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| Foto: Yuri Gripas/AFP

Não é preciso muito para perceber que a maior derrotada nas eleições americanas foi a extrema-imprensa – feliz expressão cunhada pelo também articulista desta Gazeta do Povo Alexandre Borges. Não é preciso muito para perceber, salvo se você for da extrema-imprensa. Aí a derrota vira motivo para ser ainda mais extremado.

Fiquei curioso para saber como grandes veículos e renomados jornalistas e analistas políticos reagiriam à tunda que tomaram. Quem não faz parte da extrema-imprensa, como Carlos Alberto Di Franco, que dispensa apresentação, percebeu o óbvio em artigo recente publicado também por esta Gazeta do Povo: “Politização da informação, distanciamento da realidade e falta de reportagem. Eis, amigo leitor, o tripé que tisnou a credibilidade da imprensa. A informação foi produzida e processada num laboratório sem vida. Faltou olhar nos olhos das pessoas, captar suas demandas reais. Gostemos ou não delas. A velha e boa reportagem foi substituída por torcida”.

De repente, os razoáveis se permitiram xingar Trump de tudo e mais um pouco

Outros, no entanto, como Cecilia Ballesteros, com o pretexto de fazer autocrítica da classe jornalística, forneceram rara confissão do que significa ser da extrema-imprensa. Em artigo ao El País Brasil, ela escreveu: “Nós jornalistas estamos acostumados a trabalhar com o racional (...) e que as pessoas no final das contas são sábias e razoáveis, a nos juntar e pensar que todo mundo é como nós e precisam optar pelo progresso, a ciência e o avanço”. Logo, quem não é como os da extrema-imprensa seria irracional. Ou seja, embora reconheça existir o distanciamento da realidade, ela se salvaguarda na certeza de que os sábios e razoáveis do reino fantástico da extrema-imprensa erraram apenas em não prestar atenção na plebe ignorante e insensata. Que dizer? Indo por aí, a distância da realidade só aumentará, é claro.

Em conversa com jornalistas sobre isso tive outro exemplo de confissão de extremismo: Trump seria indefensável por ser um sujeito repulsivo; logo, seria intolerável que um jornalista – ou seja, sábio e razoável – tentasse defendê-lo. Que dizer? Ah, a intolerância dos tolerantes... Algo hilário, por involuntário, decorrente desse extremismo de considerar Trump um novo Hitler é o fato de que nunca antes na história da religião do politicamente correto tantos seus devotos e sacerdotes foram tão politicamente incorretos. De repente, os razoáveis se permitiram xingar Trump de tudo e mais um pouco. Dos tradicionais “machista”, “racista” e “homofóbico” até descambarem para termos como “tarado” e por aí foi. Fiquei esperando o maduro xingamento de ele ter cara de melão, digo, de laranja, mas bom humor não é o forte desse pessoal.

Mas ninguém foi mais longe que Arnaldo Jabor nesse extremismo. Em um de seus comentários diários, saiu-se com esta: “Trump é o mal. É apavorante pensar que o planeta Terra está nas mãos de um louco, e ninguém pode fazer nada. A não ser que outros psicopatas o matassem”. Hein? Então, se “outro” psicopata matasse Trump, o razoável Arnaldo Jabor ficaria aliviado? Agradeceria ao homicida? É isso mesmo, produção?

É óbvio que textos críticos à extrema-imprensa em relação à eleição americana irão soar aos ouvidos superiores de seus integrantes apenas como defesa cínica de Donald Trump. Que fazer? Dar-lhes um espelho, oras. Já a Trump eu diria, se pudesse, que lhe sou grato por ter feito essa extrema-imprensa tirar a mão do bolso. Agora é preciso dizer que ela sempre esteve nua. No mais, é rezar para que ela se olhe no espelho.

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