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A fala do título é do personagem Capitão Nascimento, no filme Tropa de Elite 2. É dita logo no início, depois da cena da solução mortífera dada pelo Bope a uma revolta de presos, quando ele entra num restaurante onde está o governador, esperando-o para demiti-lo por causa do ocorrido. Os demais clientes, porém, começam a aplaudi-lo pelo feito. Corta para a realidade: semana passada, em Curitiba, um assaltante foi morto por um policial à paisana, quando tentava cometer um roubo na rua, à luz do dia. Moradores dos edifícios em torno saíram para aplaudir o policial.

Não, não é mera coincidência. A arte espelha a vida e, algumas vezes, também a revela. Obras como Cidade de Deus e os dois Tropa de Elite tiveram sucesso imenso justamente por espelhar a realidade da nossa violência urbana e insegurança pública, com vários personagens, falas e cenas entrando para o imaginário coletivo brasileiro com tal impacto e valor que não é exagero considerar terem fornecido símbolos verdadeiros à nossa cultura. Ou seja, são eles quem dizem, interpretam e explicam mais e melhor nossa realidade social que o contrário.

Há um contraste entre a população que aplaude policiais e boa parte da elite intelectual encastelada em suas cátedras universitárias

Uma das coisas que nos revelam é o contraste entre a população que aplaude policiais e boa parte da elite intelectual encastelada em suas cátedras universitárias, fornecendo soluções inviáveis para a realidade em que vivemos, ilustrada nas cenas da faculdade de Direito, no primeiro Tropa de Elite, e na aula do professor de História, no segundo.

O noticiário recente informou que chegamos aos 60 mil homicídios por ano (números de 2014); somos o país campeão mundial no setor. É um atestado da existência de um estado de guerra. Como se enfrenta uma guerra? Segundo essa elite pensante, investindo em educação, não em repressão e punição a bandidos. Já estamos tão acostumados com essa conversa que ninguém mais para pra pensar se isso faz sentido. Aceitamos como se fosse uma verdade universal. Mas será? Guerra se enfrenta com educação? Ou, para existir educação, não é preciso, antes, haver um estado de ordem e segurança social suficientes a permiti-la? Japão e Coreia do Sul, sempre citados como exemplos de reconstrução pela educação, não se refizeram durante a guerra, não é?

Quem está descolado da realidade e enfeitiçado por mantras como este jamais entenderá por que, para o povo, “bandido bom é bandido morto”. Quando se chega a isso é porque não se acredita mais que a guerra possa ser vencida dentro das “regras do jogo”. É o resultado de se viver com medo constante de tudo, sem ser protegido por nada. Já não se confia em instituições, em prisões, muito menos em ressocialização. Em Cidade de Deus, o povo pobre só tem coragem de sair de casa para cumprimentar aquele que enfrentou sozinho os traficantes. O capitão Nascimento se tornou um herói para a imensa maioria do público porque no filme a guerra é retratada pelo que ela é de fato, sendo que ele teve a coragem de enfrentá-la não só contra bandidos de fora e dentro do sistema, mas também contra a hipocrisia de quem acredita que fazer passeata pela paz e se desarmar ajudaria a resolver o problema.

Mas não me entenda errado, parceiro. Sobre guerra, concordo é com Karl Krauss: “A guerra, a princípio, é a esperança de que a gente vai se dar bem; em seguida, é a expectativa de que o outro vai se ferrar; depois, a satisfação de ver que o outro não se deu bem; e, finalmente, a surpresa de ver que todo mundo se ferrou”.

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