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 | Gilberto Yamamoto
| Foto: Gilberto Yamamoto

I cross the streets without fear, everybody keeps the way clear... a group approaches a policeman, he seems so pleased to please them. A Londres que Caetano musicou parece irreal comparada ao inferno das pessoas saltando de prédios incendiados por vândalos. Jovens destruindo, roubando, ferindo a esmo. Como é perversa a juventude do coração desses demolidores de paraísos!

Londres foi sacudida nos anos 80 pelas bombas do IRA (Exército Republicano Irlandês). Violência aterrorizante, mas era possível entender os motivos políticos relacionados à presença britânica na parte norte da Irlanda. O uso do terror como meio de ação política é moralmente repugnante, porém inteligível. À época também ocorreram movimentos multitudinários, detonados no Bairro de Tottenham, danificando bens particulares e públicos. Depredações, pessoas feridas; ao menos havia a impressão de existir motivo, qual seja, perseguição policial por motivos raciais. Ainda que a alegada causa da baderna não fosse verdadeira, os agitadores acreditavam nela.

Em 2005, jovens se explodiram no metrô e ônibus para marcar posição religiosa; mataram 50 pessoas. Injustificável, porém explicável no sentido de que foram movidos por convicções ideológicas e imaginavam se tornar mártires santificados na luta contra a civilização cristã. Ideia abjeta, todavia, ideia, causa.

Hoje rebeldes sem causa carbonizam a cidade da névoa. Não há fome, miséria, falta de acesso à escola, doenças. Há ócio, muito ócio. Nele mora o capeta. Sem precisar trabalhar para comer, qual a razão para estudar, concentrar-se? Na Londres antiga a vida era breve, bruta e suja na síntese de Hobbes. Trezentos anos depois o Estado do bem-estar social produziu vida longa, sofisticada e limpa. Com tudo posto à mão pelo esforço dos outros, consumir-se à Amy Winehouse é atraente. Ocorre, poucos brilham e apagam como meteoro. A maioria dos indivíduos, dos que se deixam sustentar pela mão do Estado, padece de inanição cívica e desaparece sem emitir luz.

Pessoas opacas, sem sonhos de superar dificuldades para ser bombeiro, astronauta, escritor, físico, inventor, zumbizam pela existência. O desejo expande o horizonte e o sonhador abre caminhos para chegar lá. Quem não sonha não é, está. A redução da humanidade ao verbo estar mata a poesia da vida. O vácuo moral revelado pelas agressões erráticas não deve ser mitigado como ocasional desarranjo emocional. Os autores das agressões e danos são providos de capacidade de avaliação sobre o torto e o direito. Optaram conscientemente pela transgressão; não são fantoches manipulados por fatores externos a seu tirocínio. O funcionamento diuturno do Poder Judiciário e a ação policial preventiva e repressiva são louváveis.

I dont’t want to stay here, I wanna to go back to Bahia, dizia Paulo Diniz em contraponto à tristeza de Caetano no verso I just happen to be here and it’s ok. A cidade onde se podia andar sem rumo e sem medo, esperando ver discos voadores no céu, não existe mais.

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