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Profissionais de saúde ajudam pacientes com sintomas da Covid-19 em "barco-ambulância", em Parintins, no Amazonas
Profissionais de saúde ajudam pacientes com sintomas da Covid-19 em “barco-ambulância”, em Parintins, no Amazonas.| Foto: Michael Dantas/AFP

Nas últimas seis décadas, especialistas de três ciências sociais – a Economia, a Psicologia e a Sociologia – se uniram em estudos e pesquisas na tentativa de compreender o comportamento do consumidor, o comportamento coletivo no mercado, a psicologia das massas e ação humana em relação ao trabalho, renda, poupança e investimentos. Embora sabendo que quem age é cada ser humano individual, a soma das ações pessoais conduz os rumos e os destinos da vida coletiva, o progresso material e o grau de desenvolvimento econômico e social. Boa parte dos estudos partiram de uma pergunta difícil de responder: por que algumas nações são pobres e outras são ricas?

De início, certos aspectos foram associados ao grau de riqueza das nações, como o fato de que nas nações ricas o índice médio de violência urbana é bem menor, a qualidade das leis é superior, o cumprimento das leis é mais efetivo e a confiança da população nas instituições é mais elevada, resulta daí menor risco e menor incerteza nos atos individuais e nas decisões coletivas. Embora seja relativamente consensual que esses aspectos determinam se uma nação será pobre ou rica, mais que a abundância de recursos naturais, a pergunta pode retroceder e buscar explicações por que tais aspectos estão presentes em algumas nações e não estão em outras.

A questão fica enroscada em uma circularidade, pois tanto se pode dizer que uma nação é rica por conter os aspectos referidos como se pode concluir que tais aspectos existem na sociedade porque a nação é rica. Caso se conclua que os aspectos associados às nações ricas somente existem nelas como decorrência de sua riqueza – logo, as nações pobres não teriam esses bons aspectos porque são pobres –, então a pergunta volta para seu início, ou seja: por que uma nação não consegue superar a pobreza, se torna rica e, assim, obter os aspectos positivos na vida coletiva? Por outro lado, caso se conclua que é a riqueza que deriva daqueles aspectos, a pergunta passa a ser: por que uma nação não consegue obter tais aspectos positivos e, em decorrência deles, se tornar rica?

Os estudos e pesquisas destinados a responder por que algumas nações são ricas e outras são pobres esbarraram nessa circularidade e levaram alguns estudiosos a uma terceira posição, a de que os aspectos associados à riqueza da nação e o processo de enriquecimento ocorrem simultaneamente em movimento de alimentação e retroalimentação constante entre si. Isto é, uma característica social positiva ajuda na redução da pobreza, e a redução da pobreza melhora os aspectos positivos da vida social que, por sua vez, provocam mais alguma redução na pobreza, de forma que o círculo virtuoso se estende por anos e décadas até que a pobreza é superada quase totalmente e eleva padrão médio de bem-estar social.

As hipóteses e as constatações envolvidas nos estudos e pesquisas destinados a entender a riqueza e pobreza das nações são úteis para o exame e a compreensão do processo social após o país ser devastado por catástrofe de grandes proporções econômicas, sociais e psicológicas. Neste ano 2020, em que países ricos e pobres estão sendo vítimas de uma tragédia provocada pela pandemia do coronavírus, é razoável afirmar que as nações se recuperarão em velocidades diferentes e em graus diferentes, com algumas conseguindo retomar o crescimento da economia e o desenvolvimento social em poucos anos, enquanto outras continuarão na pobreza, sem superar a devastação econômica e, talvez, sem conseguiram sequer voltar à pobreza anterior, ou seja, seguirão mais pobres do que já eram.

As dificuldades para a compreensão exata do problema são muitas, pois nações são feitas de indivíduos, com seus traços culturais, seu nível educacional, seus hábitos e sua força ou fraqueza diante de crises e tragédias. Entender como uma massa de 211 milhões de habitantes vá se comportar em termos coletivos é tarefa difícil, as conclusões são sempre imprecisas e aproximadas, porém úteis para avaliar as probabilidades de sucesso na tarefa de recuperação. No caso brasileiro, o país tem um histórico diante de crises que não é muito animador. Marcas como cultura da corrupção, inchaço da máquina pública, dependência em relação ao governo, crença em soluções estatais, mau uso do dinheiro público, sistema político cheio de distorções e, no geral, baixo grau de educação e cultura, além de certa propensão à desorganização, desperdício e baixa produtividade pública e privada, e falta de confiança nas instituições, são traços da mentalidade e da cultura nacional que prenunciam recuperação lenta e tortuosa.

Entretanto, é hora de, até em função da dor e das perdas impostas pela crise, esperar-se um movimento nacional em favor da resiliência, força mental e disposição da população para entregar-se a um plano de recuperação individual, familiar, empresarial e nacional. A dor, o sofrimento, as perdas e as consequências dessa crise podem ser o estopim para crescimento individual e coletivo, e um movimento de reação e não aceitação de tanta pobreza, desigualdade e tanta malandragem na gestão dos assuntos públicos. O povo brasileiro está diante de um chamado histórico e somente o tempo dirá como a sociedade reagiu e se emergiu da triste pandemia mais forte e com um país melhor.

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