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Hoje, o mundo é um imenso oligopólio. Abrem-se os mercados e restringem-se as liberdades humanas.

Sou bisneto, pelo lado paterno, de italianos que imigraram para o Brasil no fim do século XIX. Pelo lado materno, de espanhóis com imigração na primeira metade do século passado. Assim como eu, o país tem milhões de descendentes de imigrantes. O Brasil foi construído por índios, negros (migrantes forçados) e europeus, principalmente pobres e degredados, desde 22 de abril de 1500 – data considerada como a do "Descobrimento". A imigração européia ocorreu ao longo de todo o período. Em alguns anos, com maior intensidade. A história brasileira revela, com algumas exceções de preconceito, que os imigrantes sempre foram bem recebidos por aqui. Foram, aliás, os europeus que, em geral, mais maltrataram o povo índio que aqui vivia e os negros que para cá foram trazidos, à força. As razões das imigrações nos séculos XIX e XX talvez tenham em comum o sonho e o desejo de conhecer outros sítios, e neles ter novas aventuras, realizações e a perspectiva de um mundo melhor. Outra semelhança: a grande maioria dos migrantes, em ambos os períodos, foram pessoas pobres. No final do século XX e início deste, passou a existir uma outra onda migratória, que inverteu o fluxo anterior. Milhões de pessoas partiram do terceiro mundo rumo aos países desenvolvidos (europeus e Estados Unidos). O que difere esta imigração das anteriores é a realidade econômica, que estreitou a porta de oportunidades de vencer, individualmente, na vida. Estreitou porque o domínio da economia e das finanças internacionais está limitado a um número cada vez menor de empresas e pessoas.

Hoje, o mundo é um imenso oligopólio. Abrem-se os mercados e restringem-se as liberdades humanas. Paralelo a esse processo migratório, observa-se uma ascensão da violência, tanto individual como coletiva. Com a falta de oportunidades nos países do Terceiro Mundo, aos jovens restam poucos caminhos: a migração, o conformismo ou entregar-se às drogas e ao crime. A imigração, em geral, não representa paz. Em boa parte dos países, os imigrantes são vítimas de preconceito, quando não olhados como criminosos em potencial. Ao abrir qualquer jornal europeu ou norte-americano, é raro não se encontrar alguma matéria sobre imigrantes. Quase sempre, a motivação diz respeito a algum "crime" cometido. O mais citado é o da ilegalidade. Lemos também que nossos governantes discutem a formação de um novo mercado mundial, com integração econômica. Mas não falam em seus acordos internacionais sobre os direitos humanos, sociais e políticos dos imigrantes. As imigrações não são resultado de uma vontade pessoal, mas de uma série de fatores. Alguns deles: o desemprego, os baixos salários, os conflitos armados, as medidas de austeridade econômicas – caso do Brasil – impostas pelo FMI, o êxodo rural. São muitas as pesquisas que comprovam que a maioria das pessoas não desejava imigrar para um país estrangeiro. A maioria delas trabalha para poder voltar. Em 2001, por ocasião do assassinato – cometido por um soldado da PM do Paraná – na BR-277, do sem-terra Antônio Tavares durante uma manifestação do MST, escrevi uma carta-aberta ao então governador Jaime Lerner. Na carta, comparava a quantidade de tiros que foram disparados pela polícia, sob seu comando, com os tiros dados pela polícia de Londres no ano anterior. Ao longo de todo o ano de 2000, a polícia londrina havia disparado apenas três tiros.

Esse fato vem à memória agora, quando a mesma polícia de Londres atira oito vezes em Jean Charles de Menezes, um migrante brasileiro que vivia na capital britânica. Os motivos que levaram Jean a migrar dizem respeito, sem dúvida nenhuma, à questão econômica. Sem emprego, foi em busca de vida, como muitos outros.

Encontrou a morte.

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