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Fachada do edifício sede do Supremo Tribunal Federal – STF
Detalhe da estátua da Justiça na sede do Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Nesta época de reforma administrativa, retornam os debates sobre o custo do sistema judiciário brasileiro, os salários dos membros do Poder Judiciário (acima das médias dos demais poderes e, sobretudo, bem mais altos que os de funções equivalentes no setor privado) e a demora na conclusão dos processos judiciais. Uma reclamação recorrente da população é o longuíssimo prazo que uma ação judicial leva para chegar até seu final. Muitas pessoas jogam a culpa no Judiciário e fica a impressão de que o problema pode ser resolvido apenas com melhoria na gestão administrativa do sistema, no funcionamento burocrático dos procedimentos e na boa vontade dos juízes. No entanto, ainda que possa haver deficiências de funcionamento administrativo na máquina judiciária, as causas são mais profundas.

Estima-se que existam 80 milhões de processos tramitando na Justiça brasileira e entre os maiores litigantes está o setor público. Antes de culpar o Judiciário e sua estrutura pela demora no encerramento dos processos, cumpre entender por qual razão há um número tão exagerado de ações em comparação com o tamanho da população nacional. Seguramente, um dos maiores problemas é a má qualidade das leis. Um segmento problemático gerador de milhões de ações é a tributação, com seu excesso de impostos, excesso de leis, leis ruins, excesso de fiscos e regras confusas. O cidadão e as pessoas jurídicas têm de lidar diariamente, no mínimo, com cinco fiscos: o municipal, o estadual, o federal, mais a Previdência Social e o Ministério do Trabalho, estes dois últimos em si mesmos dois fiscos enormes e com vida própria.

No Brasil, quase tudo que dependa de uma lei para funcionar acabará gerando judicialização exagerada dos conflitos, porque as leis são ruins e mal feitas

O problema, entretanto, vai além da questão tributária e atinge todas as áreas reguladas, a exemplo das leis financeiras, comerciais, ambientais, de serviços públicos e de direito do consumidor, só para citar algumas. Agora mesmo, a legislação sobre o auxílio emergencial pago pelo governo em razão da pandemia já está sendo contestada e há notícias informando que poderá haver uma enxurrada de processos na Justiça a respeito da questão, em função de problemas com o teor da lei. No Brasil, a histórica má qualidade das leis criou a certeza de que quase tudo que dependa de uma lei para funcionar acabará gerando judicialização exagerada dos conflitos, porque as leis são ruins e mal feitas.

A própria política tornou-se fonte de enxurrada de processos nos tribunais. O Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, que deveria ser um tribunal enxuto, sem montanhas de processos, que priorizasse questões constitucionais, tornou-se uma instância na qual desembocam milhares, quando não milhões, de processos gerados pelo funcionamento da política. Sem falar na enorme lista de assuntos que, após a Constituição de 1988, seriam de competência do Poder Legislativo, mas não foram regulamentados ou legislados com regras claras, indo parar no STF, obrigando o tribunal a se pronunciar porque, como dizem na linguagem jurídica, foi “provocado” – embora nada disso, evidentemente, justifique a dedicação recente da corte a usurpar funções do Poder Legislativo por meio daquilo que se chama de “ativismo judicial”.

Excesso de leis, leis confusas, instabilidade das regras e a cultura de que o governo deve se intrometer em tudo são alguns aspectos do gigantesco corpo de leis e da judicialização de quase todos os aspectos da vida das pessoas, das empresas, das organizações sociais e do próprio governo, pois o Estado também se tornou vítima da fúria legiferante existente. Para piorar, o país tem 5.570 prefeituras e suas Câmaras, 27 governos estaduais (incluindo o Distrito Federal) com suas Assembleias Legislativas e Justiças estaduais, a União com o Congresso Nacional e a Justiça Federal, além de Justiça Eleitoral, Justiça Militar, Justiça do Trabalho etc. Enfim, é uma multidão de órgãos que baixam normas impositivas, tomam decisões, fazem regras, executam, julgam, condenam, todos os dias. O resultado é um número tão monstruoso de leis e normas que é impossível a qualquer ser humano ou instituição saber da existência de todos os atos legais e entender tantas regras.

Assim, não é de estranhar que o setor público seja o maior litigante da nação, como autor ou como demandado – logo, o maior responsável por entupir o Poder Judiciário de ações e disputas. O atraso nacional não é obra do acaso: é fruto da ação histórica que levou o brasileiro e suas instituições a criar um monstro indomável de leis, normas e regras, que atuam como entrave ao crescimento econômico, ao desenvolvimento social e à melhoria do padrão de vida da população. Não basta ao país ser rico em recursos naturais quando as instituições construídas e os edifícios normativos erigidos agem na contramão do progresso econômico, político, cultural e social.

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