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Lojas fechadas em Curitiba.
Lojas fechadas em Curitiba.| Foto: Lineu Filho/Tribuna do Paraná

Dados e projeções para a atividade econômica em março mostram que a paralisação da atividade econômica, consequência da estratégia de isolamento social para evitar uma explosão nos casos de Covid-19, já cobra seu preço. A perda estimada no faturamento do comércio desde o início do surto foi de R$ 53,3 bilhões, ou 46,1%, em comparação com o mesmo período do ano passado, segundo a Confederação Nacional do Comércio (CNC) – só as vendas de Páscoa devem ter redução de 31,6% neste ano. Em relação a fevereiro, março teve queda de 16,2%, a maior da série histórica medida pela Serasa Experian.

Mesmo em setores como os de supermercados e combustíveis também houve redução, ainda que menor – 2,4% e 5,5%, respectivamente, o que se explica pelo fato de se tratar de itens imprescindíveis à sobrevivência. O maior estrago está nas vendas daqueles produtos e serviços cuja aquisição pode ser deixada para depois, como vestuário ou móveis. Um caso emblemático é o da indústria automobilística: a produção de veículos em março foi a menor para o mês em 16 anos, de acordo com a Anfavea, a associação das montadoras, e a venda de carros novos foi a menor desde 2006, segundo a Fenabrave.

Ter um plano com critérios definidos para a retomada das atividades é demonstração de que não precisa haver dicotomia entre preservação da saúde e a atenção à economia

Em regiões mais pobres das grandes cidades, a necessidade de lutar pela sobrevivência está levando a população a ignorar as recomendações de isolamento. O Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, praticamente retornou à situação pré-pandemia três semanas após os decretos de fechamento de estabelecimentos, segundo o site G1, ao mesmo tempo em que a cidade registra as primeiras mortes na Rocinha, em Vigário Geral e em Manguinhos – um dos grandes temores de epidemiologistas era justamente o que poderia ocorrer quando o coronavírus chegasse às favelas, áreas mais densamente povoadas, sem saneamento básico e nas quais é muito mais difícil isolar os grupos de risco do restante da população.

Enquanto isso, a rede de proteção desenhada até agora pelo governo federal começa a ser colocada em funcionamento – por exemplo, com o pagamento dos R$ 600 mensais a uma série de categorias, como a dos autônomos –, embora com algumas limitações por fatores alheios à vontade do Poder Executivo. Os acordos individuais para redução de salário e jornada, desenhados pelo governo na MP 936 para evitar demissões, foram derrubados liminarmente pelo ministro Ricardo Lewandowski, do STF, que exige a anuência dos sindicatos; o plenário só avaliará a questão no dia 16 – uma demora inexplicável dada a urgência do tema e a possibilidade de ainda mais demissões. Enquanto isso, os bancos continuam relutando diante de pedidos de empréstimo, aumentando juros e encurtando prazos, “empoçando” (nas palavras do ministro Paulo Guedes) os bilhões de reais adicionais colocados no mercado por decisão do Banco Central.

Mas, como já afirmamos em várias ocasiões, as medidas emergenciais, ainda que acertadas, são paliativos. Só a retomada da atividade econômica poderá frear o impacto econômico da pandemia, mas este é um processo que exige cuidado absoluto. Ninguém deseja que a rotina volte ao normal apenas para acelerar a curva de contaminação, o que forçaria o retorno das medidas restritivas, talvez em caráter ainda mais drástico, aprofundando a recessão que já é inevitável. Mas autônomos, assalariados e empresários não podem continuar permanentemente no escuro em relação às perspectivas de retorno.

Assim, diante da pergunta “quando?”, a melhor resposta talvez não seja uma data específica, mas uma série de critérios que precisam ser definidos em conjunto entre os vários ministérios, sob a coordenação do presidente Jair Bolsonaro, e expostos à população. O Brasil vem correndo para ampliar sua capacidade de leitos de UTI e equipamentos hospitalares, adquirir testes, experimentar possíveis tratamentos. Esses indicadores poderiam embasar uma decisão sobre a intensidade do isolamento? Mike Ryan, diretor-executivo da Organização Mundial de Saúde (OMS), por exemplo, afirma que é possível flexibilizar as restrições se houver meios de testar grande parte da população para isolar os infectados. No Brasil, o Ministério da Saúde propôs um retorno gradual nos municípios e estados em que 50% do sistema de saúde esteja vago após a Páscoa, e onde o índice de contaminação estiver abaixo da metade da média nacional. Há outros critérios que também poderiam ser usados, como a estabilização ou redução do número de novos casos, com o desejado “achatamento da curva” para se ter certeza de que a rede hospitalar dará conta do surto. Tudo, evidentemente, com atenção especial a pontos críticos, como as cidades e estados com mais casos e mortes, ou onde o sistema de saúde esteja saturado – caso do Amazonas, onde 95% dos leitos de UTI estão ocupados e o hospital referência para tratamento do coronavírus já entrou em colapso.

Ter um plano com critérios definidos e informar a população, com toda a transparência, sobre os indicadores que permitirão a retomada das atividades é demonstração de que não precisa haver nenhuma dicotomia entre preservação da saúde e a atenção à economia. A falta de perspectivas e de respostas servirá apenas como incentivo para que o isolamento acabe rompido espontaneamente pela população, com consequências sanitárias imprevisíveis neste momento.

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