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A difícil missão de controlar a dívida pública
| Foto: Rafael Neddermeyer/Fotos Públicas

Dentre os inúmeros efeitos econômicos da pandemia de Covid-19, o aumento da dívida pública brasileira deve ser um dos mais duradouros. Os enormes gastos – cuja necessidade era evidente – com o auxílio emergencial, programas de manutenção de emprego e crédito facilitado para empresas elevaram a proporção da dívida em relação ao PIB para patamares muito preocupantes. O fenômeno foi global, mas o Brasil tem particularidades que exigem atenção especial. Nos últimos dias, alguns dados divulgados pelo Ministério da Economia e pelo Banco Central lançam luz sobre a trajetória da dívida brasileira.

A Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) terminou junho em R$ 6,729 trilhões, ou 84% do PIB. A situação já foi pior, pois o país começou 2021 com uma DBGG equivalente a 89,9% do PIB – a redução, segundo o Banco Central, se deve a fatores como o crescimento econômico e a valorização do real, que reduz o custo da dívida em moeda estrangeira. No mês passado, segundo o Tesouro Nacional, a dívida em títulos públicos subiu 3,07% na comparação com maio – são R$ 5,33 trilhões, sendo R$ 5,1 trilhões em títulos emitidos internamente e R$ 227 bilhões no exterior. A previsão do Tesouro é que esta dívida termine 2021 entre R$ 5,5 trilhões e R$ 5,8 trilhões.

Botar as contas em ordem é uma das melhores providências que um governo pode tomar para ajudar os mais pobres

O critério do Banco Central para calcular a proporção entre dívida e PIB, no entanto, desconsidera os títulos do Tesouro que estão na carteira da autoridade monetária. É um cálculo mais benigno que o de outras instituições, como o FMI, que leva em consideração também esses títulos. Nesta conta, a dívida brasileira fechou 2020 em 98,9% do PIB e hoje está em 98,4%, muito perto de romper o patamar dos 100%, o que deve ocorrer em 2023. E aqui reside a grande particularidade da dívida brasileira.

Ainda pelos critérios do FMI, a dívida brasileira está mais próxima da média dos países desenvolvidos (122,5% do PIB) que das economias emergentes (64%). No entanto, ao contrário dos países ricos, o Brasil não tem ainda um grau de confiança no mercado internacional suficiente para rolar sua dívida facilmente e a um custo baixo, mesmo quando a Selic ainda estava na mínima histórica de 2% ao ano. Todas as idas e vindas do fim de 2020 e início de 2021 envolvendo a PEC Emergencial, o orçamento de 2021 e as tentativas de burlar o teto de gastos – se não explicitamente, ao menos usando brechas para ampliar gastos sem incorrer em irregularidades – apenas agravaram o quadro, já que enviaram um recado preocupante sobre o compromisso dos poderes Executivo e Legislativo com o necessário ajuste fiscal depois do estouro de gastos motivado pela pandemia.

O resultado da tumultuada tramitação desses projetos foi a elevação da curva de juros futuros. Em outras palavras, o investidor estava pedindo um retorno maior para emprestar dinheiro ao governo – e, quando o faz, é porque considera que os riscos aumentaram, já que a classe política não parece disposta a racionalizar as despesas do Estado. Se o Brasil tem de oferecer juros maiores para atrair o investidor, a trajetória da dívida pública também sofre os efeitos.

Se o governo tem como objetivo reduzir a relação dívida/PIB para níveis mais aceitáveis e condizentes com o perfil de país emergente, não há como contar simplesmente com o crescimento do país ou com um câmbio mais favorável: é preciso colocar um freio no populismo fiscal que acena com mais e mais gastos, especialmente à medida que se aproxima a corrida eleitoral de 2022. Botar as contas em ordem é uma das melhores providências que um governo pode tomar para ajudar os mais pobres, pois quanto mais confiável for o país, mais ele atrairá investimentos que gerem emprego e renda.

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