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 | Evaristo Sá/AFP
| Foto: Evaristo Sá/AFP

Eu moro há três anos nos Estados Unidos e falo inglês com fluência. Aliás, a língua inglesa sempre foi uma de minhas paixões, tanto que fui franqueado de uma rede de ensino de idiomas por quase dez anos no Brasil. Além disso, trabalhei em várias multinacionais americanas, onde volta e meia tinha de desfiar o idioma saxão em telefonemas e reuniões. E eis que, mesmo com esse histórico, ainda não me sentiria à vontade para dar uma entrevista em inglês. Seria certamente algo que me tiraria o sono na noite anterior.

Mas com Dilma Rousseff tudo é diferente. A ex-presidente, apesar de sua “heterodoxia” ao se comunicar em sua língua-mãe, resolveu que seria uma boa ideia conceder entrevista em francês durante sua recente viagem à Suíça. O resultado não poderia ter sido mais previsível: Dilma envergonhou o Brasil novamente. Se já andava na corda bamba ao discursar em português, misturando cachorros ocultos com crianças, estocando vento e fazendo poesia moderna com pasta de dente, em francês ela cruzou fronteiras. Nem mesmo os grandes comediantes que passaram por este planeta conseguiriam superar o esquete da dentuça francófona.

Ser ridículo é uma decisão pessoal, sempre

Ser ridículo é uma decisão pessoal, sempre. O problema de Dilma é, por algum capricho do divino, ter conseguido um dia ser eleita e reeleita presidente de um país com mais de 200 milhões de habitantes. Ou seja, ela faz parte de um grupo seleto de pessoas – e que fique claro que, no Brasil, ele é seleto apenas por seu diminuto tamanho e não pela qualidade de seus integrantes – e essa membresia, por assim dizer, requer uma etiqueta específica, completamente ignorada por ela. Dilma não só pisoteou o idioma alheio; ela o fez para transmitir uma mensagem inadequada e mentirosa, enlameando de vez sua já manchada história. Seguindo a linha “Napoleão de hospício”, a ex-presidente usou seu tempo de entrevista para denunciar um complô antidemocrático em curso no Brasil, cujo objetivo principal seria impedir a candidatura de Lula à Presidência em 2018. Tivesse mais alguns minutos e conhecesse mais algumas palavras do francês, Dilma poderia ter abordado a questão dos alienígenas que já vivem entre nós ou defendido que a Terra é, na verdade, plana. Sua opção foi, claramente, pelo maior dos três absurdos.

Ironicamente, poucos dias depois do vexame na Suíça, Dilma e Lula apareceram juntos em mais uma notícia: a divulgação da lista de Janot. Os dois ex-presidentes constam neste grupo não tão seleto de criminosos em potencial, ao lado de outros estrupícios como Aécio Neves, Aloysio Nunes, Antônio Palocci e Guido Mantega. A famigerada lista expõe o horror que é a política brasileira e nos deixa com a sensação de que estamos andando em círculos, em que o próximo escândalo é apenas uma versão mais recente da falcatrua anterior. Seu autor acertou em cheio quando disse que a democracia foi tomada pela corrupção no Brasil. Meu temor é que essa realidade seja irreversível em virtude de a corrupção estar tão alastrada e amalgamada na estrutura de poder que temos hoje. Nossa política se assemelha demais a uma casa condenada. Não há reforma que resolva; ao mesmo tempo, não há quem decida demolir a porcaria toda.

Para Dilma, restou um consolo: sua vergonhosa entrevista não é páreo para a maior das vergonhas brasileiras, a de sermos um povo governado por bandidos. Nem tentando falar japonês ela ganharia dessa.

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