saúde lutam para sobreviver em meio ao constante aumento dos custos dos serviços e equipamentos de saúde

Recentemente, a ANS anunciou a cobrança também de procedimentos de média e alta complexidade, o que deve aumentar em cerca de 150% o volume de procedimentos a serem ressarcidos. Outra questão importante é em relação aos erros e fraudes. Cobranças indevidas, como atendimentos que nunca aconteceram, ou de indivíduos que ainda estavam dentro do período de carência do plano, ou fora da área de cobertura, são cada vez mais comuns. Por isso, os planos de saúde precisaram aumentar seus departamentos jurídicos para que a legitimidade de cada pedido de ressarcimento possa ser comprovada. Isso reflete nos gastos dos planos de saúde e, via de regra, no aumento da mensalidade.

Hoje, as operadoras de saúde lutam para sobreviver em meio ao constante aumento dos custos dos serviços e equipamentos de saúde e aos altos tributos cobrados pelo governo. Os reajustes das mensalidades são regulados pela ANS, que invariavelmente autoriza valores abaixo do aumento real dos serviços oferecidos. É fato que as operadoras não conseguem arcar com mais essa despesa. A prova disso é a alta taxa de inadimplência do ressarcimento. Apenas 37% do R$ 1,6 bilhão cobrado pela ANS foram pagos, ou seja, cerca de R$ 750 milhões ainda são devidos pelas empresas.

Dessa forma, percebemos que a questão do ressarcimento não está sendo vantajosa para nenhuma das partes. A ANS não está recebendo os valores cobrados e os planos de saúde encontram-se em situações financeiras alarmantes que podem levar ao fechamento de centenas de empresas. Os usuários, por sua vez, perderão seus planos e o Sistema Único de Saúde precisará atender um número ainda maior de pessoas, aumentando seu gasto. Essa situação precisa ser resolvida antes que isso aconteça. Operadoras e ANS precisam chegar a um consenso. Não há como continuar nesse cabo de guerra em que todos estão saindo prejudicados. Percebe-se que a saída mais coerente para esse imbróglio é buscar uma solução que fique no meio termo dos interesses das duas partes.

Uma proposta viável seria a instituição de um credenciamento universal. Hoje, com o cartão saúde, que traz um registro único em todo o território nacional, qualquer pessoa atendida pelo SUS pode ser facilmente identificada. A ANS também mantém um cadastro de todos os associados aos planos de saúde. Isso viabiliza um cruzamento desses dados de tal forma que, ao procurar o SUS, o indivíduo que possui um plano de saúde possa ser identificado.

Caberia ao SUS informar ao plano de saúde sobre o atendimento. Isso faria com que o plano já ficasse automaticamente ciente da cobrança e que, caso julgue apropriado, possa entrar em contato com seu associado dando a opção de realizar o tratamento em sua rede. Acabariam as contestações das operadoras em relação aos atendimentos e o governo poderia ter uma previsão mais concreta do ressarcimento. Essa proposta poderia ser o começo de uma solução mais justa para as duas partes, além de não prejudicar os usuários, e seria uma porta para um diálogo entre as operadoras e a ANS.

Cadri Massuda é presidente da seccional Paraná e Santa Catarina da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge PR/SC).
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