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Relator do Orçamento de 2021, senador Marcio Bittar (MDB-AC) é um apoiador incondicional do presidente Jair Bolsonaro.
Relator da PEC Emergencial, senador Marcio Bittar (MDB-AC) decidiu não enviar seu parecer para votação neste ano.| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

O relator da PEC Emergencial, senador Márcio Bittar (MDB-AC), decidiu que este ano não haverá como votar o texto. Seu relatório, que havia sido prometido para o começo da semana, deve ficar apenas para 2021, de acordo com nota que repete os chavões usados sempre que projetos de enorme interesse para o país acabam paralisados no Congresso, como as alusões ao “momento político”, à “complexidade da matéria” e à falta de “consenso”. Os clichês servem apenas para mascarar o fato de que faltou bravura ao relator: tanto para nomear os reais motivos que estão atrasando a tramitação, quanto para enfrentá-los no seu relatório, já que, a julgar pelo texto enviado a lideranças partidárias durante essa semana, a PEC Emergencial tem tudo para se transformar na PEC Superficial.

O texto deveria ser uma síntese das três propostas de emenda à Constituição que o governo apresentou em 2019, no chamado Plano Mais Brasil: a PEC dos Fundos, a PEC do Pacto Federativo e a PEC Emergencial. No começo da semana, uma minuta recebida por líderes partidários chamou a atenção por incluir uma regra que permitiria ao governo burlar o teto de gastos, usando dinheiro de fundos infraconstitucionais que não fossem ratificados pelo Congresso em até dois anos. A última versão, enviada por Bittar aos líderes das bancadas no Senado na terça-feira, já não tinha o dispositivo fura-teto, mas o que entrou no parecer mostra como as ideias originais do governo foram desidratadas pelo relator.

Faltou bravura ao relator tanto para nomear os reais motivos que estão atrasando a tramitação, quanto para enfrentá-los no seu relatório

O Plano Mais Brasil tinha o objetivo central de desengessar os orçamentos públicos e fornecer aos gestores, nas três esferas de governo, meios de colocar as contas em ordem quando as despesas estivessem crescendo a ponto de absorver todas as receitas. Ele incluía o que o ministro Paulo Guedes chama de “três Ds”, em referência a “desvincular” (reduzir o volume de recursos “carimbados”), “desindexar” (impedir reajustes automáticos) e “desobrigar” (em referência a gastos mínimos constitucionais). Previa, também, uma série de medidas para equilibrar os gastos com pessoal na administração pública, incluindo a possibilidade de reduzir salário e jornada de servidores, assim como foi feito na iniciativa privada com os acordos implantados para preservar empregos durante a pandemia de Covid-19.

Nada disso ficou no relatório. Sobraram os parâmetros para os acionamentos de gatilhos de contenção de gastos e algumas medidas que os governos seriam obrigados a adotar, como a proibição de concursos e reajustes para os atuais servidores, mas sem a redução proporcional de salário e jornada. A possibilidade de extinção dos fundos infraconstitucionais foi mantida; no entanto, o dinheiro neles parado já não poderá servir para abater a dívida pública – como desejava o governo antes mesmo de os gastos com a pandemia elevarem essa dívida a níveis perigosíssimos –, mas apenas para finalidades como combate à pobreza, obras de infraestrutura e segurança nas fronteiras. A redução de incentivos e renúncias fiscais também foi amenizada. Como resultado, a economia potencial com a PEC seria de meros R$ 450 milhões no primeiro ano de sua vigência, contra R$ 12 bilhões caso as propostas originais do governo fossem mantidas.

“Consenso”, “complexidade da matéria” e “momento político”, portanto, são apenas justificativas genéricas do relator para camuflar a dificuldade de enfrentar os lobbies do funcionalismo público, dos promotores de ideologias estatizantes, dos burocratas, dos setores que se aproveitam de benefícios fiscais sem deles necessitar: esses seriam os vencedores caso o relatório de Bittar fosse a votação. A reforma resultante seria pífia – nem mesmo a reforma da Previdência sofreu tamanha desidratação – e a oportunidade de modificar substancialmente o Estado brasileiro, tornando-o mais ágil, estaria perdida por um bom tempo.

O adiamento só servirá de algo se der tempo ao relator para construir o consenso que realmente importa: consenso em torno da necessidade de enfrentar as amarras que fizeram do Estado brasileiro um ente mastodôntico que vive em função de manter a si mesmo, em vez de servir ao cidadão por meio da oferta de serviços de qualidade proporcional ao que retira da sociedade por meio dos impostos. O poder público brasileiro gasta muito e gasta mal, e qualquer “consenso” que mantenha esse estado de coisas é um desserviço ao país.

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